Brigitte Helm, A Deusa Eterna De Yoshiwara!!!

Brigitte Helm, A Deusa Eterna De Yoshiwara!!!
Brigitte Helm, A Deusa Eterna De Yoshiwara!!!

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Resenha de Filme - Que Mal Eu Fiz A Deus?

Que Mal Eu Fiz A Deus? O Lado Cômico Da Intolerância.
Um filme francês bem comercial, mas não menos reflexivo passa nas telonas. “Que Mal Eu Fiz A Deus?” é uma forma divertida de se encarar o verdadeiro barril de pólvora em que se transformou a Europa contemporânea quando o assunto é imigração e tolerância às diferenças. Uma comédia que aborda um tema muito sério, sem ser apelativa ou piegas.
Vemos aqui a história do casal de católicos Claude e Marie Verneuil (interpretados, respectivamente, por Christian Clavier e Chantai Lauby). Eles têm o que consideram um problema: suas três filhas são casadas com um chinês, um judeu e um muçulmano. Essa situação provoca um verdadeiro mal estar nesse casal que teve o desgosto de não ver suas filhas casadas na Igreja e vê com preconceito os genros. Mas a intolerância não se limita ao velho casal. Podemos ver atritos entre os genros, principalmente quando todos jantam juntos. O relacionamento entre os membros da família é altamente explosivo e, ao fim das contas, todos propõem uma espécie de trégua para mais se aturarem do que praticarem a tolerância em si. A grande esperança de Claude e Marie está na filha caçula, que consegue um namorado católico, mas ele é negro e africano, despertando mais intolerância ainda de todos, acentuada pelo fato do namorado ser negro. Mas ainda há a família do jovem africano, cujo pai vê os europeus com todo o preconceito do mundo.
Dá para perceber que a coisa é tensa. Mas toda a situação foi trabalhada de forma divertida , para que esse tema espinhoso fosse abordado de um jeito mais ameno. Fica bem claro aqui que o preconceito não é privilégio de ninguém e o etnocentrismo impera em todos os lugares e cabeças. Todos acabam sendo preconceituosos contra todos ao fim das contas. A religião, os ressentimentos coloniais, a dominação econômica de um grupo étnico sobre outro, o conflito árabe-israelense, tudo é motivo suficiente para despertar a discórdia, levando a várias situações onde presenciamos até dissolução de relacionamentos. Tudo isso é colocado de forma bem contundente para mostrar os absurdos em que as pessoas mergulham de cabeça por simplesmente não aceitarem as diferenças.

Como estamos falando de uma comédia num filme comercial, temos um desfecho meio “fake”, ainda mais se nos lembrarmos da situação cotidiana, onde o preconceito e a intolerância só se fazem aumentar. Mas pelo menos o filme tocou no assunto e mostrou o quanto pode ser ridículo todo o contexto em que vivemos, onde os ataques são mais agudos que as alfinetadas que aparecem na película. Vale a pena dar uma conferida. Boas risadas e boa reflexão, dois ingredientes que dão qualidade à produção.

Cartaz do filme

Um casal desgostoso com os genros...

Genros multiculturais


As filhas saúdam o novo genro, católico mas...

Preconceito aparece em todas as etnias...

Sogrões paus d'água...

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Resenha de Filme - O Segredo Do Abismo. Cinema De Alerta.

O Cineclube Sci Fi, em sessão realizada no Planetário da Gávea no dia 13 de setembro, exibiu o filme “O Segredo do Abismo”. Realizado em 1989, essa película mostrou uma história um tanto desconexa e sem propósito quando da sua exibição ocorrida já no século passado. A versão recentemente apresentada no Planetário foi uma edição do diretor e roteirista James Cameron, onde a coisa teve um pouco mais de sentido. Vamos falar agora um pouco dessa nova história.
O filme começa com um acidente onde um submarino nuclear americano naufragou após um enorme objeto não identificado subaquático cruzar o seu caminho. Para fazer o resgate, foram contratados trabalhadores de uma empresa de prospecção de petróleo, especializados em trabalhar em águas profundas, já que o submarino naufragou numa fossa abissal. A equipe era liderada por Virgil (interpretado pelo sempre eficiente Ed Harris) e foi contratada, pois o salvamento se fazia urgente em virtude do fato de que ogivas nucleares estavam no submarino e a equipe de Virgil era a mais próxima ao local do acidente. Mas esse salvamento não se faria de forma tranquila. Vários militares seals participariam da missão e queriam total controle das ações. Ainda, a esposa de Virgil, Lindsey (interpretada por Mary Elisabeth Mastrantonio) chegou para tumultuar o ambiente em virtude de querelas pessoais e profissionais (Lindsey estava se separando de Virgil e ainda não se conformaria com uma situação mal resolvida com a equipe do marido). Assim, a missão adquiriu contornos de muita tensão. Para piorar, o líder dos seals respirou oxigênio puro de forma excessiva nos procedimentos de mergulho a grandes profundidades e “pirou na batatinha”, querendo assumir o controle da missão a qualquer custo. E tudo isso acontecendo no meio de um conflito entre Estados Unidos e União Soviética, já que o naufrágio do submarino americano despertou uma série de suspeitas de um ataque soviético. Logo, a equipe de salvamento tinha que correr contra o tempo para evitar uma Terceira Guerra Mundial! Ufa! Você pode até me perguntar: será que foi possível resolver tantos problemas num filme só? Por incrível que pareça, sim! Mas numa versão estendida de três horas! Porque ainda tem os ETs subaquáticos, lembra? A situação enrolou ainda mais com um acidente que deixou a equipe isolada debaixo d’água e com o estoque de oxigênio limitado. Nesse ínterim, houve o contato imediato de terceiro grau, quando a equipe soube da existência da espécie alienígena que a contactava com volumes d’água que sondavam os humanos e até tomavam a forma deles, num dos poucos usos da computação gráfica da película. Assim, resolvido o imbróglio com os seals, Virgil decidiu encarar a fossa abissal com uma roupa de mergulho cheia de um líquido rico em oxigênio, onde nosso protagonista “respirava” tal líquido e podia encarar melhor a enorme pressão da água a grandes profundidades. Lá, praticamente inconsciente, foi salvo pelos alienígenas que o colocaram numa espécie de bolha de ar com uma grande tela virtual que exibia programas de tv da Terra. Com essas imagens, os extraterrestres argumentavam que a raça humana era muito agressiva e devia ser destruída. Por controlarem a água, os alienígenas formariam enormes ondas que destruiriam a cidade. Mas eles desistiram, pois captaram uma mensagem de Virgil a Lindsey, que dizia que a amava, pois enquanto ele descia a fossa, abissal, Virgil percebeu que não conseguiria retornar e morreria ali. Assim, mandou a mensagem de amor e despedida à esposa, que os alienígenas captaram e, de forma muito piegas, perceberam que a humanidade ainda tinha salvação e desistiram de destruí-la. O filme termina com a grande “nave espacial” alienígena que estava submersa chegando à tona, trazendo um monte de navios afundados com ela, a equipe toda salva e Virgil e Lindsey dando um beijo apaixonado sobre o OVNI subaquático. Que fofo!
Apesar dessa pieguice mais ao final, esse “corte do diretor” James Cameron de três horas de duração deu mais substância à história pois, na versão original, toda a parte “guerra fria” do filme não existia, assim como as enormes e ameaçadoras ondas que iriam destruir as cidades. Na versão original, não se tinha uma ideia exata do papel dos ETs, o que ficou mais claro na versão estendida, onde também ficou notória a mensagem pacifista de Cameron e o alerta que ele fazia à humanidade da preservação de nosso planeta, que estamos destruindo o lugar que moramos, etc., exatamente a mensagem que ele quis passar em “Avatar” muitos anos depois. Curiosa também era a forma dos alienígenas, que pareciam enormes águas vivas fluorescentes. Sabemos que, a grandes profundidades existem alguns seres vivos que emitem luz própria para atrair seres vivos que servem de alimento, embora nas profundezas abissais praticamente não haja vida. Dadas essas formas marinhas dos ETs, ficou a impressão de que essa espécie alienígena já habitava o fundo do mar há muito tempo e, pela teoria da evolução das espécies de Charles Darwin, já teria assumido aquelas formas mais vistas em seres marinhos.
Assim, pode-se dizer que essa versão estendida de “O Segredo do Abismo” é muito mais interessante que a versão original, pois acrescentou mais elementos à trama e deu uma mensagem à história, tornando-a motivo de reflexão. Mais uma boa escolha do público para o Cineclube Sci Fi.
Após a exibição do filme, tivemos duas rápidas palestras de Naelton Araújo, astrônomo do Planetário da Gávea, mestre em educação, gestão e difusão em Ciências e que mantém o blog pessoal Céu Urbano, e Rafael Pinotti, M.Sc. em Físico-Química pela UFRJ, onde se graduou em Engenharia Química e cursa atualmente doutorado em Astronomia. Trabalha desde 1990 na Petrobrás como Engenheiro de Processamento. Naelton Araújo lembrou de alguns detalhes do “making of” do filme, como o fato dos atores terem precisado fazer um curso de mergulho para fazer as gravações e das más recordações em rodar o filme em condições altamente adversas, feitas num tanque de um antigo reator nuclear, com uma água com muito cloro para evitar doenças. Naelton ainda lembrou que o tal “fluído respirável” já existe, mas ainda não é utilizado para mergulhos de humanos. Um dos membros da equipe de Virgil tinha um ratinho branco de estimação e ele foi, de fato, submetido ao tal líquido, apesar de a cena ter sido editada. A menção a tal líquido apareceu em outros filmes mais recentes como “Oblivion”. Naelton ainda lembrou que o filme ganhou o Oscar de melhores efeitos especiais em 1990. Já Rafael Pinotti tratou mais da parte científica do filme. Ele lembrou, por exemplo, que as plataformas de prospecção de petróleo a grandes profundidades não são tripuladas, como o filme fantasiosamente mostrava. Pinotti ainda enfatizou que há regiões com petróleo disponível, mas que ainda não foram exploradas principalmente por causa de seu difícil acesso, como o Mar do Ártico, que tem um quarto das reservas distantes de petróleo. Foi ainda lembrado do barateamento atual do preço do petróleo, provocado, sobretudo, pelos Estados Unidos, que inundou o mercado com óleo retirado do solo e, enquanto o petróleo estiver barato, pouco investimento será aplicado na tecnologia de prospecção.
Com relação à situação do filme de ETs vivendo debaixo d’água, Pinotti lançou um questionamento: a tecnologia pressupõe uma manipulação de objetos, algo mais difícil de fazer na profundidade. Assim, seria pouco provável que houvesse uma vida inteligente tecnológica debaixo d’água, embora haja bons exemplos de vida inteligente subaquática como os cetáceos e os polvos. Pinotti também lembrou da pouca quantidade de água existente no planeta, com oceanos de profundidade média de três quilômetros. A pouca quantidade de água é vista também em outros planetas do sistema solar. E nos planetas extrassolares? O primeiro desses planetas foi detectado na década de 1990. Hoje, com a melhoria dos instrumentos de observação, há mais de dois mil planetas extrassolares detectados. E aí descobrimos que nosso sistema solar não é típico, pois foram descobertos planetas semelhantes a Júpiter mais próximos das estrelas dos sistemas. As teorias sobre o sistema solar diziam que os planetas mais próximos ao Sol (Vênus, Terra, Marte, por exemplo) tinham uma atmosfera com espessura bem menor que os planetas mais afastados do Sol (Júpiter, Saturno, Urano, Netuno, por exemplo). A observação de planetas extrassolares a princípio desmente tal teoria. Há também nos planetas extrassolares as chamadas “Super Terras”, onde há muitos planetas maiores em massa que a Terra e menores que Urano e Netuno. Há uma proporcionalidade entre a quantidade de rocha do planeta e a quantidade de água. Como a água e a rocha crescem com o volume em quilômetros cúbicos e ocupam uma área em quilômetros quadrados, há uma especulação de que os oceanos de água em Super Terras possam ter centenas de quilômetros de profundidade. Perguntado pelo público se os cometas da nuvem de Oort que circunda o sistema solar podem ter contribuído para a formação da água do planeta (cometas são compostos de gelo e poeira), tanto Naelton quanto Rafael foram categóricos em afirmar que existem poucas evidências observacionais disso e não se pode esquecer que os asteróides também trouxeram água, o que também tem poucas evidências observacionais. Assim, os palestrantes acreditam que parte da água tenha vindo dos cometas, parte tenha vindo dos asteróides e parte tenha vindo das próprias rochas de nosso planeta, sem uma preponderância mais específica.
A palestra ainda tocou em assuntos como quais são as visões que os humanos têm dos ETs (medo, esperança e curiosidade), onde o medo suscita mais questões. Falou-se, também, do pessimismo em se encontrar inteligência extraterrestre, pois em cinquenta anos de observação de rádio, não houve qualquer evidência encontrada e o fato de que o filme pode ter sido inspirado num conto de H. G. Wells, “O Abismo”, que também tratava da exploração de fossas submarinas.

Como podemos ver, mais uma edição do Cineclube Sci Fi que trouxe bons frutos. Uma versão estendida de “O Segredo do Abismo” que tornou a história mais coesa, boas palestras de pesquisadores renomados e o bate papo agradável onde sempre podemos aprender mais. Se você ainda não conhece, compareça ao próximo!

Cartaz da versão estendida

Virgil, o líder da equipe

Lindsey, em litígio comVirgil e sua equipe.

Seal pirando na batatinha

ETs à espreita

Contatos Imediatos do Terceiro Grau Subaquáticos!!!

ETs fluorescentes

O tal líquido respirável

OVNI subaquático emergindo

Naelton Araújo, um dos palestrantes...










terça-feira, 22 de setembro de 2015

Resenha de Filme - O Agente da U.N.C.L.E.

O Agente Da U.N.C.L.E. Tios Da Guerra Fria.
Um interessante blockbuster passa nas telonas. “O Agente da U.N.C.L.E” é baseado numa antiga série de TV e transpira os tempos da Guerra Fria. Antes de mais nada, é muito legal dizer aqui que, mais uma vez, temos um filme com uma boa caracterização de época, onde locações, cenários e figurino fazem muito bem o seu papel. Mas a película não é somente isso. Temos uma trama bem interessante, com cenas de espionagem e ação na medida certa, com pouca pirotecnia.
O filme fala de uma aliança entre um agente secreto americano, Napoleon Solo (interpretado pelo “Superman” Henry Cavill) e um agente secreto russo, Illya Kuryakin (interpretado pelo “Cavaleiro Solitário” Armie Hammer), formada para desbaratar um grupo terrorista formado por antigos fascistas e nazistas da Segunda Guerra Mundial que conseguiram montar uma ogiva nuclear. Entre esses dois agentes, está uma jovem moça, mecânica de automóveis na Alemanha Oriental, de nome Gaby (interpretada por Alicia Vikander), que é filha de um antigo cientista alemão que foi capturado pelo grupo terrorista. Solo, Kuryakin e Gaby irão se unir para salvar o pai da moça e retirar a ogiva do controle do grupo. Não sem muitas cenas dignas dos tempos áureos dos filmes de espionagem e um toque de filme de ação, tão caro aos dias de hoje.
Com relação ao elenco, apenas um medalhão, Hugh Grant que, como não podia deixar de ser, representa a Inteligência Britânica. Mas houve uma boa química entre os protagonistas, que já são relativamente rodados. Alicia Vikander, por exemplo, fez o ótimo “O Amante da Rainha”, com Madds Mikkelsen. Já Armie Hammer pareceu melhor que Henry Cavill, pois seu personagem Illya era mais interessante pelo fato de ser pavio curto e tinha que disfarçar isso, dado que sua identidade secreta era a de um pacato arquiteto. Obviamente, houve momentos em que ele não conseguia disfarçar a sua raiva, o que rendeu algumas boas risadas. O personagem de Cavill era um sujeito mais classudo, dando à interpretação um tom um tanto canastrão, só não superado por Hugh Grant, “hors concours” nesse quesito.
O grande mérito do filme é o fato dele ser centrado no gênero da espionagem, mais cerebral que os filmes de ação. Assim, a película se passa de forma totalmente diferente da que esperamos quando vemos o “trailer”. Tem realmente bons diálogos com conteúdo, uma coisa mais cerebral. E o climão retrô, tão bem retratado nas já citadas reconstruções de época com boas locações, cenários e figurinos, é reforçado pelas antigas divisões de tela para presenciarmos ações simultâneas que auxiliavam a compreender melhor a narrativa, como víamos nos filmes daquela época do tipo “Aeroporto 1970” ou, mais recentemente, na série de TV “24 Horas”.

Dessa forma, “O Agente da U.N.C.L.E”, se é uma diversão comercial descartável, também é um filme que agrada, pois tem bom conteúdo nos diálogos, é mais um inteligente filme de espionagem que de ação, tem uma boa química dos atores e uma excelente e elegante reconstituição de época. Vale a pena dar uma conferida.

Cartaz do filme

Cartaz do filme no Brasil

Superando as diferenças da Guerra Fria.

Uma moça em busca do pai

Uma vilã muito sensual (interpretada por Elisabeth Debicki)

Poucas cenas de ação na medida certa.

Hugh Grant e os traços da idade...




quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Resenha de Filme - Infância

Infância. Memórias De Domingos De Oliveira.
O renomado diretor Domingos de Oliveira está de volta com mais um filme. “Infância”, como o próprio título denuncia, tem um quê autobiográfico que se remete a um Rio de Janeiro dos tempos de Carlos Lacerda, Getúlio Vargas e Samuel Wainer. Numa suntuosa mansão, cuja Dona Mocinha (interpretada magistralmente por Fernanda Montenegro) controla a vida de seus filhos, genros e netos com mão de ferro, temos uma reprodução microcósmica de uma sociedade conservadora e tradicional. No meio disso tudo, o pequeno Rodriguinho (interpretado por Raul Guaraná), alterego do diretor, se ressente da perda de sua cachorrinha que morreu comendo bolinhas de naftalina. Rodriguinho também quer se lembrar de seu falecido avô, que o tinha como seu neto favorito. O menino leva uma vida mergulhado nos livros, jogos de xadrez e aulas particulares com uma formosa professora (interpretada por Maria Flor). A forma conservadora como era educado o isolava de uma infância normal com escola e amigos. Enquanto isso, Dona Mocinha fazia questão de escutar um programa de rádio com um discurso de Carlos Lacerda, ativo opositor direitista do governo Vargas, obrigando toda a família a fazer o mesmo, que admirava o jornalista mais pela “performance” de sua oratória do que pelo conteúdo de seu discurso, embora todos concordassem com ele. É desnecessário dizer que as figuras de Vargas e Wainer eram totalmente execradas nessa casa tradicional. Mas nem tudo é unanimidade nessa família. O filho de Dona Mocinha (interpretado por Ricardo Kosovski) é desquitado e tem um filho totalmente agressivo. E o pai de Rodriguinho (interpretado por Paulo Betti) faz negócios com os imóveis de Dona Mocinha sem autorização, vendendo apartamentos da matriarca no Andaraí e comprando terrenos no “fim de mundo” que era o Leblon. E assim, sem mais spoilers, Rodriguinho vai recordando de sua infância.
Esse filme é baseado na peça “Do fundo do lago escuro”, escrita por Oliveira em 1977, como o diretor faz na maioria das vezes, adaptando suas peças para o cinema. Além de um certo tom nostálgico com o Rio de Janeiro dos anos 1950, o filme tem como característica principal radiografar a elite conservadora da sociedade daquela época e suas neuras. A figura da mãe que interferia na vida de todos, de forma praticamente “absolutista”, onde todos tinham que se submeter aos seus gostos, opiniões e caprichos. A família certinha, com um nome a zelar, da esposa submissa ao marido, espelhada nos pais de Rodriguinho. O filho que se perdeu ao se desquitar de sua mulher, o que fez com que o netinho se tornasse um perturbado por ter uma família fora dos padrões e agredir gratuitamente a torto e direito. A empregada (interpretada por Nanda Costa) amparada por um caseiro mais velho, seu futuro marido, cujo casal é criticado pela matriarca pela diferença de idade, mas mesmo assim, tolerado de uma certa forma, como se as classes mais baixas, pela sua própria condição, não precisassem, obrigatoriamente, passar pelo crivo dos valores das sociedades tradicionais, dado o seu “baixo nível”.
Uma coisa que sempre chama a atenção em filmes de época é a reconstituição do passado, seja no vestuário, penteado, maquiagem e locações. E esta foi impecável no filme, muito bem trabalhada, o que dá um conteúdo estético fascinante, tornando a película uma coisa bonita de se ver. Nesse ponto, o filme foi perfeito.

Dessa forma, “Infância” foi uma boa produção de Domingos de Oliveira, recuperando a credibilidade de seu cinema, que tinha sofrido alguns arranhões em seus últimos filmes. Mérito pela reconstituição de época. Mérito pela visão crítica de uma antiga sociedade. Mérito pela boa escolha do elenco (uma Fernanda Montenegro sempre ajuda muito). Um filme que vale a pena ver e ter.

Cartaz do filme

Uma família bem comportada.

Dona Mocinha. Matriarca com mão de ferro.

Rodriguinho e sua professorinha

A empregada que encanta.

A mesa tradicional

Domingos de Oliveira.

Montenegro e Oliveira na divulgação do filme...

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Resenha de Filme - Jia Zhangke, Um Homem De Fenyang.

Jia Zhangke, Um Homem De Fenyang. Mais Uma Obra Prima de Walter Salles.
Walter Salles está de volta. O consagrado diretor de “Central do Brasil” mostra mais uma vez que não é cineasta de um filme só e nos traz dessa vez o bom documentário “Jia Zhangke, Um Homem de Fenyang”. O filme mostra a trajetória do cineasta do norte da China, Jia Zhangke, considerado um dos melhores do país. Podemos ver aqui Jia visitando sua cidade natal, reencontrando seus amigos de infância e adolescência, atores com os quais ele trabalhou e, principalmente, falando em seu dialeto local, diferente do chinês mandarim, a língua oficial do país. Alguns de seus filmes são feitos com esse dialeto, algo que Jia faz questão pois, para ele, os sotaques e idiomas locais desapareceram do cinema chinês depois da revolução socialista de 1949, que padronizou o idioma e o sotaque (“todo mundo parecia que falava como locutor de rádio”, nas palavras do cineasta). Seus filmes iam contra os dogmas chineses da revolução cultural. É possível ver música pop em seus filmes, assim como referências a filmes indianos que tinham como protagonistas pessoas à margem da lei. O cineasta, quando jovem, cantava uma música de um desses filmes indianos, que falava da vida dos malandros, quando foi severamente reprimido por seu professor. Anos depois, essa mesma música e filme aparecem em uma de suas películas. Obviamente, Jia teve problemas com o governo chinês e a sua censura. Ele, inclusive cogitou abandonar a carreira. Mas a levou adiante. Aliás, os anos de opressão do regime comunista afetaram o cineasta muito mais do que se pode imaginar, sobretudo quando ele se recorda da figura do pai, que tinha sofrido repressões durante a Revolução Cultural e destruiu um diário particular com medo de represálias. Jia exibiu um de seus filmes ao pai, que o alertou que seu filme seria considerado subversivo e anticomunista durante a Revolução Cultural. Para Jia, seu pai sempre teve poucos momentos de felicidade em virtude da repressão. Com a chegada do capitalismo e de uma certa distensão, seu pai se tornou uma pessoa um pouco mais alegre. Mas aí veio o câncer... e a morte. Jia se lembra de tudo isso com muita dor no coração. Quanto à chegada do capitalismo, Jia não vê o sistema econômico ocidental como uma panaceia para os problemas chineses. Jia se preocupou em verificar como o operariado chinês seria afetado pela transição entre uma economia planificada socialista e a economia de mercado capitalista. A desativação das fábricas em virtude da forte especulação imobiliária piorou demais as condições de vida dos trabalhadores, que tinham seus destinos muito atrelados à vida das fábricas, agora extintas. Em outro documentário, ele retratou a tragédia que foi a construção de uma barragem que alagaria permanentemente cidades que tiveram que ser destruídas inteiras à marreta em tempo recorde.

Dessa forma, “Jia Zhangke, Um Homem De Fenyang” é mais um trabalho colossal de Walter Salles. Um cineasta que fala de outro cineasta. Cinema radiografado pelo próprio cinema. Radiografia feita com altas doses de carinho e uma pitadinha de paixão, mergulhando no humano e íntimo de um fazedor de filmes de uma cultura tão variada e distante da nossa. Um filme que vale a pena ter e guardar. 

Cartaz do filme


Jia (atrás da panela). Retorno às origens.

Repressão chinesa. Momentos difíceis.

Com um ator que fez vários de seus filmes


Com a mãe e a irmã...

Nas filmagens...

Nosso grande cineasta e Jia

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Resenha de Filme - Campo de Jogo

Campo De Jogo. Velhos Estereótipos.
Um curioso documentário brasileiro na área. Eryk Rocha, o filho de Glauber, lança esse pequeno filme de pouco mais de setenta minutos, intitulado “Campo de Jogo”. O documentário narra a final do Campeonato de Futebol de Favelas no Rio de Janeiro, onde tivemos a partida entre o Geração contra o Juventude. Uma partida que terminou em 0 a 0 no tempo normal e foi para os pênaltis. Quem venceu? Chega de “spoilers”!!!
Entretanto, independente de quem venceu, o documentário levanta outras questões. Em primeiro lugar, por se tratar do filho de Glauber Rocha, fica a pergunta inadiável: até onde o filho se espelhou no pai para fazer seus filmes? Há algum traço de Glauber na produção de Eryk? Podemos dizer que o filho tem um estilo próprio, apesar de o pai aparecer em alguns momentos. Onde Eryk mostra seu estilo?  Houve no filme momentos muito tensos, sobretudo quando a galera discordava de algumas marcações do juiz, onde um enxame composto por jogadores e muitos populares o cercava. Nessa hora de truculência extrema, Eryk colocava músicas extremamente suaves e voltava os fotogramas, dando a impressão de que o juiz encarava e afastava seus algozes justamente quando era o contrário. Por outro lado, o filme tinha uma leitura um tanto glauberiana, remetendo-se, sobretudo, ao que víamos em “Barravento”, quando havia uma busca por raízes ancestrais africanas. Tal busca por essas raízes não só africanas, mas também indígenas é vista nos times das comunidades envolvidas. Não só os times quanto os integrantes das torcidas eram vistos como pertencentes a uma grande aldeia, repleta de exotismo, onde chegamos ao cúmulo de ver adolescentes com uniformes de futebol pulando dentro de florestas ao som de batuques. Tal ponto de vista pareceu excessivamente estereotipado, como se a ideia que o povo do “asfalto” tem das comunidades fosse de um agregado de pessoas carregado de culturas ancestrais africanas, quando sabemos que a diversidade das comunidades cariocas não é somente isso. Tal ponto de vista, se no início do Cinema Novo nos ajudava a ter uma perspectiva mais multicultural do Brasil, onde a cultura dos segmentos menos favorecidos era assinalada, parece hoje mais uma forcação de barra, pois tal ideia estereotipada pode aumentar uma segregação. Sabemos que a população das comunidades sofre um violento processo de exclusão social e aspira por cidadania e direitos. Rotular a população das comunidades cariocas como meros herdeiros de práticas ancestrais  africanas e indígenas consideradas exóticas aos olhos dos “civilizados do asfalto” pode ser algo prejudicial no processo de inclusão social de tais comunidades.

Assim, se o diretor pretendeu, mesmo que sem más intenções, buscar as raízes culturais de tais comunidades, fica importante frisar que o estereótipo que tal visão pode provocar não deve excluir os povos de tais comunidades dos direitos de cidadania. O documentário poderia ter tido, a título de sugestão, alguns depoimentos de personagens do filme e de seus parentes alternados com as sequências do jogo para, nesses casos particulares, podermos enxergar mais pontualmente as diversidades presentes nas comunidades cariocas, que não tem somente negros descendentes de escravos, mas também outros estratos culturais como imigrantes nordestinos. Nunca é bom generalizar...

Cartaz do filme


Menino com rosto sujo de barro. Pinturas ancestrais?

Várzea hardcore!!!

Disputa de pênaltis. Tons de batalha épica...

Filme prima por uma boa montagem...

Cenas de união...

Eryk Rocha.





segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Resenha de Filme - Que Horas Ela Volta?

Que Horas Ela Volta? Rupturas E Continuidades Em Feridas Profundas De Nossa Sociedade.
Nosso Cinema Brasileiro com “B” maiúsculo produziu mais uma pérola. E quem diz isso é o Festival de Sundance (prêmio de melhor atriz para Regina Casé) e o Festival de Berlim (prêmio do público). Não é à toa que essa película tem grandes chances de ser o filme brasileiro que vai tentar chegar à indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. “Que Horas Ela Volta?” está muito bem visto no exterior, e agora no Brasil, já que infelizmente o caminho do sucesso em nosso país vem pelas vias inversas, isto é, o filme brasileiro tem que ser primeiro bem sucedido lá fora para depois ter sucesso aqui. Além disso, a película tem outro grande mérito: retoma o talento de Regina Casé como atriz, perdido nos “Esquentas” da vida e em filme de comédia da Globo. Aqui temos outra produção da Globo, mas é outro papo.
Vemos aqui a história de Val (interpretada por Regina Casé), uma empregada doméstica nordestina de uma família podre de rica de São Paulo. Val mora no emprego e é acometida de uma síndrome que muitas empregadas domésticas do Brasil passam: ela é “de casa”, desde que saiba de seu lugar, não tenha FGTS nem direitos trabalhistas, ou seja, é tratada como uma cidadã de 2ª categoria, totalmente subserviente. Ela trata o filho de sua patroa, Fabinho (interpretado na infância por Michel Joelsas) com tamanha afetuosidade que ele parece ser seu filho. Aliás, é praticamente isso mesmo, já que Bárbara, a patroa (interpretada por Karine Teles) sempre teve uma vida profissional atribulada e seu filho praticamente foi criado pela empregada. Tudo ia bem naquela mansão “coxinha” até que, um dia, Val recebe uma ligação de sua filha Jéssica (interpretada por Camila Márdila), que diz que vai a São Paulo tentar o vestibular e precisa de ajuda. Val, que não vê a filha há dez anos, vai acomodar Jéssica na casa de seus patrões. E aí a coisa degringola, pois Jéssica é uma menina estudada e quer fazer arquitetura numa das melhores faculdades de São Paulo. Sua personalidade forte, independente e esclarecida contrasta com a personalidade submissa de Val, despertando a curiosidade e paixão do marido José Carlos (interpretado por Lourenço Mutarelli) e o ódio de Bárbara, já que Jéssica não se comporta como uma empregada, como se ela não “soubesse o seu lugar”. Acontece que Jéssica não era empregada de ninguém, mas sim sua mãe Val. E aí vemos um conflito de classes sociais na mansão paulistana do Morumbi.
Essa película de Anna Muylaert tem a grande coragem de cutucar uma das mais profundas feridas de nossa sociedade, que é a relação entre as empregadas domésticas e seus patrões. Tal relação é uma das heranças mais vívidas do escravismo do Antigo Regime em nosso povo. A relação entre patroa e empregada é altamente paternalista (“Val é de casa!”) desde que a empregada saiba seu lugar, aceite a exploração econômica das elites e abra mão de seus direitos trabalhistas e de seu patamar de igualdade como cidadã numa sociedade pretensamente liberal e desenvolvida. Val está imersa, juntamente com Bárbara, nas tradições do Antigo Regime escravista, muito presentes em nossa sociedade. Já Jéssica representa a modernidade e a sociedade liberal. Ela é tratada como igual pelo ricaço Zé Carlos, fortemente apaixonado por ela, é uma moça que adora ler e estudar, não aceita subserviências impostas pelas elites. Obviamente, o conflito entre mãe e filha tornar-se-á latente, devido à diferentes visões de mundo. Mas o mais curioso é a dor que mãe e filha sofreram com virtude de dez anos de afastamento, onde a tentativa de uma nova vida no Sudeste foi a causa principal. A exploração colonial que levou ao flagelo da seca no Nordeste, outro tema caro à época do Antigo Regime, foi o fator que separou as duas por tanto tempo e essa separação só acabará com a união das duas, tal como se essa união desse a elas uma perspectiva mais concreta de inserção na sociedade liberal. A união das duas, que foram separadas por flagelos ancestrais, irá romper com as tradições, onde a filha traz a modernidade e a ruptura à mãe presa nos grilhões do passado.

Dessa forma “Que Horas Ela Volta?” é um filme importantíssimo para a filmografia brasileira, pois ele nos ajuda a entender um pouco mais de nós mesmos como uma nação que busca um futuro, tensionando o fio entre a tradição e a modernidade, o autoritário e o liberal, o Antigo Regime e o Capitalismo, o escravismo e a liberdade. Um filme que desnuda contradições profundas de nossa sociedade e, por isso mesmo, deve ter despertado tanta curiosidade no estrangeiro com relação a nós. A película pode até não chegar ao Oscar, mas já fez muito, pois chegou ao fundo de nossas almas como brasileiros. Uma história imperdível para ver, ter e guardar, que nos ajuda a entender um pouco mais de nós mesmos.

Cartaz do filme

Val, presa aos grilhões do passado...

Amor maternal ao filho da patroa.

Que Horas Ela Volta? : Foto
Bárbar, patroa que defende as tradições...

Um polêmico jogo de xícaras...

Que Horas Ela Volta? : Foto Camila Márdila, Regina Casé
Jéssica e Val. Acertando as contas com o passado

Que Horas Ela Volta? : Foto Camila Márdila
Uma piscina polêmica...

Que Horas Ela Volta? : Foto
Jéssica e José Carlos. Paixão de patrão...

Que Horas Ela Volta? : Foto
Regina Casé e a diretora Anna Muylaert