sábado, 29 de novembro de 2014

Resenha de Filme - Santa

Santa. O Primeiro Filme Falado Do México.
O filme mexicano “Santa”, realizado em 1931, foi o primeiro filme falado desse país. Tive a oportunidade de conferir essa pequena preciosidade no Festival Recine, o Festival Internacional de Cinema de Arquivo deste ano que, diga-se de passagem, é realizado todo ano no Arquivo Nacional, sempre com entrada franca. Numa sessão em que eu era o único espectador da sala, num miniauditório improvisado, pude me deleitar com a beleza da estonteante Lupita Tovar, uma atriz mexicana de prestígio da época e viva até hoje (está com 104 anos!!!!).
Vemos aqui a história de uma moça do interior de nome Santa (Tovar), que se apaixona por um militar de nome Marcelino (interpretado por Donald Reed). Após semanas de namoro, Santa é execrada de sua casa por sua família, principalmente pelos seus dois irmãos. Para piorar a situação, Marcelino vai embora e deixa a menina desamparada, que será obrigada a se prostituir. No prostíbulo onde vive, conhece o toureiro Jarameño (interpretado por Juan José Martinez Casado), que se apaixona loucamente por ela, e o pianista cego Hipólito (interpretado por Carlos Orellana), igualmente apaixonado. Santa irá se casar com Jarameño por simples conveniência, para se livrar daquela vida, e confidencia tudo isso para o doce Hipólito, partindo-lhe o coração. Mas Marcelino retornará e tentará reconquistar a moça, que cede aos encantos do ex-militar (foi expulso do exército por covardia). Jarameño flagrará Santa e Marcelino juntos e expulsará a moça de sua casa. De volta ao prostíbulo, adoece e é expulsa pela cafetona. Sem rumo, doente e decadente, encontrará abrigo na casa de Hipólito, que tomará conta dela e descobrirá, depois de uma consulta médica, que seu amor está com câncer e terá que fazer uma operação cara e de alto risco. E Santa não resistirá, falecendo na mesa de cirurgia. O filme termina com Hipólito fazendo uma oração junto ao túmulo de Santa, acariciando seu nome na lápide. Fim (graças a Deus!).
Ufa! Uma história muito triste para o primeiro filme mexicano falado! Como é um filme bem antigo (tem oitenta e três anos), há elementos muito datados. Em primeiro lugar, um preconceito latente contra a mulher que busca a felicidade no amor, quando se exige um comportamento muito mais recatado. Esse preconceito que faz a menina ser expulsa de casa só a joga de vez na prostituição, onde o preconceito se alimenta ainda mais. A menina doce e ingênua se torna dura e com um certo grau de perversidade por força das circunstâncias. Mas o filme também mostra que as escolhas de Santa são erradas ao aceitar um casamento com Jarameño por conveniência e ceder às tentações de Marcelino. O câncer que se abate sobre a moça parece até um castigo divino que a pune por suas escolhas erradas. De se lamentar mesmo é todo o sofrimento de Hipólito, um pianista cego que ama a menina incondicionalmente, nem quando a doença faz com que ela não seja mais “a mulher mais bonita de todo o México”. Falando em beleza, vemos aqui toda uma estética do star system do cinema mudo, como a famosa proporção dois para um entre os olhos e a boca, além de lábios em formato de coração. O penteado de Santa também é digno de nota. Na vida prosaica do campo e de sua pequena cidade, ela tem duas longas tranças. Na vida urbana do prostíbulo, o penteado curto típico dos anos 1920 lhe dá um tom mais “vamp”.

Apesar dos preconceitos latentes da época, para o cinéfilo sempre é um grande prazer ver uma joia desse quilate. Algo somente disponível em festivais como esse, que merecem mais divulgação e público. Fiquem sempre de olho no mês de novembro no Arquivo Nacional...


Cartaz do filme


Marcelino, o militar, seduz a jovem Santa.


O lindo affair não terminará bem...

e Santa se tornará uma prostituta dura e levemente perversa.


Decadente, Santa tem o apoio do pianista cego Hipólito

Seu final será trágico (os pecadores não tinham perdão naquela época)


 
Lupita Tovar, belíssima...


E numa foto mais recente...

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Resenha de Filme - Uma Promessa

Uma Promessa. História de Amor Em Tempos De Guerra.
Uma típica história de amor. Mais um triângulo amoroso. Mas, qual é o diferencial de “Uma Promessa”? Em primeiro lugar, é baseada num livro de Stefan Zweig. Já é um belo cartão de visitas. Outro detalhe interessante é que a história se passa na Alemanha da Primeira Guerra Mundial, que dá um tom a mais nesse romance.
Vemos aqui o personagem Friedrich Zeitz (interpretado por Richard Madden), uma espécie de menino prodígio que começa a trabalhar numa siderúrgica, comandada pelo sisudo e austero Karl Hoffmeister (interpretado pelo sempre excelente Alan Rickman). O presidente da siderúrgica encontrará o jovem funcionário fazendo serão, o que chamará a sua atenção. Uma doença grave, entretanto, levará Herr Hoffmeister para um repouso forçado em casa e Friedrich será o eleito para relatar tudo o que acontece na fábrica, assim como também para ditar as ordens do patrão para os empregados. Isso forçará Friedrich a frequentar a casa dos Hoffmeister, onde ele conhecerá a bela esposa de Karl, Lotte (interpretada por Rebecca Hall). O convívio com os Hoffmeister fará com que Friedrich se torne cada vez mais íntimo da família e o inevitável triângulo amoroso surgirá, num cenário conturbado com a Alemanha prestes a entrar na Primeira Guerra Mundial, algo que irá afetar os relacionamentos dos três protagonistas.
As características que mais chamam a atenção no filme são várias. Em primeiro lugar, a ótima caracterização de época, com excelentes figurinos e locações. O filme visualmente é muito elegante, principalmente quando vemos a mansão dos Hoffmeister. Mas há miséria também, seja no sótão sombrio de Friedrich, seja na siderúrgica, onde o proletariado alemão aparece com toda a sua força. Com relação à interpretação dos atores, Alan Rickman deu um show à parte. Sua interpretação contida e levemente sarcástica era cheia de entrelinhas, mostrando as suas suspeitas do affair entre Friedrich e Lotte. Deu gosto de ver o trabalho desse ator que geralmente interpreta vilões. O filme também chama a atenção por um voyeurismo total. Friedrich vê Lotte às escondidas, Karl vê Lotte e Friedrich às escondidas. Lotte vê o sótãozinho miserável de Friedrich às escondidas. Karl e Friedrich espreitam Lotte ao piano. Toda essa situação voyeur atiça desejos implícitos nos personagens, alimentando possíveis situações de conflitos que não chegam a se concretizar na sua forma mais explosiva. Do ponto de vista técnico, o filme também mostra pequenos movimentos de câmara levemente vertiginosos. Os enquadramentos não são estáticos. Sempre há algum movimento de câmara, discreto, mas que se faz notar, incomodando a percepção do espectador. Esses movimentos de câmara ficarão muito intensos quando o pequeno filho dos Hoffmeister, Otto, desaparece num parque de diversões para o desespero de Friedrich e Lotte. O desespero dos dois está manifesto nos bruscos movimentos de câmara que simulavam a busca do menino pelo casal.

A história não empolga muito, embora ela fique mais angustiante no período da guerra. O final poderia ter sido mais bem trabalhado e menos óbvio. Mas parece que a intenção foi fazer algo meio água com açúcar aqui. De qualquer forma, o filme tem os méritos citados acima. E, para quem gosta de um drama amoroso típico, esse filme é um prato cheio.


Cartaz do filme.


Lotte e Friedrich. Um amor às escondidas.


Karl, o esposo e patrão austero.


 
Mais um triângulo amoroso no cinema...

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Resenha de Filme - Cantinflas

Cantinflas. Explosão De Amor Ao Antigo Cinema.
Uma excelente produção mexicana que homenageia um dos maiores nomes do cinema asteca. Mário Moreno. Não conhece? E se falarmos de Cantinflas? Não conhece ainda? Então vá procurar uma enciclopédia ou dicionário de cinema, pois você não sabe o que está perdendo. Ele foi um grande comediante e um nome muito conhecido na América Latina. Moreno (interpretado por Óscar Jaenada) começou como assistente numa pequena trupe mambembe onde ele varria o chão, ajudava os artistas e fazia pequenos serviços, sendo uma espécie de faz-tudo. Aos pouquinhos, Moreno conseguiu pontinhas no palco. Mas a filha ninfomaníaca do patrão provocou a expulsão de Cantinflas da trupe. Sua sorte é que o dono de outra pequena companhia de atores assistiu ao seu show baseado no improviso e o chamou para trabalhar. Daí foi um passo para o teatro, cinema e estrelato.
O filme é daqueles que monta sua estrutura narrativa com idas e vindas ao longo do tempo e do espaço. Vemos o início da carreira do artista, toureiro, boxer e palhaço no México do começo da década de 1930 alternado com a Hollywood dos anos 1950, onde o produtor Michael Todd (interpretado por Michael Imperioli) quer fazer a filmagem de “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias” somente com atores de primeira grandeza de Hollywood e do mundo inteiro. Para o caso mexicano, Cantinflas foi o indicado para ser um chefe apache que ataca o protagonista. Obviamente, Cantinflas, um já famoso ator, não aceitou a proposta. O projeto quase foi por água abaixo, não fosse a ajuda de uma pessoa muito especial que convenceu Cantinflas. Mas não contarei aqui quem foi.
Falando em cinema, nossa história é um prato cheio para os fãs da sétima arte. Foram feitas boas caracterizações de astros de Hollywood, como Elisabeth Taylor, e outras nem tanto, como Yul Brinner. De qualquer forma, ficou muito bacana a reprodução do glamour de Hollywood da década de 1950, com o uso de um bom figurino, carros de época, boas locações e até bons efeitos de computação gráfica. Tudo isso dava um colorido especial ao filme, seja de forma metafórica, seja na plasticidade das imagens.

Quando a gente tem a boa experiência de ver esse bom filme “Cantinflas”, a primeira vontade que dá é rever “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias” e relembrar David Niven, Shirley McLaine e Cantinflas, que realmente chamava muito a atenção com o seu carisma interpretando um dos protagonistas. Tal trabalho lhe rendeu o Globo de Ouro, quando ele concorria com atores do porte de Marlon Brando e Yul Brinner. Um mexicano que conquistou os Estados Unidos. Um mexicano homenageado por um filme que faz tais honras de forma muito amorosa, falando ternamente de um dos maiores ídolos de terras astecas. Um filme que também lembra o glamour de um cinema pretérito de forma apaixonada, numa época em que você ia ao cinema para ver o ator de sua preferência e idolatria atuando, que você colecionava fotos e mandava cartas a Hollywood para seu ídolo, onde a plasticidade dos fotogramas era revestida por talentos de carne e osso, e não mirabolantes efeitos especiais gerados por computador que eclipsam os talentos dos atores atuais que, por isso, não decolam como os talentos dos atores de antigamente. Toda essa visão romântica do cinema, desconhecida das novas gerações, vem à tona com “Cantinflas”. Um programa imperdível, mas lamentavelmente, pouco divulgado, como já tenho mencionado aqui com outros filmes. Definitivamente, o cinéfilo precisa às vezes fazer o trabalho de garimpeiro. O Festival do Rio que o diga...

Cartaz do filme.


O ator buscando seu personagem...

Verdadeiro Cantinflas. Excelente caracterização


Com a esposa. Turbulências...


Um toureiro corajoso...


Negociando sua participação em Hollywood...


Belo balé da sequência final


Fotograma de "A Volta ao Mundo em Oitenta Dias". 

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Resenha de Filme - Tim Maia

Tim Maia. Trajetória Conturbada De Um Gênio.
Às vezes, a vida consegue ser mais criativa que a arte. Isso é o que vemos no excelente filme “Tim Maia”, que conta a trajetória do famoso compositor e cantor. A história de vida do artista que ficou conhecido como “síndico” por causa da música “W/Brasil”, de Jorge Benjor, é algo que beira o surreal. E é muito divertida, pois tira do pedestal alguns símbolos que conhecemos como ícones tais como Roberto e Erasmo Carlos. É um filme que também aborda o tema do racismo e do preconceito e de como um temperamento forte pode destruir uma vida e nos privar de um enorme talento.
O filme começa numa Tijuca antiga e tradicional, onde um menino negro de nome Sebastião estudava numa escola católica e ajudava a mãe no comércio de marmitas, tornando-se conhecido em todo o bairro. Um belo dia, ele passa em frente a uma loja de discos e conhece a música, o que desperta nele o desejo de ser cantor. Sebastião irá então formar seus primeiros grupinhos musicais, fazendo apresentações na igreja. É nessa época que ele conhece Roberto e Erasmo Carlos e formar um grupo para tocar no programa de TV de Carlos Imperial, que vê o grupinho da Tijuca com preconceito e arroubos de racismo, embora os aceite e os leve até para conhecer a bossa nova na zona sul. Mas o programa de Imperial acaba e Sebastião tentará a sorte nos Estados Unidos, onde se envolve com a criminalidade, as drogas e a prisão. De volta ao Brasil e na pior, Sebastião vai a São Paulo, onde as pessoas ganham dinheiro com a música. Roberto Carlos, inclusive, já tem o programa “Jovem Guarda” na tv. Após várias tentativas de falar com Roberto, Sebastião finalmente consegue e escreve músicas para o famoso cantor, enquanto sobrevive cantando em barzinhos. A partir daí, sua carreira como músico e cantor finalmente decola. O agora Tim Maia conhece o estrelato, mas também uma vida muito desregrada, com direito a sexo, drogas e... drogas. Seu comportamento totalmente destemperado afastou todos de sua vida: amores, amigos, integrantes da banda. Ele foi ao fundo do poço... e, praticamente, não mais voltou...
Se o filme tem momentos muito engraçados (o Roberto Carlos estava muito caricato, sendo muito hilário, e a personalidade de Tim Maia também é digna de muitas gargalhadas), a decadência do cantor, exibida de forma nua e crua, expressa muita tristeza. A história tinha mesmo que ser intensa, tal como o protagonista. Entretanto, sempre haverá alguém que vai dizer que conhecia o cantor e que o filme não era nada daquilo, que o comportamento do cantor era muito pior, etc. (esse tipo de comentário apareceu muito no filme “Cazuza”). De qualquer forma, a trama nos dá uma oportunidade de presenciarmos situações de que ouvimos falar.
A questão do preconceito é também algo digno de nota. Com uma história muito datada, o racismo da época, que hoje nos parece muito agressivo, era encarado de uma forma até tolerante naquela época. Claro que havia a indignação, como vemos em algumas falas do personagem de Tim Maia, mas as reações às manifestações de preconceito realmente pareciam mais passivas do que as de hoje. Outros tempos, outras mentalidades.

É um filme para rir, chorar e se impressionar. Um filme brasileiro e tanto, que fala de coisas com as quais nos identificamos rapidamente. Vale muito a pena dar uma conferida.

 
Cartaz do filme


Tim Maia jovem (Robson Nunes)


Tim Maia adulto (Babu Santana, excelente caracterização)


Começo de carreira com Roberto Carlos...

Uma verdadeira caricatura...


Ripongas...


O síndico...

sábado, 22 de novembro de 2014

Resenha de Filme - O Juiz

O Juiz. Drama De Pai E Filho Apimentado No Tribunal.
Um bom filme americano. “O Juiz” consegue conciliar dois temas com maestria: o filme de julgamento e o drama familiar. Filmes de julgamento sempre exigem muito do espectador, pois nós temos que ser muito atenciosos às argumentações e linhas de raciocínio da acusação e defesa, algo que já torna a história em si muito fascinante. “O Juiz” tem o mérito de ser um bom filme de julgamento. Mas há outras virtudes como, por exemplo, o pesado drama familiar, muito intrincado, que afeta o andamento de todo o processo criminal exposto na história.
Vemos aqui a história de Hank (interpretado por Robert Downey Jr.), um advogado valentão que ganha todos os casos que pega, baseado no seu forte conhecimento da justiça e poder de argumentação. Acostumado a defender somente gente que não presta e muito rica, Hank tem uma vida confortável, uma bela esposa e uma filhinha sensacional. Mas seu casamento está em crise, pois Hank não é um marido presente, totalmente envolvido no trabalho. A vida do advogado vai sofrer uma enorme reviravolta com a notícia da morte da mãe, que o faz retornar à sua cidadezinha natal, pacata e de interior, após vinte anos de ausência. Lá, ele vai reencontrar sua família. O irmão mais velho, Glen (interpretado por Vincent D’Onofrio), era uma promessa do beisebol, mas um acidente inutilizou a sua mão. O irmão caçula, Dale (interpretado por Jeremy Strong), tem um retardamento mental e é fissurado em filmadoras antigas e projeções da família nos dias de infância dos filhos. E o pai, Joseph (interpretado pelo ótimo Robert Duvall), é o juiz da cidadezinha, que sempre baseou sua carreira na retidão e na ética. Essa família logo se mostrará cheia de conflitos altamente emaranhados cujos detalhes fugirão do universo dos spoilers. O filme ficaria apenas no âmbito do drama familiar, não fosse por um detalhe. O juiz só será acusado de atropelar e matar um criminoso que ele condenou a vinte anos de prisão. Assim, Hank usará de todas as suas habilidades para absolver seu pai no julgamento. Mas Hank terá que enfrentar um promotor à altura de seu talento, o advogado Dwight Dickham (interpretado por Billy Bob Thornton).
A família de Hank, os Palmer, como vimos, é cheia de conflitos. O juiz e o filho advogado serão o epicentro da crise familiar. O pai sempre teve um comportamento muito frio e rígido com o filho do meio, algo que não era aceito pela finada mãe e esposa. O afastamento por um longo tempo de Hank da família só piorou as coisas. Tanta acidez familiar só era aliviada pelo filho “especial” e suas projeções de um passado familiar feliz, onde todos os filhos eram ainda crianças, sendo vistos com nostalgia pelos membros familiares, agora carcomidos por crises e mágoas. Só que, infelizmente, esses breves momentos de saudade não são suficientes para conter a ebulição, que vai afetar inclusive a estratégia de defesa do julgamento, para total desespero de Hank, que não consegue lidar com as teimosias do pai.

Apesar do tema do julgamento ser muito atraente no filme, não podemos deixar de falar que o grande objeto de “O Juiz” é realmente o conflito familiar, e de como é difícil fechar feridas tão profundas. Definitivamente, as mágoas familiares são as piores de se curar, demorando até anos para que isso ocorra e, às vezes, essa cura ocorre apenas parcialmente. É o tipo de filme que nos faz olhar para dentro de nós mesmos e encaramos nossas mágoas e ressentimentos adormecidos que nos envenenam aos poucos. Sempre nos identificamos de uma forma ou de outra com um filme desse tipo. “o Juiz”, por isso, é mais um filme que merece uma atenção especial.


Cartaz do filme.


Joseph e Hank Palmer. Conflitos entre pai e filho num julgamento.


 
O irmão mais velho Glen. Promessa no beisebol carreira destruída num acidente.


O irmão caçula Dale. Paixão pelo cinema.


O hábil promotor Dickham


Pai e filho em caminhos opostos.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Resenha de Filme - Mil Vezes Boa Noite

Mil Vezes Boa Noite. Paz Na Guerra E Guerra Na Paz.
Um interessante filme que conta com a excelente presença de Juliette Binoche e... Larry Mullen Jr. Isso mesmo, o baterista do U2 tem, entre as suas atribuições, desenvolver a carreira de ator. “Mil Vezes Boa Noite” vai falar de Rebecca (interpretada por Binoche), uma fotógrafa especializada em cobrir guerras e conflitos pelo mundo, passando por situações muito perigosas, onde sua vida sempre está em jogo. O problema é que seu marido, Marcus (interpretado por Nikolaj Coster-Waldau) e suas duas filhas não aguentam mais os riscos que a esposa e mãe correm, a ponto de Marcus lhe dar um ultimato depois que Rebecca é seriamente ferida num atentado a bomba em Cabul: ou ela deixa a perigosa carreira, ou Marcus a deixa. Rebecca irá desistir da carreira, mas surgirá o convite para ela fotografar um campo de refugiados no Quênia, aparentemente tranquilo. Rebecca irá para lá com sua filha mais velha Steph (interpretada por Lauryn Canny), que quer fazer um trabalho na escola sobre a África e quer compartilhar as experiências da mãe, até para poder se aproximar dela.
Esse é um filme de emoções muito fortes. Um filme que consegue orbitar de forma eficiente da esfera do público a esfera do privado. É um filme de denúncia, pois fala das condições de miséria extrema em regiões da África e Ásia, e de violentas guerras civis que, em última análise, são provocadas pela ganância de grandes corporações capitalistas do primeiro mundo. Tal situação de injustiça atiça o espírito desafiador de Rebecca, que a encoraja a enfrentar todas as mazelas das guerras civis para denunciá-las com o clique de sua câmara fotográfica. Mas, por outro lado, seu espírito desafiador implode o relacionamento com o marido e as filhas. Assim, nossa protagonista está numa situação de constante guerra. Em seu trabalho, ela registra a guerra alheia. Em seu lar, ela sofre os efeitos de uma guerra dela contra ela mesma, onde seus entes queridos estão envolvidos. E não há mocinhos ou bandidos nessa guerra privada. Apenas vítimas. Tais conflitos familiares são muito intensos. E Juliette Binoche nos brinda com uma interpretação soberba, onde sua expressão de sentimentos nos dói até nos ossos. Larry Mullen Jr? Bom, ele fez um dos coadjuvantes e era muito, muito comedido, quase em sussurros. Ainda tem que melhorar muito. Força nas baquetas! De qualquer forma, é legal ver nosso baterista tentar. Só que perto de Binoche, é covardia...

O mais problemático aqui é que, qualquer que seja a decisão de Rebecca, ela sofrerá perdas. Se optar pela família, não dará mais voz aos massacrados pelo horror da guerra. E, se optar pela carreira, se afastará ainda mais de sua família, talvez definitivamente. Qualquer que seja a decisão, ela será tomada por caminhos muito tortuosos e difíceis, que só aumentam as fortes emoções desse ótimo drama familiar regado a um forte tom social. É uma película muito curiosa e digna de atenção.


Cartaz do filme


 
Rebecca, uma destemida fotógrafa


Que arrisca sua vida frequentemente.


A relação com o marido Marcus tem altos e baixos.


Buscando se aproximar da filha Steph


Mãe e filha num campo de refugiados.


Larry Mullen Jr se esforça, mas...

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Resenha de Filme - Trinta

Trinta. Um Bailarino Que Une Ópera E Samba.
Um excelente filme brasileiro em nossas telas. “Trinta” conta a história do consagrado e conhecido carnavalesco Joãozinho Trinta em seu início de carreira, quando era assistente de Fernando Pamplona no Salgueiro e teve que substituir o carnavalesco oficial após uma discussão que este teve com o banqueiro de bicho da escola de samba. Joãozinho teve que enfrentar todo o tipo de preconceito, pois ele era bailarino do Teatro Municipal, numa época em que a homofobia era ainda maior que a de hoje. Preconceito de seus familiares de São Luís, Maranhão. Preconceito da comunidade do Salgueiro, que via em Pamplona um verdadeiro carnavalesco e via o novato Joãozinho com desconfiança. Preconceito contra as ideias absolutamente revolucionárias e eruditas de Joãozinho, que pareciam ter nada a ver com samba. Mas o maranhense altamente talentoso e sensível soube entrar no esquema e domar a tudo e a todos, dizendo que tinha Exu no corpo!
E os atores? Matheus Nachtergaele, sempre talentosíssimo, conseguiu praticamente ressuscitar Joãozinho diante de nossos olhos, com uma interpretação carregada de toda uma gestualidade que lembrava muito o carnavalesco. O ator conseguiu combinar toda uma sensibilidade e delicadeza do personagem bailarino com o pulso forte do carnavalesco que sabe comandar toda uma equipe que, em alguns momentos, chegava a ser hostil a ele pelos preconceitos que já foram mencionados aqui. Milhem Cortaz, o Tião, símbolo máximo da resistência da comunidade ao protagonista, também estava estupendo, com seu biótipo e jeitão meio vaca brava, que ele consegue interpretar tão bem, com sua consagrada voz cavernosa. Tanto Matheus quanto Milhem já são figurinhas carimbadas. Não podemos esquecer de falar da bela atuação de Fabrício Boliveira, o Calça Larga, uma espécie de aglutinador e conciliador de egos da escola de samba. E um destaque todo especial para Paulo Tiefenthaler, que interpretou um ótimo Fernando Pamplona, que tem aquele jeitão mesmo, firme e carismático, expresso até nas vezes em que fez comentários para desfiles de escola de samba na extinta TV Manchete, lá na década de 1980.
O detalhe que chama mais a atenção do filme é como Pamplona e Joãozinho conseguiam enxergar de forma magistral as relações entre a ópera que encenavam no Teatro Municipal e a montagem e a constituição de um desfile de escola de samba. As pesquisas históricas na construção do enredo realizadas por Joãozinho de forma muito eficiente também são destacadas na trama. Só é de se lamentar que o filme tenha ficado muito focado no seu primeiro desfile como carnavalesco no Salgueiro em 1974. Por ser muito bom, o filme parece acabar antes do tempo e fica um gostinho de quero mais. É um pecado, por exemplo, não aparecer sua fase na Beija-Flor e o antológico desfile de 1989, com o enredo “Ratos e Urubus, Larguem a Minha Fantasia”, citado no filme somente em imagens de arquivo. Mas tudo é uma questão de recorte. Optou-se por radiografar o início da carreira do carnavalesco e não a sua época já consagrada.

Apesar do filme poder ter uma maior duração, de tão bom que foi, “Trinta” é um filmaço, e merece muito ser visto, principalmente pelos amantes do samba e para aqueles que querem conhecer um pouco mais o cotidiano da preparação de um desfile de escola de samba. Programa imperdível. 

Cartaz do filme


Joãozinho Trinta (Matheus Nachtergaele)


Fernando Pamplona (Paulo Tiefenthaler) e sua esposa Zeni (Paolla Oliveira)


Joãozinho com Calça Larga (Fabrício Boliveira)


Ernani Moraes faz o banqueiro de jogo de bicho Germano.


Tião (Milhem Cortaz) será um empecilho para Joãozinho.


Mestre Sala Claudinho e  Porta Bandeira Selminha com Paolla Oliveira. Também participaram do filme, apesar de defenderem as cores do Salgueiro (Na vida real, defendem a Beija Flor).


Joãozinho e sua rainha da França. 


Gênio Indomável. Muitas saudades...

domingo, 16 de novembro de 2014

Resenha de Filme - Interestelar

Interestelar. Brincando Com O Paradoxo Dos Gêmeos.
Uma interessante ficção científica mesclada com drama. “Interestelar”, de Christopher Nolan, é um filme bem família cujos personagens principais tocam uma fazenda de interior com uma grande plantação de milho. Mas, entre essas relações familiares, há viagens espaciais, buracos de minhoca e buracos negros. E a mensagem ecológica implícita, cada vez mais vinculada à sobrevivência da espécie humana.
Vemos aqui um futuro sombrio para a Terra. Devido aos constantes problemas climáticos, espécies vegetais como o quiabo e o trigo estão se extinguindo. Gigantescas tempestades de poeira causam graves doenças respiratórias que logo acabarão com a humanidade. A mudança climática violenta no planeta mudou também o comportamento da espécie humana. De desbravadora e exploradora, ela passou a concentrar seus esforços na produção de alimentos. Investir dinheiro em exploração espacial, por exemplo, torna-se uma insanidade em virtude do desperdício. Todos os esforços devem estar voltados na produção de comida, muito escassa. O fazendeiro Cooper (interpretado pelo sempre excelente Matthew McConaughey), antigo engenheiro e piloto da NASA, não consegue aceitar sua vidinha atual. Ele estimula o conhecimento e inteligência aguçada da filha Murph, que pensa ver fenômenos sobrenaturais. Cooper consegue “enxergar” coordenadas geográficas nesses fenômenos, levando pai e filha a uma instalação secreta da NASA. Lá, ele reencontra o Professor Brand (interpretado pelo também excelente Michael Caine), que encabeça um projeto de se buscar outros planetas habitáveis para a raça humana, pois uma civilização alienígena instalou nas cercanias de Saturno um buraco de minhoca que serve de portal para outra galáxia, onde há planetas candidatos a abrigar os terráqueos e para onde já foram cientistas para explorá-los. Agora, é a vez de uma equipe liderada por Cooper, que conta com a filha do professor Brand (interpretada por Anne Hathaway) partir e contactar os cientistas para verificar qual é o melhor candidato.
“Interestelar” é uma ficção científica que aborda muito as questões da relatividade e do espaço-tempo, assim como as interações da física relativística com a mecânica quântica. O filme também abusa da ideia de paradoxo dos gêmeos onde, na relatividade especial, se você imagina a situação hipotética de dois irmãos gêmeos onde um permanece na Terra e outro viaja numa nave espacial a velocidade da luz, o tempo passará mais lentamente para nosso viajante, de forma que, quando ele retorna à Terra, muito tempo já se passou e seu irmão está velhinho, ao passo que a idade do viajante é praticamente a mesma. Como do outro lado do buraco de minhoca há um buraco negro onde há planetas candidatos próximos, a nave espacial deve ir próxima ao buraco negro, cuja violenta deformação no espaço-tempo provocaria o paradoxo dos gêmeos. Assim, Murph, que ficou muito ressentida com a viagem do pai, vai se tornar mulher feita (interpretada por Jessica Chastain) enquanto que o tempo para o pai do outro lado do buraco de minhoca parece passar pouco. Nesse momento, a ficção científica passa mais para o drama, onde são exploradas as implicações emocionais que a violenta diferença de idade provocada pelo paradoxo dos gêmeos acaba suscitando. Um drama regado a teoria da relatividade especial.

Outra informação a ser dada é que a película tem uma longa duração, cerca de duas horas e quarenta. Essa duração exagerada vai contra o filme, pois a história parece ficar arrastada em alguns momentos, principalmente naqueles em que o drama ocupa mais espaço na narrativa do que a ficção científica. Não espere, também, um filme de ação. Há alguns momentos de luta, mais tensos, que exigem um ritmo mais rápido. Mas, definitivamente, não é a tônica do filme. “Interestelar” é uma ficção científica bem mais cerebral, um tanto irresponsável em alguns momentos (mas também não seria ficção se não fosse irresponsável!). A mistura de ficção científica com drama pode desagradar aos amantes de ambos os gêneros. Entretanto, “Interestelar” pode ser entendido como um bom filme pois, apesar do tema já explorado da busca de outros planetas para salvar a raça humana, o uso da relatividade e da mecânica quântica como arcabouços teóricos para a trama são louváveis. A longa duração do filme e a química nem sempre eficiente entre ficção científica e drama são seus maiores defeitos. Ainda assim, a história é boa  e prende a atenção. É um filme que vale a pena.

 
Cartaz do Filme


Cooper. De piloto frustrado a herói da humanidade


Bom relacionamento com a filha Murph é afetado pela viagem espacial


Naves que simulam gravidade artificial como em 2001.


A filha do professor Brand também está na missão.


Planetas estranhos...


Belos efeitos especiais.

Ops! Já vimos isso antes!!!!