Impressões
Sobre O Oscar 2016.
E finalmente aconteceu
a tão esperada festa do Oscar, no último dia 28 de fevereiro. O “Oscar da
Diversidade” se desenrolou em meio a graves turbulências provocadas pelo fato
de que, pelo segundo ano consecutivo, nenhum artista negro foi indicado ao
prêmio. No ano passado, a festa se limitou a tocar na questão com o discurso da
presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, Cheryl Boone
Isaacs que, diga-se de passagem, é negra. Esse ano, além do discurso da
presidente, que usou a retórica do “deve-se sempre encarar os desafios” para
justificar a ausência de negros, houve também todo um trabalho em cima da
questão, onde decidiu-se fazer muitas piadas sobre o problema, sendo algumas
até de mau gosto, como a “homenagem” para o ator branco Jack Black, ou seja,
rir da situação, mesmo que fazendo uma espécie de “mea culpa”. Para mestre de
cerimônias, por exemplo, foi escalado Chris Rock, famoso por fazer piadas bem
ácidas sobre questões raciais. E Chris Rock não aliviou. O homem usou uma roupa
que mais lembrava a de um garçom de restaurante que de mestre de cerimônias. Ele
entrevistou negros na rua perguntando o que eles achavam da ausência de
indicações de negros na premiação. Muitos diziam, em tom de brincadeira, que
não sabiam dos indicados brancos. E, ainda, Rock “deu” um Oscar para os
entrevistados e pediu para eles fazerem um agradecimento. Uma senhora quase
levou o Oscar para casa e, quando Rock disse que não era para levar a
estatueta, ela disse: “Ué, pensei que podia levar”. Rock ainda colocou “filhas”
para vender biscoito entre os brancos como no episódio de “Todo Mundo Odeia o
Chris”, onde seu personagem na infância precisava vender biscoitos dados pela
escola para arrecadar dinheiro para sua turma fazer uma viagem a Washington.
Sei não, mas essa coisa
de fazer piada com um tema polêmico pode acabar sendo uma faca de dois gumes. E
eu particularmente acho que não ficou de bom tom. Ano passado, “Selma” já
merecia mais indicações. E, este ano, o ótimo trabalho feito em “Creed” por
Ryan Coogler e Michael Jordan também merecia mais indicações que apenas para o
branco Stallone. Se a argumentação de não indicações a negros ficou
fundamentada na retórica do desafio, tanto “Selma” quanto “Creed” mostram que o
desafio está sendo aceito e rendendo frutos dignos de premiação. Assim, brincar
com essa situação me pareceu mais uma bola fora do que qualquer coisa. Enfim...
Mas, e a festa em si?
Bom, o primeiro destaque foi os seis prêmios dados a “Mad Max”, todos técnicos
(figurino, design de produção, maquiagem e cabelo, edição, edição de som e
mixagem de som). Confesso que achei um pouco exagerada essa premiação toda. No
figurino, por exemplo, “A Garota Dinamarquesa” e “Carol” poderiam ter levado.
Na edição, “A Grande Aposta” era o meu favorito, pois sua montagem tinha
lampejos frenéticos que prenunciavam a crise econômica iminente. Numa das categorias
técnicas onde “Mad Max” poderia ganhar – os efeitos visuais – a estatueta foi
para “Ex-Machina”, uma surpresa. Confesso que gostaria de ter visto esse prêmio
ir para “Guerra nas Estrelas”. Seria uma justa homenagem a uma franquia que
revolucionou os efeitos visuais no cinema e, no “Despertar da Força” inovou
nesse quesito mais uma vez, com notáveis cenas de combate terra-ar. Ainda
falando de “Guerra nas Estrelas”, tivemos a simpática presença de C3PO, R2-D2 e
BB-8 na premiação, fazendo umas piadas com John Willliams, que estava na
plateia.
No caso da atriz
coadjuvante, o prêmio para Alicia Wikander foi bem merecido. Corre um boato de
que ela foi indicada nessa categoria, pois não teria muita chance para melhor
atriz, já que o papel de Wikander em “Garota Dinamarquesa” era mais de
protagonista que de coadjuvante. Mas, assim mesmo foi um Oscar merecido, onde
havia boas concorrentes como Kate Winslet, Rooney Mara, Jennifer Jason Leigh e
Rachel McAdams.
Na fotografia, foi dado
um esperado prêmio para “O Regresso”, que estava espetacular mesmo, embora
houvesse excelentes concorrentes como “Os Oito Odiados” e “Sicario”, esse um
excelente filme que passou ano passado e que não foi muito falado por aqui.
Para roteiro original,
“Spotlight” ganhou a estatueta, vencendo concorrentes de peso como “Ponte dos
Espiões” e a excelente animação “Divertida Mente”. É muito importante que uma
película como essa ganhe, pois é um filme que denuncia de forma bem contundente
os casos de pedofilia na Igreja Católica.
Para roteiro adaptado,
o prêmio foi para outro importante filme, “A Grande Aposta”, que denunciou a
escalada da crise econômica recente que destruiu a vida de muitas pessoas no
mundo inteiro. Mais um filme que merecia ser visto com maior carinho pela Academia,
além de “Spotlight”.
Para o longa de
animação, o prêmio foi para o grande favorito, “Divertida Mente”. Nosso “O
Menino e o Mundo” não pôde ganhar com tamanho concorrente, mas só a sua
indicação já foi uma grande vitória. Na categoria curta de animação, o Oscar
foi para o chileno “Bear Story”, uma metáfora da ditadura chilena e o primeiro
Oscar do Chile.
Para ator coadjuvante,
o Oscar foi merecidamente para Mark Rylance em “Ponte dos Espiões”. Essa
estatueta foi disputada por candidatos muito fortes como Christian Bale,
Sylvester Stallone, Tom Hardy e Mark Ruffalo. Se Hardy e Ruffalo tivessem
levado, também teria sido justo. Com tantos concorrentes de peso, Stallone não
teve a menor chance, embora ele tenha sido cotado como favorito. Rylance acabou
sendo considerado uma surpresa, mas sua atuação estava excelente.
O melhor longa
documentário foi para “Amy”, sobre a polêmica cantora Amy Winehouse, dirigido
por Asif Kapadia, o mesmo diretor do documentário “Senna”.
Na parte “In Memoriam”,
apresentada por Loius Gosset Jr, recordamos as personalidades do meio
cinematográfico falecidas este ano, com destaque para nomes como Ettore Scola,
Wes Craven, Lisabeth Scott, Christopher Lee, Robert Loggia, Maureen O’Hara,
Omar Shariff, Dean Jones (que dirigia o “Herbie” em seus primeiros filmes),
Alan Rickman, James Horner, David Bowie e Leonard Nimoy. Dave Grohl, vocalista
do Foo Fighters, fez o fundo musical só com seu violão e sua voz.
Para o Oscar de filme
estrangeiro, ganhou o favoritíssimo “O Filho de Saul”, que abordou novamente os
campos de concentração nazistas na Segunda Guerra Mundial, um tipo de filme que
muito agrada à Academia, já que ela contém uma boa quantidade de pessoas de
origem judaica. Mas havia concorrentes excelentes como o colombiano “O Abraço
da Serpente”, o francês “As Cinco Graças” e o filme dos Emirados Árabes Unidos
“O Lobo do Deserto”.
Para a trilha sonora, o
Oscar foi de forma bem merecida para Enio Morricone, por “Os Oito Odiados”. Foi
o primeiro Oscar do músico que, aos 87 anos, foi efusivamente abraçado por
Quincy Jones, que apresentou o prêmio. Morricone agradeceu em italiano, com
direito a um intérprete. Dá para perceber que o nível do homem é outro, não?
Quem pode, pode...
E não é que até James
Bond ganhou um Oscar? Foi de melhor canção, “Writing From The Wall”, composta
por Jimmy Snapes e Sam Smith.
Para o prêmio de
diretor, Alerrandro Iñárritu conquistou o “bicampeonato” por “O Regresso”. Ele
já tinha ganhado ano passado por “Birdman”. Em seu discurso, Iñárritu novamente
se lembrou da questão racial, dizendo que haverá um dia em que a cor da pele
será tão irrelevante quanto o comprimento de seu cabelo. Ele se iguala a John
Ford e Joseph Mankiewicz, que também ganharam dois Oscars consecutivos como
diretores.
Para melhor atriz, Eddie
Redmayne apresentou a premiação, que foi para Brie Larson, por “O Quarto de
Jack”. Era a favorita, embora não devamos nos esquecer que havia mais duas
carinhas novas competindo, Saoirse Ronan (“Brooklyn”) e Jennifer Lawrence, com
as “divas” Cate Blanchett e Charlotte Rampling correndo por fora. Mas como é um
prêmio de indústria, ganhou a jovem mais promissora que, cá para nós, também
foi muito bem.
Para melhor ator,
Juliane Moore deu a estatueta mais esperada da noite para Leonardo DiCaprio.
Finalmente o ator ganhou um Oscar depois de preterido injustamente, batendo
ótimos concorrentes como Eddie Redmayne (meu favorito), Bryan Cranston e
Michael Fassbender. Em seu discurso, DiCaprio se lembrou da boa parceria com
Tom Hardy, agradecendo-o, e falou do aquecimento global, mencionando o fato de
que as filmagens de “O Regresso” precisaram ser feitas no sul da Argentina para
se conseguir encontrar neve. Foi um belo discurso que viralizou na internet.
O prêmio de melhor
filme foi para o já citado “Spotlight” e, nos agradecimentos, foi lançado um
apelo ao Papa Francisco para combater os casos de abuso sexual na Igreja, que
tanto provocaram polêmica na película.
Pois é, essa foi a
cerimônia de premiação desse ano, o Oscar da “Diversidade”, cercado por uma
monstruosa questão racial que deixou novas marcas. Esperemos que no ano que
vem, a coisa não descambe para esse lado e a Academia de Artes e Ciências
Cinematográficas tenha mais equilíbrio nas indicações. E não deixe de ver o vídeo completo a festa depois das fotos.
Chris Rock mais parecia um garçom. Provocação?
Atores e atores coadjuvantes. Premiação merecida
"O Regresso" levou três estatuetas
Bela homenagem a Enio Morricone
"Spotlight" levou o Oscar de melhor filme
No final, todo mundo comeu biscoitinhos
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