Boa
Sorte. Amor, Doente Amor.
Uma curiosidade de
nosso cinema. O filme “Boa Sorte” aborda o mundo dos dependentes químicos e
viciados. E é um love story entre
internos de uma clínica. Pessoas que buscam a reabilitação. Ou não, pois já
estão num beco sem saída. O filme tem um bom pistolão. A filha do Jabor
(Carolina) na direção, e um roteiro de Jorge Furtado além de um elenco estelar,
capitaneado por Fernanda Montenegro e seguida por Cassia Kis Magro, Deborah
Secco, Enrique Diaz e Felipe Camargo. O filme também já ganhou alguns prêmios,
como melhor filme e direção de arte no festival de Paulínia e melhor atriz para
Deborah Secco no Prêmio da Associação dos Críticos de Arte de São Paulo.
Vemos aqui a história
de João (interpretado por João Pedro Zappa), um adolescente que vive em uma
família muito louca, com hábitos meio largadões e viciada em alguns comprimidos.
O menino seguirá pelo mesmo caminho e vai, aos poucos, se tornando agressivo, o
que provocará a internação dele numa clínica. Lá, ele conhece Judite
(interpretada por Deborah Secco), uma viciada em vários remédios e drogas,
soropositiva, e que não consegue tomar mais o coquetel contra a AIDS, pois seu
fígado debilitado não aguenta a medicação. Judite apenas espera a morte. Vai
começar uma relação entre João e Judite que passa da amizade ao amor. E ao
contato sexual, onde João terá que arrumar uma camisinha com o enfermeiro do
hospital, Marcos (interpretado por Enrique Diaz), o mesmo que arranja drogas e
remédios para Judite em troca de favores sexuais. João está apaixonadíssimo por
Judite e essa ficará muito preocupada com tal situação, pois não quer ver o
rapaz vivendo permanentemente na clínica por causa dela e não levar sua vida
adiante (apesar de estar próximo a receber alta, João sempre fazia alguma coisa
de errado para aumentar seu tempo de permanência por lá, só para ficar perto de
Judite). Para fazer João ir embora, Judite terá que magoá-lo.
Qual é o grande mérito
da história? Não é o love story em
si, mas sim as conversas entre Judite e João, principalmente a teoria
desenvolvida por João de que, ao tomar os remédios, ele fica invisível. Isso é
uma metáfora muito bem bolada para a indiferença da sociedade com relação aos
dependentes químicos e, por que não, pensando de uma forma mais ampla, a todo
mundo? Os pais de João não davam a mínima trela para ele, ao ponto de a mãe
desligar a TV na cara de nosso protagonista, como se ele nem estivesse na sala.
A indiferença das pessoas com relação ao próximo, qualquer que seja ele, mas
principalmente aos excluídos, é também notória. A história brinca com isso, a
ponto de a indiferença só desaparecer quando há alguma espécie de contato
físico como uma passada de mão na bunda de uma garota ou uma lambida, onde,
claro, nosso João entrava na porrada. Essa invisibilidade e comportamento de
João testando os limites do invisível é que fizeram os pais a achar que ele
estava agressivo e o levar à clínica, já que ele agrediu uma mãe que batia em
sua filha pequena. Mas há outros momentos divertidos. João e Judite aproveitam
a sua invisibilidade para fugir da clínica e ir à praia, onde vão tomar banho
de mar nus, sem que ninguém perceba. Constatamos como essa invisibilidade é
forte, já que ninguém notou a Deborah Secco pelada em plena praia. Essa teoria
da invisibilidade, portanto, é uma denúncia do comportamento altamente
individualista da sociedade, onde não olhamos mais para quem está ao nosso
lado, mas sim para a caixa de e-mails e “feicebúquis” de nossos smart phones.
Triste conclusão.
O filme também usa a
conversa entre os protagonistas para exprimir todo um lado lúdico,
principalmente no diário de Judite que, apesar de tudo, ainda é uma moça
romântica com seus sonhos e desejos. Os desenhos de Judite ganham vida em
animações geradas por computação gráfica sobre o que ela achava de João, dando
um tom colorido, singelo e delicado à história, embora o filme também não se
esqueça das cruezas da vida.
Dessa forma, “Boa
Sorte” é mais um filme de nosso país que enriquece a cinematografia. Boa
direção, elenco, história, reflexão, valendo a pena dar aquela conferida sempre
indicada aqui para esses casos.
Cartaz do filme
João e Judite. Um casal numa clínica de reabilitação.
Deborah Secco se preparou para interpretar uma soropositiva.
Festas com os maluquinhos da clínica.
Ambiente um tanto decadente...
Fernanda Montenegro. Excelente, como sempre...
Jorge Furtado
Carolina Jabor.
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