Chocolate.
Sempre O Racismo.
Omar Sy é um baita
ator, sempre presente no cinema francês com papéis de muito destaque. Todos se
lembram dele em “Os Intocáveis”, interpretando um cuidador de um milionário paraplégico,
conquistando os corações de todos aqueles que assistiram ao filme. “Samba” foi
também uma outra película de destaque, enfocando a questão dos imigrantes na
Europa. Mas o novo filme de Omar Sy supera em anos-luz as películas anteriores.
“Chocolate” consegue ser um excelente filme, com uma história comovente e,
acima de tudo, muito reflexiva, como somente o bom cinema precisa ser.
Vemos aqui a história
de George Footit (interpretado por James Thierreé, que é, nada mais, nada
menos, do que neto de Charles Chaplin), um palhaço que já teve muito sucesso no
passado e que agora precisa mendigar um emprego num cirquinho do interior da
França. Estamos em 1897 e Footit necessita desesperadamente desse emprego. Enquanto
ele cava uma vaga por lá, conhece Rafael Padilla, um cubano ex-escravo que
tentou a vida na França (interpretado por Omar Sy), se apresentando como um
selvagem exótico canibal africano. Footit convence Padilla a ser assistente nos
seus números e os dois conseguem um grande sucesso, chegando a um grande circo
de Paris. Mas a fama traria além de coisas boas, também muitas coisas ruins, já
que Padilla, agora com a alcunha de Chocolate, provocava um certo desconforto
na sociedade francesa extremamente racista da época. E nosso palhaço negro
sofria a situação ambígua de ser uma celebridade adorada e, ao mesmo tempo,
ocupar uma posição subalterna de cidadão de segunda categoria, em virtude da
cor de sua pele e de um racismo latente. Para se afirmar, Padilla vai querer
enveredar na carreira de ator de teatro e interpretar Otelo, na peça homônima de
Shakespeare. O mais irônico é que nunca um negro havia interpretado esse
personagem na França. Somente atores brancos pintados de negro tinham
interpretado esse papel.
É um filme para
refletir, e muito, principalmente quando pensamos na situação mundial atual,
com o avanço do terrorismo e um coro geral que diz que os que fazem esses
atentados são loucos fundamentalistas. Apesar de absolutamente nada justificar
a violência do terrorismo, a gente também não pode deixar passar a percepção de
que o avanço europeu imperialista do passado e, por que não, do presente, tem
uma parcela de culpa em todo esse contexto sinistro de hoje. Ao se perceber o
forte tom racista ao qual Chocolate é submetido, conseguimos notar como tal
aura de preconceito e sentimento de superioridade dos europeus perante outras
etnias provocaram enormes ressentimentos e, com certeza, funcionaram como combustível
para acirrar os ânimos de grupos fundamentalistas. É algo extremamente
alarmante pensar que tais preconceitos situados na virada do século XIX para o
XX sejam ainda tão presentes na Europa do século XXI.
Quanto aos atores, Omar
Sy estava simplesmente brilhante e me arrisco a dizer que talvez esse tenha sido
o melhor papel de toda a sua carreira, tanto pregressa quanto futura. A forma
como ele transitava do cômico para o dramático foi muito eficiente. James
Thierreé também não ficou atrás. Sua semelhança com o avô, onde o penteado de
seu palhaço ajudou muito (a impressão é que a gente via alguma coisa de “Luzes
da Ribalta”), nos deu a exata noção de como o circo, a pantomima e a nascente
arte de interpretação do cinema mudo eram três coisas que se imbricavam e se
confundiam naquela época. Nesse ponto de vista, o filme é um prato cheio para
os amantes do Primeiro Cinema. Mas o filme foi além da excelente interpretação dos
atores, da exaltação a pantomima e da discussão social. Foi um filme também
muito humano, onde as relações entre os personagens principais e coadjuvantes
nos cativava e prendia a atenção de uma forma tão magnética que nem sentimos a duração
da película passar por nossos olhos.
Dessa forma, “Chocolate”
pode ser definido como uma verdadeira obra-prima, pois aborda com maestria uma questão
social que tem um conteúdo altamente contemporâneo, é, provavelmente, a melhor atuação
de Omar Sy até hoje e é um drama que enfoca com muita profundidade as relações humanas.
É daqueles filmes para se ver, ter e guardar. Imperdível! E não deixe de ver o
trailer após as fotos.
Cartaz do Filme
Footit e Chocolate. Dupla de sucesso
Primeiros ensaios
Negro sendo chutado pelo branco
Visitando as crianças no hospital
Interagindo com o público
Os verdadeiros Footit e Chocolate...
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