O
Sétimo Selo. Questionamentos Sobre Vida, Morte E Fé.
O Instituto Moreira
Salles reapresentou essa semana “O Sétimo Selo” (realizado em 1957), um clássico do consagrado
diretor Ingmar Bergman. Como fazia muito tempo que eu vi esse filme, dei uma
chegadinha lá para dar uma conferida. E não me arrependi. Depois de ter lido a autobiografia
do grande diretor no início do ano passado, rever “O Sétimo Selo” é uma experiência
que tem muito mais sentido. Só para mencionar algumas coisas ditas por Bergman
em sua autobiografia, seu pai era uma espécie de líder religioso, um pastor de
sua comunidade, e Bergman tinha uma turbulenta relação com ele e, por tabela,
com sua mãe. “O Sétimo Selo” é um bom espelho desse conflito provocado pela fé.
Temos aqui a história
de Antonius Block (interpretado pelo ainda jovem e sempre lendário Max von Sydow), um cavaleiro medieval
que retorna das cruzadas para seu país natal, juntamente com seu escudeiro Jöns
(interpretado por Gunnar Björnstrand). No intervalo de sua viagem, Block se vê
face a face com a morte (interpretada magistralmente por Bengt Ekerot), que vem
buscar o cavaleiro. Block, exímio jogador de xadrez, desafia então a morte para
uma partidinha para poder ganhar mais tempo. Nesse ínterim, Block e Jöns
continuam sua viagem e fazem todo o tipo de questionamento sobre a vida, a
morte e, principalmente, a fé em Deus. Ao fim, a morte vem inevitável e leva
ambos juntamente com vários personagens que surgem ao longo da película, e o
fim da existência terrena é visto mais como um alívio para as várias questões existenciais
sobre a fé do que qualquer outra coisa. Prova disso é que a morte conduz suas
vítimas para o outro mundo enquanto elas dançam alegremente.
O filme tem um tom de
questionamento e, acima de tudo, de crítica a fé religiosa. A figura mais ácida
é a do escudeiro Jöns, personagem forte e, acima de tudo, muito sarcástico,
sendo o mais divertido de todos, justamente por ter uma visão excessivamente
crítica das coisas e fazer comentários altamente irônicos e ferinos. Sydow e
seu Antonius Block também tem um especial destaque, em sua confiança e petulância
em desafiar a morte, mas ao mesmo tempo por ser o personagem que mais questiona
os atos de fé em Deus. Ele é religioso e busca a salvação, mas ao mesmo tempo
se angustia com o profundo silêncio de Deus em seus momentos de maior
desespero. Já Ekerot é perfeito como a morte, de olhar penetrante e humor fino,
também cheio de sarcasmo, e a propriedade daquele que nada lhe escapa. Devemos nos
lembrar que a morte era mais aterrorizante que o usual nessa película, pois a
Europa passava pelo terrível período das epidemias da “Peste Negra” naqueles
dias de fim da Idade Média, constituindo-se em mais um elemento de
questionamento da fé perante o mutismo divino frente a tal situação de
desespero coletivo. Era muito curioso notar que havia pequenos momentos de
alegria restritos a uma pequena companhia mambembe de teatro, onde podíamos ver
uma jovem e deslumbrante Bibi Anderson atuando, mas uma de suas apresentações é
severamente interrompida por uma procissão religiosa pedindo o fim da praga e
exaltando o sofrimento de Cristo e autoflagelações, com um sacerdote condenando
severamente a alegria da trupe. Essa é a maior prova da crítica veemente de
Bergman à religiosidade excessiva e sem sentido. Por isso mesmo, a morte é
vista como libertadora das angústias existenciais provocadas pela religião.
Assim, “O Sétimo Selo”
é um clássico do Cinema Universal (e de Ingmar Bergman) que merece sempre ser
revisto, seja pela lindíssima fotografia em preto e branco, seja pela excelente
atuação dos atores, seja pelo clima de questionamento e reflexão crítica de temas
de grande importância para muitos como a religião. Vale a pena sempre dar uma
conferida nos ícones da História do Cinema Mundial como esse filme.
Cartaz do filme
Um cavaleiro que sofrerá um grande desafio...
Uma memorável partida de xadrez.
Se confessando para a morte sem saber
Uma jovial Bibi Anderson ao fundo, Alegria da trupe condenada pela austeridade da religião.
Procissão que exalta o sofrimento
A morte como libertação para as questões existenciais
Bergman, o cara!!!
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