Dr.
Fantástico Ou Como Eu Aprendi a Parar de Me Preocupar e Amar a Bomba.
Ufa! Esse quilométrico
título esconde um dos filmes mais deliciosos de Kubrick. Em plena década de
1960, depois das mazelas macarthistas e da crise dos mísseis, temos talvez uma
das maiores comédias sobre a guerra fria e um retrato fiel da insanidade de
toda uma época. Insanidade que poderia ter nos custado muito caro, como o
próprio filme apresenta.
A história começa com
uma denúncia de que a União Soviética teria construído em segredo uma arma que
poderia destruir todo o mundo de uma vez só, uma espécie de “máquina do juízo
final”. Ainda, mostra também toda uma esquadrilha de bombardeios B-52 que ficam
constantemente no ar com as bombas nucleares, sendo acionados em caso de um
ataque contra os russos. Pois é. Um brigadeiro totalmente enlouquecido (Jack
Ripper, interpretado por Sterling Hayden) e preocupado com uma conspiração
comunista para contaminar os fluidos corporais americanos com flúor (é de
viajar na maionese mesmo!), ordena o ataque dos B-52 contra a União Soviética.
Espera aí, não seria somente o presidente dos Estados Unidos a dar essa ordem?
Sim, mas uma falha na segurança acabou abrindo essa brecha para o brigadeiro.
Além disso, os B-52 tiveram suas comunicações cortadas e só a senha do
brigadeiro poderia impedir o ataque. Mas ele cortou as comunicações de seu
quartel e o isolou. Assim, soldados americanos teriam que invadir o quartel
protegido por soldados americanos, num tiroteio total de fogo amigo, sob a
placa de “Paz é a nossa profissão”. Genial! O filme tem passagens muito
hilárias, como a reunião de cúpula no Pentágono entre o presidente e os
militares, todos tomados de um anticomunismo doentio, à exceção do presidente.
Aqui, devemos dar um especial destaque para George C. Scott, o general Buck
Turgidson, que precisa explicar ao presidente todo o imbróglio e dá as
sugestões as mais grotescas possíveis para solucionar a crise, bem ao espírito
de “Doutrina de Segurança Nacional”, forjada pelos militares americanos para
combater os comunistas, e que tanto mal nos fez durante a nossa ditadura
militar. Agora, quem realmente deu um show e talvez tenha sido uma das maiores
atuações de sua carreira foi Peter Sellers. Ele não interpretou apenas um
papel, mas sim TRÊS de uma vez só. Ele interpretou o capitão inglês Lionel
Mandrake (tinha um bigodinho sim, como o mágico), um militar altamente
centrado, que era o auxiliar do tresloucado brigadeiro Ripper, e que irá
descobrir o código para deter o avanço dos B-52; o presidente Merkin Muffley,
outro personagem centrado (na fauna do establishment
americano, ele é o único personagem de visão coerente, numa mostra de como
a figura do presidente da república ainda era respeitada, apesar de todos os
deslizes dos governos e dos militares; deve-se mencionar que os diálogos com o
premiê soviético ao telefone foram muito engraçados); e o misterioso Dr.
Strangelove, um cientista alemão capturado na Segunda Guerra Mundial que fazia
cálculos frios sobre as situações mais inusitadas, como, por exemplo, quais
seriam os “espécimes” mais adequados de humanos para se colocar em abrigos
nucleares. Esse doutor tinha a parte direita do corpo meio que paralisada, meio
que fora de controle e, de vez em quando fazia espasmos de saudação nazista,
com direito a “Heil!” e tudo, numa crítica para lá de engraçada (e muito
contundente) ao militarismo do governo americano. Quando vocês virem o filme,
notem que o embaixador russo (interpretado por Peter Bull) não consegue segurar
o riso atrás de Sellers. Três personagens diferentes, interpretados por um
mesmo ator talentosíssimo que não foi somente o Inspetor Clouseau.
Apesar de o ataque ser
detido (inclusive com a ameaça de retaliação da máquina do Juízo Final
soviética), um B-52 continua sua missão e atinge o alvo com uma bomba nuclear,
detonando a 3ª Guerra Mundial e uma sequência de explosões atômicas que
encerram o filme, coroando toda a insanidade de uma guerra fria que nada tinha
de lógica. Com “Dr. Fantástico”, Kubrick realizou o milagre de fazer as pessoas
rirem de uma situação que tanto as amedrontava: o fim do mundo através de uma
guerra nuclear. Pelo menos, hoje podemos rir aliviados (ou não????).
Cartaz do Filme
O enlouquecido Brigadeiro
Ripper
George C. Scott (general Buck Turgidson): atuação
memorável.
Peter Sellers, como
capitão Mandrake: fazendo mágica para evitar a 3ª Guerra.
Peter Sellers, como Dr.
Strangelove: nazismo inserido no militarismo americano.
Tiroteio de fogos
amigos: a Paz é nossa Profissão!!!!
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