Nahid:
Amor E Liberdade. Enfrentando Tradições.
O cinema iraniano está de volta
(que bom que essas películas ainda pairam por aqui, depois de superarem um certo
preconceito) às nossas telonas. E, mais uma vez, a opressão da mulher na
sociedade muçulmana é discutida. Dessa vez, temos “Nahid: Amor e Liberdade”, da
diretora Ida Parahandeh, que também assina o roteiro em companhia de Arsalan
Amiri. Tem-se falado por aí que essa película lembra muito o premiado “A
Separação”. E lembra mesmo, principalmente na questão de litígio de casais e imbróglios
jurídicos. Mas creio que esse filme acrescenta mais alguns elementos.
Vemos aqui a história da Nahid em
questão (interpretada por Sareh Bayat, que podemos dizer que tem uma
estonteante beleza, além de ser uma espécie de sósia da Ana Paula Padrão), uma
mulher que vive com seu filho Amir Reza (interpretado por Milad HoseinPour)
numa tremenda pindaíba financeira, devendo a Deus e ao mundo, passando por situações
muito desagradáveis com seu senhorio. O emprego de digitadora não lhe dá o suficiente
para o sustento e dá-se a entender também que Nahid não é muito cuidadosa com
seus gastos. Ela é separada de Ahmad (interpretado por Navid Mohammadzadeh), um
cara que é viciado em drogas e jogo, vivendo com capangas em seu encalço a lhe
cobrar dívidas. Nahid e Ahmad fizeram um acordo: ela abria mão do dote do
marido, não poderia mais se casar e, em troca, teria a custódia do filho que,
pelas leis iranianas é do pai em caso de separação. Nahid se apaixona por
Massoud (interpretado pelo belo Pejman Bazeghi), que possui um estrato social
mais alto e que quer casar com Nahid. Mas todos os impedimentos legais deixam a
moça em maus lençóis. Massoud então sugere a curiosa saída do casamento temporário,
permitido pelas leis iranianas, renovável todo mês por uma quantia módica no cartório.
Apesar de permitida por lei, essa saída é muito malvista na sociedade iraniana.
E aí, fica a questão: quem e pior? O ex-marido que é viciado ou a mãe que se
submete a um novo matrimônio, mesmo sabendo que pode perder a guarda do filho?
É claro que a personagem de Nahid
é vista como a grande vilã da história por seus pares, mesmo que Ahmad seja um
tremendo zé preá. Esses filmes iranianos são bons no sentido de que eles exibem
que pontos de vista culturais dos quais discordamos solenemente por aqui não são
apenas reflexo das ações de um Estado teocrático autoritário. É uma questão sócio-cultural
muito mais profunda que isso, enraizada nos corações e mentes de muitas
pessoas. Sei que é um tema já batido colocar a coisa em apenas dois parâmetros,
mas novamente cito o embate entre tradição e modernidade. Nahid, juntamente com
o seu novo namorado, são reflexo de uma modernidade que enfrenta tradições profundamente
arraigadas e que oprimem solenemente o gênero feminino. Nahid é uma mulher que
quer ter liberdade para ter seu filho e amar um novo homem, mas os costumes e
as leis não deixam. Só que o filme não cai apenas nesse lugar-comum de mostrar
a mulher oprimida que busca heroicamente sua liberdade. Há uma certa crítica
velada ao consumismo de Nahid que somente a ajuda a cavar mais ainda o buraco
de sua falência financeira. Será que a diretora e roteirista quis fazer um
alerta? Que, nessa ânsia de modernização da sociedade iraniana, onde há espaço
para mais respeito à mulher, há espaço também para armadilhas como a cultura de
consumo? Pareceu que ficou uma questão velada aqui: até onde é saudável abandonar
essa tradição e abraçar essa modernidade? Afinal de contas, Nahid mentia e
roubava para aliviar suas dívidas, mas também para sustentar seus impulsos
consumistas. E mentir e roubar não são pecados capitais numa sociedade
teocrática? Será que ficou um tanto implícito que as desventuras que nossa
protagonista passara foram, em parte, bem merecidas? Se houve essa intenção,
essa película é muito mais complexa do que parece e já bate “A Separação” nesse
quesito.
Dessa forma, “Nahid: Amor e
Liberdade” honra novamente um cinema iraniano que busca radiografar e analisar
sua sociedade na busca por um pensamento mais libertário e democrático, mas
desta vez não sem fazer uma crítica à sociedade capitalista de consumo. O enfoque
às disparidades sociais e às más situações econômicas pessoais foi um elemento
muito bem vindo nessa complexa película que não ficou somente na crítica a um
autoritarismo do Estado teocrático. Vale muito a pena ver esse filme! E não deixe
de ver o trailer após as fotos.
Cartaz do Filme
Nahid não pode se casar novamente
Massoud quer dar uma vida confortável a Nahid...
Luta para manter a guarda do filho
Mas como papai é um cretino!!!
Disputando uma mulher...
A diretora Ida Paranandeh.
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