Vic
e Flo Viram Um Urso. Crueza Revoltante.
Um filme canadense que
é uma pancada violenta no estômago. Essa é a melhor definição de “Vic e Flor
Viram Um Urso”, que ganhou o Urso de Prata no Festival de Berlim de 2013
(Prêmio Alfred Bauer), escrito e dirigido por Denis Côté. Se você quer ver
carinhas de porcelana e finais felizes, passe longe desse filme. Ele é de uma
crueza que beira as raias da revolta, que nos deixa inconformados com violentas
injustiças.
Temos aqui a história
de Victoria Champagne (interpretada por Pierrette Robitaille), uma mulher de
passado criminoso que está em liberdade condicional e vive numa casa isolada
num bosque com o tio Émile, preso a uma cadeira de rodas e que não mais fala.
Victoria terá que cuidar sozinha do tio. Mas ela é constantemente monitorada
pelo agente da condicional Guillaume (interpretado por Marc-André Grondin). A
namorada de Victoria, Florence Richmont (interpretada por Romane Bohringer),
outra ex-presidiária, aparece e as duas passam a viver isoladas na casa. Flo
prefere a vida na cidade, não se conformando com a vida somente com Vic, dando
suas puladinhas de cerca com homens. Vic será acusada de não cuidar direito do
tio, perdendo a custódia dele, que será encaminhado para um asilo e morrerá
pouco tempo depois. Vic só será comunicada após dez dias, quando o tio já terá
sido enterrado. O passado de crimes das duas faz com que algumas pessoas da cidade
as vejam com muito preconceito. Mas o pior ainda estava por vir. Flo tinha
dívidas com antigos criminosos e as duas serão perseguidas pela perigosa e
violenta Jackie (interpretada por Marie Brassard), responsável pelos momentos
mais odiosos do filme.
O que chama a atenção
aqui? Em primeiro lugar, o filme não prima por carinhas bonitas. Vic e Flo são
duas mulheres de meia idade, beirando a velhice, sendo feias e mal cuidadas. O
tio Émile tem uma longa cabeleira branca, uma vasta barba e um olar melancólico,
em virtude da sua prisão forçada por suas limitações físicas. Jackie é parruda,
masculinizada e muito violenta, como a própria personagem admite. É um filme de
pessoas rústicas, feias e mal tratadas. Em segundo lugar, o preconceito contra
as ex-presidiárias, por parte dos habitantes da cidade, que tiram o velho tio
Émile delas, provocando sua morte, num sinal de que o próprio tio queria
permanecer na casa com Vic e seu afastamento para a clínica o levou à morte. E
a característica mais marcante: uma violência gratuita que incomoda e deixa o
espectador indignado e mortificado. O desfecho do filme não deixa ninguém
indiferente. Você sai do cinema com um misto de resignação e revolta. A
primeira impressão que fica é a de que o filme é ruim, pois toda a violência explícita
nele é totalmente sem sentido. Mas, à medida que a sua cuca esfria, você
percebe que está diante de uma grande obra, pois ela te agride ostensivamente,
com o objetivo de te despertar de um sentimento de letargia e aceitação da
violência cotidiana. Muitas situações violentas e injustas como a expressa no
filme acontecem por aí todos os dias, mas estamos já tão acostumados com
sociedades violentas que tais situações praticamente nos passam despercebidas.
“Vic e Flo Viram Um Urso” nos dá um forte tapa na cara para despertarmos de
nossa alienação e lembramos de que tais coisas abomináveis são realidades
gritantes, tornando-se, assim, um filme agressivo, mas fundamental. Devemos
atentar também que o título em português funciona como um inteligente trocadilho sobre o
desfecho do filme. Não deixem de assistir e refletir.
Cartaz do filme.
Um casal violentado
pelo preconceito.
Guillaume. Vigilância
cerrada.
Tio Émile (ao fundo).
Suplício da paralisia.
Jackie (de pé) espreita
a sua vítima Flo.
Capanga de Jsckie.
Música nas horas vagas, violência extrema nos momentos de trabalho.
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