Ela:
Sexo e Relacionamento Virtuais Levados Às Últimas Consequências.
O filme “Ela” é
altamente inquietante. É uma ficção científica que pode estar indicando um
caminho que o futuro tomará. E, se esse caminho for tomado, poderemos ter altos
estragos na psique humana. A História (isso mesmo, com H maiúsculo) é muito
instigante e inquietante. Não é à toa que esse filme concorre a cinco Oscars.
Mas, mais importante que isso, ele é um convite à reflexão no futuro (e no
presente) das relações humanas. E abre o espaço para um debate altamente
pertinente.
O filme conta a
História, num futuro não muito distante, de Theodore (interpretado por um
magnífico Joaquin Phoenix), que tem uma profissão muito peculiar: ele escreve
cartas altamente pessoais para clientes que não conseguem expressar
espontaneamente suas emoções para seus entes queridos. Ele é um profissional
muito talentoso nesse ramo, escrevendo lindas cartas. Mas sua vida pessoal vai
de mal a pior. Ele vive separado de sua esposa há um ano e protela indefinidamente
a assinatura dos papéis do divórcio. Todas as tentativas para obter um
relacionamento na internet são em vão. Até que ele compra um sistema
operacional que tem uma característica muito peculiar: ele tem consciência e
aprende com a própria experiência. E é assim que ele conhece Samantha
(interpretada por Scarlett Johansson, ou melhor, só a sua voz). O
relacionamento entre os dois vai ficando cada vez mais estreito e profundo, até
que eles iniciam um relacionamento virtual, com direito a sexo e tudo! E tudo
se torna um mar de flores para Theodore e Samantha. Mas, mesmo nessa relação
aparentemente perfeita surgem problemas. Samantha não aguenta a ausência de um
corpo físico e simula um ato sexual entre Theodore e uma mulher que ela
conheceu na internet e que ficou tocada por esse curioso romance. Nem precisa
dizer que a experiência foi um desastre, pois Samantha “usava” o corpo da
mulher como se fosse o dela, mas o distanciamento de Theodore em virtude da
situação muito peculiar acabou magoando a todos. Outro elemento complicador foi
no dia em que os papéis do divórcio foram finalmente assinados por Theodore na
presença da esposa. Ela ficou revoltadíssima com a atitude de Theodore de se
relacionar com um sistema operacional e não com uma mulher de verdade. E isso a
fez lembrar das dificuldades de relacionamento com Theodore, que assumia uma
postura escapista nos relacionamentos, provocando muita mágoa.
Outros lances dolorosos
num relacionamento aparecerão na vida de Theodore e Samantha. Mas o que mais chama
a atenção no filme é a exibição de um problema altamente contemporâneo e que
pode assumir projeções assustadoras para o futuro. A questão posta é: qual é (e
qual será) a natureza das relações humanas? O filme toca numa ferida profunda:
a de como nós ficamos frágeis quando vamos nos relacionar com outras pessoas. Theodore
é o exemplo clássico disso. Ironicamente, ele é altamente competente para
escrever cartas afetuosas e pessoais para outras pessoas, escolhendo as
palavras exatas. Mas, na hora de utilizá-las numa situação real para construir
um relacionamento para ele mesmo, falha fragorosamente, por ser dotado de uma
insegurança profunda. Foi assim quando ele foi a um encontro que ele marcou na
internet, sendo inclusive rotulado de repulsivo, foi assim nas crises com
Samantha. Sua insegurança ficou muito marcada ao, depois de mais um fracasso no
campo pessoal, ele ficar sentado na frente de um enorme telão onde aparecia uma
enorme coruja indo em sua direção, abrindo suas garras em direção a seus
ombros. Mas a insegurança e fragilidade humanas não recaem apenas sobre
Theodore. Sua amiga Amy (interpretada por Amy Adams) também termina seu
casamento e inicia um relacionamento amigável com um sistema operacional. E
Theodore fica sabendo por intermédio de Amy que várias pessoas estão usando
sistemas operacionais para se relacionarem, havendo inclusive casos de traição.
Assim, a insegurança humana perante o relacionamento com o outro é um tema
recorrente no filme. Mas a coisa não para por aí. Outra questão que surge na
trama: como a tecnologia afeta essa insegurança e interfere na natureza dos
relacionamentos humanos? O filme faz uma clara alusão a uma situação para lá de
contemporânea: um monte de pessoas, na rua, o tempo todo, com a cara metida em
smartphones e redes sociais, sem olhar para quem está ao seu lado. Vemos o
tempo todo no filme, as pessoas conversando com seus sistemas operacionais,
ignorando completamente os outros transeuntes. Isso já faz parte de nossa
realidade. Mas o filme vai além. E se os sistemas operacionais desenvolverem
consciência? Como eles afetarão ainda mais a sensibilidade e fragilidade
humanas? O fato de uma máquina atingir tal estágio de consciência ainda é uma
ficção muito impossível, mas que o uso dessas tecnologias já altera nosso
comportamento e pode afetar nossa psique de uma forma mais profunda, isso sim
já pode ser considerado algo bem próximo de nós. Ou então essa tecnologia crie
suportes para potencializar problemas e fraquezas emocionais já existentes há
milênios. De qualquer forma, o filme é pertinente justamente por discutir como
o homem será afetado por uma tecnologia que ele mesmo cria. Aliás, para quem
tem blog ou site por aí, só uma pergunta: você ficará deprimido se sua postagem
tiver poucas visualizações????
Cartaz do Filme
Um melancólico Theodore
Feliz com Samantha no
bolso de seu casaco
Scarlett Johansson só
nos brinda com sua voz.
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