El Greco
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Doménikos Theotokópoulos
Δομήνικος Θεοτοκόπουλος | |
El Greco
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Nascimento
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Morte
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17 de abril de 1614 (73 anos)
Toledo |
Nacionalidade
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Ocupação
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A Disputa das Vestes de Jesus (El expolio); Abertura do Quinto Selo
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Movimento estético
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Doménikos Theotokópoulos (em grego: Δομήνικος Θεοτοκόπουλος), mais conhecido como El Greco, ("O Grego"[a][b]) (Fodele, Iráclio, 1541 — Toledo, 7 de abril de 1614) foi um pintor, escultor e arquiteto grego que desenvolveu a maior parte da sua carreira na Espanha. Assinava suas obras com o nome original, ressaltando sua origem.
Nasceu em Creta, que naquela época pertencia à República de Veneza, e era um centro artístico pós-bizantino. Treinou ali e tornou-se um mestre dentro dessa tradição artística, antes de viajar, aos vinte e seis anos, para Veneza, como já tinham feito outros artistas gregos.[1] Em 1570 mudou-se para Roma, onde abriu um ateliê e executou algumas séries de trabalhos. Durante sua permanência na Itália, enriqueceu seu estilo com elementos do maneirismo e da renascença veneziana. Mudou-se finalmente em 1577 para Toledo, na Espanha, onde viveu e trabalhou até sua morte. Ali, El Greco recebeu diversas encomendas e produziu suas melhores pinturas conhecidas.
O estilo dramático e expressivo de El Greco foi considerado estranho por seus contemporâneos, mas encontrou grande apreciação no século XX, sendo considerado um precursor do expressionismo e do cubismo, ao mesmo tempo em que sua personalidade e trabalhos eram fonte de inspiração a poetas e escritores como Rainer Maria Rilke e Nikos Kazantzakis. El Greco é considerado pelo modernos estudiosos como um artista tão individual que não o consideram como pertencente a nenhuma das escolas convencionais.[2] É mais conhecido por suas figuras tortuosamente alongadas e uso freqüente de pigmentação fantástica ou mesmo fantasmagórica, unindo tradições bizantinas com a pintura ocidental.[3]
Em sua época teve somente dois seguidores de seu estilo: o seu filho Jorge Manuel Theotokópoulos e Luis Tristán.
Biografia
Primeiros anos
Seu nascimento em 1541 deu-se na vila de Fodele ou de Candia (nome veneziano para Chandax), presentemente nomeada Heraklion, em Creta[c], era descendente de uma próspera família urbana, que provavelmente teria se deslocado de Chania para Candia depois de uma insurreição fracassada contra o domínio veneziano, entre 1526 e 1528.[4] Seu pai, Geórgios Theotokópoulos (morto em 1558), era comerciante e cobrador de impostos. Nada se sabe, porém, sobre sua mãe ou sobre sua primeira esposa, uma grega[5]. Seu irmão mais velho, Manoússos Theotokópoulos (1531 - 13 de dezembro de 1604), foi um comerciante, e passou seus últimos anos de vida na casa de El Greco, em Toledo[6].
El Greco recebeu seus treinamentos iniciais como pintor de ícones na Escola cretense, o principal centro de arte pós-bizantina. Além da pintura, estudou provavelmente os clássicos da Grécia Antiga, e talvez os clássicos latinos também; quando morreu deixou uma "biblioteca de trabalho" com cerca de 130 volumes, inclusive um exemplar da Bíblia em grego e um Vasari anotado.[1] Candia era então um centro das atividades artísticas onde as culturas ocidental e oriental conviviam harmoniosamente, e cerca de duzentos pintores eram ativos ali, durante o século XVI - inclusive tendo organizado uma guilda de pintores, ao molde corporativo italiano.[4] Em 1563, com a idade de 22 anos, El Greco foi descrito num documento como um "mestre" ("maestro Domenigo"), significando com isso, provavelmente, que já era um membro de guilda e presumivelmente trabalhava em seu próprio estúdio.[1] Três anos depois, em junho de 1566, como testemunha num contrato, ele assinou seu nome como "Mestre Menégos Theotokópoulos, pintor"(μαΐστρος Μένεγος Θεοτοκόπουλος σγουράφος)[d].
Itália
Pertencendo Creta à Sereníssima República de Veneza desde 1211, era natural que o jovem El Greco procurasse continuar sua carreira naquela cidade italiana.[2] Embora o ano exato dessa mudança não seja claro, a maioria dos estudiosos é acorde que o pintor trasladou-se por volta do ano de 1567[f]. As informações sobre os anos do mestre na Itália são limitados. Morou em Veneza até 1570 e, de acordo com uma carta escrita por seu mais antigo amigo, e maior miniaturista da época, o croata Giulio Clovio, ele seria um "discípulo" de Ticiano, que já estava octogenário mas ainda vigoroso. Isso pode significar que ele trabalhara no estúdio do grande Ticiano, ou não. Clovio caracterizou El Greco como "um grande talento para a pintura".[7]
O período veneziano
De sua carreira artística, anterior à sua chegada a Veneza, pouco se conhece. Contudo, recentemente foi identificado um dos seus trabalhos, na Igreja de Koimesis tis Theotokou, em Siro.
Em Veneza trabalhou no ateliê do famoso pintor Ticiano e, sem dúvida, conheceu a pintores como Tintoretto, Veronèse e Bassano, bem como a obra dos pintores maneiristas do centro da Itália, entre eles Domenichino, Parmigianino, etc. Entre suas mais conhecidas obras do período veneziano pode se encontrar A cura do cego, onde se percebe a total e solene influência de Ticiano. Quanto à composição de figuras e à utilização do espaço, a influência de Tintoretto é notável.
O período romano
Em 1570, El Greco mudou-se para Roma, quando executou algumas séries de trabalhos marcados por seu aprendizado veneziano.[7] Não se sabe com precisão quanto tempo durou sua estada ali, mas é certo que retornou a Veneza (c. 1575-76) antes de sua mudança para a Espanha.[8] Em Roma, El Greco hospedou-se no Palazzo Farnese, tornado pelo Cardeal Alessandro Farnese um centro pulsante de vida intelectual e artística da cidade. Ali ele travou contato com a elite pensante romana, incluindo-se o humanista Fulvio Orsini, que mais tarde veio a ter em sua coleção sete pinturas do artista ("Visão do Monte Sinai" e o Retrato de Clovio, entre elas).[9]
Diferente de outros artistas cretenses que foram para Veneza, El Greco alterou substancialmente seu estilo e procurou se distinguir pelas novas e incomuns interpretações dos temas religiosos tradicionais.[10] Sua pinturas italianas apresentam forte influência do Renascimento veneziano do período, com figuras ágeis, alongadas, lembrando a Tintoretto e um vigor cromático que o liga a Ticiano.[2] Dos pintores venezianos aprendeu ainda a composição, organizada em paisagens vibrantes e com luz atmosférica. Clovio informa que visitara o artista quando este ainda se encontrava em Roma. El Greco estava sentado, num quarto pouco iluminado, porque ele acreditava que as sombras conduziam melhor suas idéias que a luz do dia, que perturbavam-lhe a sua "luz interior".[11]
Como resultado de sua permanência em Roma seus trabalhos foram enriquecidos de elementos como a perspectiva violenta, onde pontos desaparecem ou as figuras surgem em atitudes estranhas, com posturas repetidas e torcidas em gestos tempestuosos - todos elementos do maneirismo.[7]
No tempo em que El Greco passou em Roma, tanto Michelangelo como Rafael já haviam morrido, mas seus exemplos continuavam como influência sobre os jovens pintores. O cretense, entretanto, estava determinado a imprimir sua própria marca e em defender sua própria visão artística, suas idéias e estilo pessoais.[12] Ele poupou Correggio e Parmigianino duma crítica particular,[13] mas não hesitou em desfazer-se de Michelangelo em seu Juízo Final, na Capela Sistina[g]. Chegou a oferecer-se ao Papa Pio V para pintar sobre o trabalho inteiro, consoante o novo e mais rígido pensamento católico.[14] Quando, mais tarde, lhe perguntaram o que achava de Michelangelo, El Greco respondeu que "ele foi um bom homem, mas um mau pintor"[15] - ficando-se assim diante de um paradoxo: El Greco reagira, condenando, à obra de Michelangelo, mas achava que era impossível resistir à sua influência[16]. A influência de Michelangelo, de fato, pode ser vista em seu trabalho posterior, "Alegoria da Liga Sagrada".[17] Ao retratar as figuras de Michelangelo, Ticiano, Clovio e, presumivelmente, Rafael, em um dos seus trabalhos ("A Purificação do Templo"), El Greco não apenas expressou sua gratidão mas avançou na pretensão de rivalizar com estes grandes mestres. Como indicam seus próprios comentários, o cretense via em Ticiano, Michelangelo e Rafael exemplos a serem seguidos.[14] Nas suas Crônicas, no século XVII, Giulio Mancini incluiu El Greco dentre os pintores que, de várias formas, haviam iniciado uma reavalição das lições de Michelangelo.[18]
Por causa de suas convicções artísticas pouco convencionais (como por exemplo a reprovação da técnica de Michelangelo) e de sua personalidade, El Greco logo adquiriu inimigos em Roma. O arquiteto e escritor Pirro Ligorio chamou-o de "estrangeiro tolo", e recentemente foi descoberto em arquivos um material que revela uma dissenção com Farnese, que obrigara o jovem artista a deixar seu palácio.[18] Em 6 de julho de 1572, El Greco se queixou oficialmente deste fato. Alguns meses depois, em 18 de setembro de 1572, pagou suas dívidas para com a Guilda de São Lucas em Roma, com uma miniatura que pintara.[19] No final daquele ano o pintor abriu seu próprio estúdio, e admitiu como seus assistentes os pintores Lattanzio Bonastri de Lucignano e Francisco Preboste.[18]
Entre as principais obras de seu período romano podem encontrar-se a Purificação no Templo e o Retrato de Giulio Clovio, tal como A Piedade. Nesta última obra se percebe claramente a influência de Michelangelo.
O período espanhol
Imigração para Toledo
Em 1577, El Greco emigrou primeiro para Madri, e dali foi para Toledo, onde produziu seus trabalhos da maturidade[20].Naquela época Toledo era a capital religiosa da Espanha, e uma populosa cidade[h]. Dela dizia-se ser um lugar com "um passado ilustre, um próspero presente e um futuro incerto".[21] Em Roma, El Greco havia conquistado o respeito de alguns intelectuais, mas também enfrentara a hostilidade de certos críticos de arte.[22] Durante a década de 1570 o enorme monastério-palácio de El Escorial ainda estava sendo construído e Filipe II de Espanha enfrentava dificuldades para encontrar bons artistas para executar as muitas pinturas que a obra exigia. Ticiano morrera, e Tintoretto, Veronese e Antônio Mouro recusaram-se todos em ir para a Espanha. Filipe tivera que confiar então no talento menor de Juan Fernándes de Navarrete, cuja gravedad e decoro (seriedade e decoro) foram aprovados pelo rei. Mas este pintor veio a morrer em 1579; o momento parecia ideal para El Greco.[23]
Graças à interseção de Clovio e de Orsini, El Greco conheceu Benito Arias Montano, um humanista espanhol e agente de Filipe; Pedro Chacón, um clérigo; e Luís de Castela, filho de Diego de Castela, deão da Catedral de Toledo.[24] Da amizade com este último El Greco obteve as primeiras encomendas para Toledo. Ali chegou, em julho de 1577, assinando contrato para um grupo de pinturas que se destinavam à ornamentação da Igreja de São Domingo o Velho e para o renomado El Expolio.[25] Em setembro de 1579 ele havia terminado nove pinturas para a São Domingo, dentre as quais A Trindade e A Ascensão da Virgem. Estes trabalhos firmaram a reputação do artista em Toledo.[19]
O pintor não tinha planos de se instalar definitivamente em Toledo, uma vez que seu principal objetivo era atrair as graças de Filipe e conquistar lugar em sua corte.[26] De fato, ele obteve duas importantes encomendas do monarca: a Alegoria da Santa Liga e o Martírio de São Maurício. Mas o rei não gostou destes trabalhos e colocou o retábulo de S. Maurício na sala capitular ao invés de na capela para a qual fora pintada. Ele não fez nenhuma encomenda adicional ao pintor.[27] As razões exatas para o descontentamento real permanecem obscuras. Alguns estudiosos sugerem que Filipe não gostara da inclusão de pessoas vivas nas cenas religiosas retratadas;[27] alguns outros sugerem que El Greco violara uma regra básica da Contra-Reforma, que era a supremacia do conteúdo sobre o estilo[28]. Filipe tinha um interesse especial por sua encomendas, e um gosto muito decidido; uma almejada escultura da Crucifixão por Benvenuto Cellini também desagradara-o, quando chegou, e foi igualmente exilada em local menos evidente. O que acontecera a Federico Zuccari foi ainda pior.[29] Em todo caso, o descontentamento de Filipe terminou com qualquer esperança do patronato real para El Greco.[19]
Maturidade e últimos anos
Sem os favores do rei, El Greco foi obrigado a permanecer em Toledo, onde fora recebido em 1577 como um grande pintor.[30] De acordo com Hortensio Félix Paravicino, um pregador e poeta espanhol do século XVII, "Creta lhe dera a vida e o talento, Toledo foi a melhor pátria, onde a morte lhe permitiu alcançar a vida eterna".[31] Em 1585 ele parece haver contratado um assistente, o pintor italiano Francisco Preboste, e estabeleceu um estúdio próprio capaz de produzir quadros para altares e estátuas, além das pinturas[32]. Em 12 de março de 1586 obteve a encomenda para O Enterro do Conde de Orgaz, que hoje vem a ser sua obra-prima mais conhecida.[33] A década entre 1597 a 1607 foi o período de maior atividade para El Greco. Durante estes anos recebeu suas maiores encomendas, e seu estúdio criava conjuntos de figuras e esculturas para uma variegada clientela de instituições religiosas. Entre as maiores encomendas desse período estão três altares para a Capela de São José, em Toledo (1597-99); três pinturas (1596-1600) para o Colégio de Doña María de Aragon, no monastério agostiniano de Madri; e o altar-mor, quatro altares laterais e a pintura Santo Idelfonso para a Capela Maior do Hospital de la Caridad de Illescas (1603-05).[2] As minutas da comissão de A Virgem da Imaculada Conceição (1607-13), que era composta pelos membros da municipalidade, descrevem El Greco como "um dos maiores homens neste reino e fora dele".[34]Entre 1607 e 1608 El Greco viu-se envolvido numa demorada disputa judicial com as autoridades do Hospital da Caridade de Illescas a respeito do pagamento pelo seu trabalho, que incluía pintura, escultura e projeto arquitetônico[i]. Esta e outras disputas legais contribuíram para as dificuldades econômicas por ele experimentadas no final da vida.[35] Em 1608 recebeu sua última grande encomenda: para o Hospital de São João Batista, em Toledo.[19]
El Greco fez de Toledo seu lar. Contratos sobreviventes mencionam-no como inquilino em 1585 de um complexo de três apartamentos e vinte e quatro quartos que pertenceram ao Marquês de Vilhena.[36] Foi nestes apartamentos, que também lhe serviam como estúdio, que passou o resto de sua vida, enquanto pintava e estudava. Vivia em grande estilo, algumas vezes contratando músicos para tocarem enquanto ceava. Não se pôde confirmar que vivia com a sua companheira espanhola, Jerónima de Las Cuevas, com quem certamente nunca se casou. Ela foi a mãe de seu único filho, Jorge Manuel, nascido em 1578, e que tornou-se também pintor, ajudando ao pai e repetindo-lhe as composições por muitos anos, depois que herdou-lhe o estúdio[j]. Em 1604 Jorge Manuel e Alfonsa de los Morales tiveram o neto de El Greco, Gabriel, que foi batizado por Gregorio Ângulo, governador de Toledo e amigo pessoal do artista.[35]
Durante a execução de uma encomenda para o Hospital Tavera, El Greco caiu gravemente doente, vindo a falecer um mês depois, a 3 de abril de 1614. Poucos dias antes, em 31 de março, havia designado o filho como seu herdeiro. Dois gregos, amigos do pintor, foram as testemunhas de seu testamento (o mestre nunca perdeu o contato com suas origens gregas).[37] Foi sepultado na Igreja de São Domingo o Velho[38].
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