Artigas,
La Redota. Revivendo Um Mito Esquecido.
Um filme uruguaio
lançado em 2013, que fala de um de seus grandes heróis nacionais, José Artigas.
Essa é a bela história de “Artigas, La Redota”, dirigido por Cesar Charlone.
Aqui, o mito do general caudilho que se misturava com o povo é mais exaltado do
que nunca. Um filme para inflar o patriotismo uruguaio em todos os seus
sentidos.
A história se passa em
dois momentos. Em 1884, o pintor Juan Manuel Blanes (interpretado por Yamandú
Cruz) recebe uma encomenda do governo uruguaio para fazer um quadro que
retratasse o general José Artigas, que teve um peso relativamente grande na
luta pela independência do Uruguai, mas que era até então uma figura
desconhecida. Para poder pintar um rosto para Artigas, Blanes somente tinha
algumas anotações e desenhos provenientes da época do êxodo de Artigas no
interior do atual Uruguai, cercado por portugueses ao norte, tentando estabelecer
a Província Cisplatina, e portenhos centralistas ao sul. Artigas, adepto de um
federalismo, não teve outra opção a não ser recuar, episódio que ficou
conhecido como êxodo nas histórias argentina e uruguaia. Ele formou um grupo de
cerca de oito mil pessoas, onde havia todos os estratos sociais, indo de
fazendeiros, passando por militares, chegando até aos mais humildes, índios e
escravos negros. Guzmán Larra (interpretado por Rodolfo Sancho), um espanhol
realista capturado pelos portenhos, foi usado como espião para se infiltrar no
grupo de Artigas. Enquanto Larra penetra no território da banda oriental, ele
vai tomando contato com as pessoas da região e percebe que a elite mais rica
abomina Artigas, dada a sua proximidade com os mais pobres. Ao chegar aos
exilados de Artigas, ele descobre uma comunidade que, se num primeiro momento
apoia o Rei Fernando VII da Espanha contra Napoleão, que o aprisionou, num
segundo momento começará a lutar por sua independência, pois até em plena
Espanha surgiram grupos revolucionários que não mais reconhecem a autoridade de
Fernando VII.
E a figura de Artigas
(interpretado por Jorge Esmoris) no filme? Ele é um homem cheio de virtudes,
com bom relacionamento com todos, obedecido e respeitado por todos. Um homem
que participava de rituais indígenas e teve um filho com uma índia. É o
protótipo do herói perfeito, sem qualquer defeito ou preconceito, avançadíssimo
demais para seu próprio tempo. Sabemos que tais rótulos em história são
praticamente impossíveis. Todo mundo sempre tem algum defeito. Mas a figura de
Artigas era devidamente valorizada, pois o filme dava a entender que, até o fim
do século XIX, ele era uma figura praticamente esquecida e precisava ser
exaltada. O filme embarca justamente nessa tese, a do herói esquecido que
precisa ser reconhecido.
Alguns detalhes
relacionados à história devem ser mencionados aqui. É muito curioso que Blanes,
ao retratar Artigas, tinha apenas frases anotadas e esboços desenhados por
Larra. Assim, o pintor “criou” um rosto para Artigas, que passou a ser sua
imagem oficial, presente nos livros de História e publicações do governo. Ou
seja, o rosto de Artigas foi inventado, não se sabendo como era sua real
fisionomia. Mais ou menos o que aconteceu com nosso Tiradentes, que é retratado
pelos livros de história como tendo longos cabelo e barba, aproximando-o da
imagem de Jesus Cristo (os registros escritos do dia de seu enforcamento falam
de um homem sem barba e de cabeça raspada). Obviamente que Blanes não gostou da
ideia, mas o presidente uruguaio da época não estava preocupado com fidelidade
histórica, mas sim suprir da forma mais rápida possível a necessidade de se ter
um símbolo pátrio de unificação nacional, qualquer que ele fosse.
Apesar dessa construção
histórica que coloca Artigas no panteão dos grandes heróis da América, o filme
merece ser visto, pois ele chama a atenção de como foi complexo o processo de
independência dos países latino-americanos do cone sul. E, ao contrário de nós,
que vemos a história do Brasil muito destacada da América Latina, o mesmo não
acontece aqui, pois portugueses e negros fazem parte do Universo histórico da
Argentina e do Uruguai no filme. Outro elemento de destaque está nos créditos
finais, onde podemos ver mais pinturas de Blanes, essas todas exaltando figuras
humildes daquela sociedade, inspirado pelos escritos e esboços de Larra
enquanto esteve no êxodo de Artigas em La Redota. Um belo filme histórico que,
muito provavelmente no futuro e com o avanço das pesquisas históricas, será
devidamente desconstruído. Mas nem por isso, a visão romântica do caudilho será
desvalorizada e deixará de despertar certa paixão por seu espírito libertário.
Cartaz do filme
Artigas, o grande herói uruguaio.
Um homem que respeitava todos os estratos sociais.
Índios faziam parte de seu grupo...
... e, como o filme mostra, Artigas teria tido um filho com uma índia.
Um líder respeitado por todos
Larra foi enviado pelos portenhos (os futuros argentinos) para espionar Artigas.
O pintor Juan Manuel Blanes
Nas coletivas de imprensa da vida.
O quadro de Artigas que Blanes produziu para o governo uruguaio.
Mas Blanes também retratou os menos favorecidos...
A minha preferida de Blanes. A paraguaia chorando a destruição de seu país após a guerra contra o Brasil. Delicado e tocante, nos faz pensar sobre todos os absurdos que a guerra provoca...
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