O
Último Poema Do Rinoceronte. Desencontros e Desencontros.
Uma co-produção
iraniana, iraquiana e turca de 2012, apadrinhada por Martin Scorsese, somente agora em nossas telas. “O Último
Poema do Rinoceronte” nos conta uma história inspirada em fatos reais. O
diretor é o curdo-iraniano Bahman Ghobadi, que está exilado de sua terra natal,
amargando situações difíceis em terras estrangeiras, sobretudo na hora de
organizar a produção de um filme. A vida pessoal de Ghobadi não deixa de ter
uma certa semelhança com o que é retratado na película.
Vemos aqui a história
do poeta iraniano Sahel Farzan (interpretado por Behrouz Vossoughi), altamente
conceituado em seu país na época do Xá Rehza Pahlevi. Mas o Xá foi derrubado
pela Revolução Islâmica e a antiga elite local passou por maus bocados. Sahel e
sua esposa Mina (interpretada pela belíssima Monica Bellucci) são presos, com o
escritor sendo condenado a trinta anos de prisão e sua esposa a dez anos de
prisão. Quando a esposa é libertada, ela recebe a notícia de que seu marido
está morto e enterrado, o que não era verdade. Trinta anos depois de sua
prisão, Sahel viaja para a Turquia onde sua esposa agora vive, na esperança de
reencontrá-la.
O mais cruel dessa
história é que várias situações como essa aconteceram, ou seja, as esposas de
cidadãos presos pelo regime islâmico receberam a falsa notícia de que eles
foram mortos e chegaram até ao cúmulo de erguer sepulturas falsas para as
famílias visitarem, enquanto que os prisioneiros seguiam detidos. O filme
denuncia, também, a perseguição à etnia curda no Irã, mesma etnia que sofreu
ataque de armas químicas no Iraque de Saddam Hussein. Logo, o filme tem um alto
tom de denúncia.
Outro elemento
angustiante da história é uma sucessão de desencontros que acontecem recorrentemente.
O casal é separado na prisão e só tem uma pequena oportunidade de se
encontrarem uma última vez, mas mesmo assim, a coisa não ocorre a contento (não
darei maiores detalhes para não aumentar mais ainda os spoilers). E, depois, na
busca de Sahel por sua esposa, as situações adversas que depõem contra um
reencontro são muito frequentes e angustiantes.
Os atores estiveram
impecáveis. Monica Bellucci, aristocrática no período do Xá, e a expressão da
sofreguidão em pessoa durante a Revolução Islâmica, chegando a uma idosa
compenetrada que escondia todo o seu sofrimento passado com dignidade. Behrouz
Vossoughi era o mutismo em pessoa. Não me lembro dele ter dito sequer uma
palavra durante toda a película. Sua expressão vazia, olhando para o infinito
fixa e perdidamente, detentora de uma imensa melancolia, continha uma sucessão
de claros e escuros dignos do barroco mais tradicional. Em alguns momentos mais
sofridos, víamos nele um choro contido, mas que deixava clara uma agonia
extrema levada às raias do paroxismo. Os anos de prisão e tortura tornaram-no
um homem semi-destruído. Outro personagem de destaque foi o bom ator Yilmaz
Erdogan, que interpretava Akbar Rehzai, o motorista do casal nos tempos do Xá e
que era perdidamente apaixonado por Mina. Esse personagem vai ter um papel
muito importante na história.
Assim, “O Último Poema
do Rinoceronte” é uma obra ímpar, que mais uma vez denuncia o autoritarismo
existente em algumas partes do mundo, desta vez o Irã. Autoritarismo seja no
trato áspero contra opositores do regime e até contra minorias étnicas
perseguidas. E o uso do cruel expediente de dar a falsa informação de que o
parente preso está morto quando ocorre justamente o contrário. Tudo isso
escrito e dirigido por um cineasta que também amarga um exílio e diz que faz
filmes para não enlouquecer, como vários artistas de origem curda que estão
proibidos de se manifestar publicamente no Irã e passam por uma depressão.
Definitivamente, um filme fundamental para qualquer cinéfilo.
Cartaz do filme.
Um casal que será separado...
Um motorista apaixonado por sua patroa...
Três pessoas marcadas pela Revolução Islâmica...
Torturas e divagações...
Tentando reconstruir seu passado...
O mutismo em pessoa... fisionomia barroca...
Melancolia...
Desejando um reencontro...
Nem as tentações de juventude são capazes de reanimá-lo.
Uma filha que não foi...
Olhando para o infinito...
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