Medo
e Desejo: Mais um Filme de Guerra de Kubrick.
O filme “Medo e
Desejo”, de Stanley Kubrick, feito em 1953, é bem curtinho: tem somente 62
minutos. Mas ele possui alguns elementos interessantes para se discutir. Basicamente,
ele chama a atenção por dois fatores principais. Falemos destes elementos aqui.
Vemos nesta película a
história de quatro militares que estão numa floresta em território inimigo após
seu avião ser abatido. A intenção deles é atravessar as linhas inimigas e
retornar para seu exército. Para isso, eles usarão o rio que corta a floresta e
construirão uma balsa. Mas isso não será tão simples, já que há milhares de
soldados inimigos cobrem os oito quilômetros de terreno que eles terão que
atravessar. Ao montarem a balsa na beira do rio, esses militares descobrem na
outra margem que o exército inimigo tem um avião e um aeroporto, perfeitos para
um plano de fuga. Mas há um general inimigo também, o que desperta muito a
curiosidade deles. Haverá mais um elemento complicador: os militares, com muita
fome, invadem uma instalação inimiga e trucidam os soldados que lá estavam,
causando muita perturbação num dos soldados. Para piorar, num outro momento uma
camponesa local vê os militares que precisam aprisioná-la, amarrada a uma
árvore. Ela fica sob a vigilância do soldado que ficou traumatizado com a
carnificina na disputa pela comida, enquanto que os outros militares se afastam
para vigiar a balsa e as instalações inimigas à distância. Mas o soldado
enlouquece e acaba soltando a camponesa, pois ele pensa que ela gosta dele. Só
que a moça apenas dissimula para que o soldado a solte e ela possa fugir. O
soldado acaba matando-a e corre enlouquecido pela floresta. Outro militar
fugitivo, obcecado pela presença do general, sugere aos dois colegas que se
elimine o líder do exército inimigo antes da fuga. Para isso, ele atrairia os
militares inimigos expondo-se na balsa enquanto que seus colegas matavam o
general, para depois todos fugirem de avião. Bom, o plano não deu muito certo,
pois o valente militar da balsa ficou crivado de balas e o general foi
inicialmente só ferido, e nossos fugitivos ainda precisaram voltar para
executá-lo. Os dois sobreviventes conseguiram chegar a seu território, mas
retornaram ao rio para procurar a balsa. Miraculosamente, a encontraram com o
soldado isca morto e o soldado maluquinho do lado. Toda essa história contada
em uma hora.
E quais são os dois
elementos do filme que chamam muito a atenção? Em primeiro lugar, a montagem. É
muito curioso perceber como a montagem foi feita com closes de rostos bem
rápidos, aumentando a dramaticidade da cena, seja na conversa entre os soldados
fugitivos, na cena do massacre dos soldados inimigos, muito bem feita, seja no
assassinato da camponesa. A cena do massacre é especialmente inquietante, pois
a forma como a cena foi montada, intercalando a expressão horrorizada do
soldado que enlouqueceria com as faces dos soldados inimigos mortos, nos dá uma
sensação de aflição e desespero. Logo, o exercício da montagem é a
característica mais marcante do filme no ponto de vista técnico. O segundo
elemento que chama muito a atenção é a explanação de alguns raciocínios e
ideias ao longo do filme. Voltando à cena do massacre, enquanto um dos soldados
está aterrorizado, outro, totalmente indiferente à chacina diz, em seus
pensamentos, que os homens são ilhas, ou seja, ele se desvincula totalmente da
solidariedade humana para que ele possa, durante uma guerra, adotar uma postura
mais indiferente e poder sobreviver no campo de batalha. Outro momento
interessante está nas palavras do soldado que quer matar o general. Ao invés de
buscar a solução mais simples, que é fugir, ele quer fazer algo grandioso, pois
ao fim da guerra, ele terá um emprego ordinário que será consertar máquinas de
lavar e não fará mais nada de relevante em sua vida. Assim, ter a chance de
matar um general naquelas circunstâncias tem o status de dádiva divina (como se a guerra fosse a única
oportunidade de se fazer algo de relevante para que a sociedade o notasse). Nestes
dois raciocínios, vemos novamente o posicionamento altamente crítico de Kubrick
contra a guerra, assim como ele também é crítico do patriotismo. Em nenhum
momento se fala no filme quais são as nacionalidades dos exércitos envolvidos
e, ainda, no início da trama, a voz do narrador nos diz que as noções de guerra
e patriotismo estão apenas na cabeça dos soldados. O ambiente da floresta é
totalmente destacado do que acontece na guerra, sendo esses eventos totalmente
de responsabilidade dos militares envolvidos (já que chega-se a insinuar ao
longo da história que a floresta possui uma influência maldita sobre as
pessoas). Todos esses elementos em apenas 62 minutos de filme, que só confirmam
a genialidade desse diretor.
Cartaz do Filme.
Os quatro soldados
fugitivos.
Closes rápidos:
montagem aumenta dramaticidade
Provocação da camponesa
A equipe de filmagem. E
não é que Kubrick também ri???
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