O
Menino e o Mundo: Imagens sem Palavras.
A animação brasileira
“O Menino e o Mundo” é uma grata surpresa de nosso cinema. Uma ressurreição do
cinema mudo, que trata de temas altamente complexos, numa linguagem fácil e
acessível para o público infantil. Tudo isso com um acompanhamento musical de profissionais
como Naná Vasconcelos e Emicida.
O filme conta a
história de um garotinho de interior que vê o seu pai abandonando a família
para tentar a sorte na cidade grande. Inconformado com a partida do pai, o
menino viaja atrás dele e ganha o mundo, encarando de frente todas as
injustiças contidas nele. Assim, ele encontra uma lavoura de algodão e a
exploração do trabalhador no campo, onde empregados já doentes são simplesmente
descartados pelo capataz da fazenda. Panfletos que prometem um mundo melhor
para os trabalhadores em fábricas de tecidos na cidade, para onde o algodão
cultivado no campo vai, levam nosso herói ao meio urbano, onde ele conhece a
realidade das favelas, da propaganda consumista, do violento aparelho de
repressão do estado (representado na batalha entre o pássaro negro, símbolo do
governo, e o pássaro colorido, manifestação da cultura e alegria populares) e a
manipulação de informações por parte da mídia televisiva. Ainda, a tecnologia e
a mecanização que aumenta os lucros do grande patrão, mas aumenta o desemprego
e a miséria. Muito curioso é perceber para onde o tecido vai, saindo em
contêineres do porto e sendo “abduzidos” por discos voadores com cidades
paradisíacas à la “Elysium”, numa alusão metafórica aos países desenvolvidos, que
transformam o tecido em roupas requintadas, que retornam ao país dentro das
vitrines das lojas, sendo uma referência clara ao subdesenvolvimento e à
dependência econômica com relação aos países desenvolvidos. Outro detalhe digno
de nota ocorre quando o menino chega à estação de trem e vê seu pai. Mas aí ele
percebe que todas as pessoas que saem do trem são iguais ao seu pai, numa clara
idealização de que todos os retirantes são iguais, empurrados ao meio urbano
por todas as mazelas. Ainda, o filme também associa com maestria a depredação
do meio ambiente à exploração capitalista. Todos esses temas são apresentados,
como foi dito acima, sem um diálogo sequer. Os diálogos que aparecem no filme
eram apenas sons incompreensíveis, que lembravam as falas da professora do
Charlie Brown nos desenhos do Snoopy. Toda a linguagem, toda a expressão das
ideias do filme estão única e exclusivamente na materialidade das imagens, numa
animação ao mesmo tempo sofisticadíssima e muito singela e delicada. Tudo isso
produto do nosso Cinema Brasileiro, esse com B maiúsculo. Vale muito a pena dar
uma conferida nesse desenho. É de emocionar. Ah, esqueci de mencionar outro
fato. O garoto, ao longo de sua viagem, encontra dois personagens: o
trabalhador do campo, velho e doente e o trabalhador da cidade que vive na
favela e precisa viver do lixão quando fica desempregado. Vemos ao fim do filme
que esses personagens nada mais são do que o próprio garoto, que também terá
que abandonar sua casa para tentar a vida na cidade. Assim, ao sair em busca de
seu pai, o menino se encontra a si mesmo nas várias situações que o mundo
capitalista injusto irá lhe impor. Não é nada, não é nada, mas tenho a
impressão de que estamos presenciando o surgimento de uma obra prima do nosso
cinema, que poderá ser muito celebrada no futuro. Por isso, não percam a chance
de ver e ter esse filme!!!
Cartaz do Filme:
animação brasileira sofisticadíssima, singela e delicada.
No lixão: vilania do
meio urbano (note as favelas como gigantescas torres).
Melancolia no barraco
depois de um dia exaustivo de trabalho.
A cidade grande
O campo multicolorido.
A despedida do pai: a
faces dos personagens dizem tudo direto ao nosso coração.
Dito e certo. Filme agora é aclamado ao Oscar 2016 como melhor animação!
ResponderExcluirMelhor resenha!! <3
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