A
Viagem de Yoani. Discussões Sobre Autoritarismo E Democracia.
Um excelente
documentário nas telas. “A Viagem de Yoani”, dirigido por Raphael Bottino e
Peppe Siffredi fala sobre a viagem da blogueira cubana Yoani Sanchez ao Brasil
e do que aconteceu durante sua estada por nosso país, mais especificamente na
Bahia. Sanchez ficou mundialmente conhecida ao fazer o blog “Geração Y”, que
denuncia a falta de liberdade de expressão em Cuba. Com muito custo, Sanchez
montou um computador 286 e conseguiu acesso à internet. Seu blog hoje é visto
por muitas pessoas e se tornou uma das principais vozes de oposição ao governo
cubano. Com a projeção internacional, Sanchez começou a viajar ao exterior,
inicialmente a muito custo, pois os cubanos não tinham autorização para sair do
país. Entretanto, depois que Fidel saiu do poder por motivos de saúde, Raul
Castro começou um lento e gradual processo de abertura política, onde ele deu
permissão aos cubanos para viajar para o exterior. E assim, Sanchez fez uma
viagem ao Brasil, país onde ela encontrou muito apoio na sua luta por viajar
para outros países.
Entretanto, Sanchez não
só encontrou apoio por aqui. Vários grupos de esquerda a hostilizaram na sua
viagem à Bahia, comportando-se de forma muito autoritária. Foi extremamente
lamentável ver Eduardo Suplicy, que ciceroneou a blogueira cubana, ter que
bater boca contra uma massa que simplesmente não queria o debate e só gritava
palavras de ordem. O então senador lembrava que sempre lutou pelo socialismo
com democracia e que a própria Yoani Sanchez era contra o embargo econômico que
Cuba sofria.
Por outro lado, ficou
muito claro no filme que Sanchez foi muito bem recebida por setores
extremamente conservadores, autoritários, direitistas e golpistas da sociedade,
sobretudo quando da sua visita ao Congresso, quando vimos a blogueira ser muito
bem recebida pela bancada ruralista e por figuras que ainda defendem a ditadura militar no Brasil. A moça, que não tem muito conhecimento da
história de nosso país, optou pelo diálogo com todos os setores, da esquerda
até a direita. Aliás, ela declara que não toma qualquer posicionamento
político, buscando apenas exercer o direito de discordar das atitudes que o
governo de seu país toma.
É um filme que trabalha
as diferentes visões de democracia e autoritarismo em países como Cuba e
Brasil. Se o governo cubano num primeiro momento se tornou um baluarte contra o
imperialismo, ele também acabou por se fechar e não respeitar mais a liberdade de
expressão, sobretudo após os ataques americanos, seja no campo militar, como a
tentativa americana mal sucedida de invasão à Baía dos Porcos, seja no campo
econômico, como no embargo da Lei Helms-Burton. Essa atitude de se fechar
politicamente e endurecer suas posições quando sob ataque já fora vista durante
a Revolução Francesa no governo dos jacobinos e no governo bolchevique da
Revolução Russa. Yoani Sanchez critica as atitudes do governo cubano sob esse
aspecto, segundo suas próprias palavras. Os setores da esquerda brasileira que
a hostilizavam pareciam exagerar quando diziam que ela era uma “mercenária
vendida aos americanos”. De qualquer forma, é inegável que a mídia americana
aproveitou a situação para criticar novamente o governo cubano.
Yoani critica o governo
autoritário de Cuba, a esquerda brasileira se comporta de forma autoritária com
ela. Mas não podemos nos esquecer que o Brasil, apesar de se intitular uma
democracia, tem também atitudes muito autoritárias e antidemocráticas. E, se em
Cuba, Yoani critica uma ditadura de esquerda, aqui nós amargamos uma ditadura
de direita que deixou sequelas graves em nossa suposta democracia. Uma delas é
o comportamento autoritário em todos os setores. Ninguém aqui tem muito saco
para escutar a opinião divergente do outro, seja nos já citados grupos de
esquerda, seja na mídia de direita, que possui poder econômico suficiente para
manipular as informações ao seu bel prazer aos olhos complacentes do governo
que, para se dizer democrático, deixa tal mídia trabalhar livremente. Essas são
realidades que Yoani Sanchez não conhece do Brasil, assim como não conhecemos a
realidade de Cuba tal como Yoani conhece, como a limitação à informação.
De qualquer forma, tem
havido uma abertura em Cuba, sobretudo depois do reatamento das relações com os
Estados Unidos, algo que fez Yoani elogiar até os irmãos Castro. O grande
desafio de Cuba é, nas próprias palavras de Suplicy, promover um socialismo
democrático, ou seja, permitir a liberdade de expressão e política, além de manter
as conquistas sociais do socialismo. Já nós aqui no Brasil temos o desafio de
aprimorar nossa democracia, profundamente injusta, com sérios resquícios de
autoritarismo, escravismo e corrupção, onde as conquistas sociais do socialismo
passam muito longe. Yoani disse sabiamente que o diálogo é importante para
mostrar que Cuba não necessariamente é um paraíso nem o mundo capitalista é um
inferno. Pode-se complementar essa frase dizendo que o mesmo vale para o
contrário.
Concluindo, podemos
dizer que a blogueira cubana conhece um mundo onde suas visões de liberdade e
autoritarismo são diferentes das nossas. Para ela, a falta de liberdade foi
gerada por uma ditadura de esquerda. Por aqui, a falta de liberdade foi gerada
por anos e anos de elites direitistas no poder. Para que um possa compreender
melhor o outro, só com muito diálogo, sem visões planas e acabadas provocadas
por pensamentos autoritários sejam de quaisquer tendências políticas que eles
sejam.
Cartaz do filme
Yoani Sanchez, em viagem ao Brasil.
Uma agente dos Estados Unidos?
Um debate tenso.
Sangue frio nas vaias...
Suplicy e as tentativas de diálogo
Momentos extremamente tensos...
No Congresso Nacional, cercada por políticos de tendências... hummm, deixa para lá...