Brigitte Helm, A Deusa Eterna De Yoshiwara!!!

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terça-feira, 2 de setembro de 2014

Resenha de Filme - A Idade da Terra, de Glauber Rocha

A Idade Da Terra. Uma Porralouquice Com Lógica Interna.
Mais um filme de Glauber. A película “A Idade da Terra” pode ser definida como altamente experimental, dentro da linha de filmes mais herméticos do cineasta baiano. Por não seguir uma linha narrativa mais tradicional, o filme descamba para uma concepção altamente fragmentada, mais parecendo um delírio de porralouquices. Mas há uma lógica interna presente, há algo a ser contado. E a genialidade do diretor se manifesta no elenco que trabalhou com ele, uma verdadeira constelação de estrelas brasileiras. Vejamos: Tarcísio Meira, Antônio Pitanga (um “habitué” dos filmes de Glauber), Maurício do Valle (idem), Danuza Leão, Jece Valadão, Geraldo del Rey, Norma Bengell.
O primeiro elemento identificado no filme é o caleidoscópio de signos culturais e sociais brasileiros. Vemos no início da exibição um longuíssimo plano de um pôr-do-sol em tempo real, seguido pela cultura considerada a mais ancestral de todas de nosso país: a indígena. Apesar de presenciarmos brancos (até louros!) fazendo papel de índios, a ideia está lá, onde planos curtíssimos são alternados com planos de média duração, destacando-se aí o trabalho da montagem, que aumenta a dramaticidade dos rituais, num ritmo frenético. Jece Valadão é o paradigma do herói nacional, circulando por todas as celebrações indígenas, que têm Bengell como uma espécie de Vênus tupiniquim.
Em seguida, uma visão aterrorizante de um Maurício do Valle espraguejando ameaças contra o Brasil. Sua longa cabeleira loura e seu sotaque carregado o associam a um imperialismo americano demonizado. Sua área de atuação é a moderna Brasília, onde ele implantará suas garras, se maravilhará com as riquezas brasileiras, vai querer comer o cu do povo. Aqui vemos os experimentalismos de Glauber, pois foi feita uma filmagem com peões de obra, onde Maurício do Valle interage com eles, dando-lhes beijos na testa e até chamando um de gay.
Outro elemento da cultura brasileira é o samba. O pano de fundo dessa vez é um desfile de escola de samba na Marquês de Sapucaí, onde o imperialista americano Maurício do Valle se esbalda e um Tarcísio Meira banqueiro de jogo do bicho se maravilha com a realização de sua obra, que é a escola de samba, manifestação de seu poder.
O litoral e as culturas africanas, o candomblé, também aparecem. Uma espécie de pai de santo “batiza” as pessoas na água do mar, ao som de músicas católicas, num retrato do sincretismo religioso no Brasil. O pai de santo entrega ao herói nacional Jece Valadão as armas para a luta contra os inimigos: flechas e um cocar. Uma figura meio que folclórica, com um chapéu napoleônico multicolorido, assobia a “Marselhesa” e é chamada de “Satanás!” por nosso herói Jece, que se aterrorizava de medo. A figura apocalíptica, símbolo do colonialismo europeu, dizia aos gritos para Jece que o nosso herói era extremamente perigoso e que havia sido mandado para matar o tupiniquim. Mas que não queria matá-lo, e sim que o brasileiro o obedecesse, o apoiasse, o respeitasse, numa mostra do embate da cultura brasileira contra o domínio estrangeiro.
Um momento mais “pé no chão” do filme, é a entrevista que Pitanga toma do jornalista Carlos Castelo Branco. O consagrado colunista político faz uma análise do golpe de 1964 e de como os generais presidentes se posicionaram com relação a política de alinhamento com os Estados Unidos na Guerra Fria, citando, por exemplo que Costa e Silva não tinha uma visão de alinhamento incondicional aos americanos, impondo até alguma resistência. Aqui vemos o Brasil civilizado, intelectualizado, cuja sala suntuosa onde se faz a entrevista é cheia de quadros alusivos à cultura nacional. Mas o barulho excessivo das pedras de gelo nos copo de uísque é altamente inquietante, onde sentimos arremedos de estrangeirismos nessa “civilização brasileira”.
Outros elementos da cultura nacional aparecem, como a Igreja Católica, representada de forma pomposa por bailarinas vestidas de freiras que dançam com muita leveza ou o futebol, onde Maurício do Valle simula narrações de jogos de futebol em plena rampa do Maracanã.
Vemos, então, como “A Idade da Terra” tem características altamente heterogêneas. Em primeiro lugar, o alto experimentalismo, seja no encontro de Maurício do Valle com os peões, seja na tomada de uma crise de pressão alta de Maurício do Valle, durante as filmagens, inserida no filme. Declamações altamente cheias de paroxismo também dão a tônica da trama, onde ideias de cunho político-social são às vezes exaustivamente repetidas para impregnar o espectador de conceitos críticos sobre a situação brasileira. Essas explosões de paroxismo, associadas aos efeitos de edição e montagem, com alternância de planos curtos e longos que dão um ritmo frenético e inquieto, trazem um quê expressionista ao filme. Movimentos delirantes de câmara também auxiliam nessa impressão, principalmente na sequência onde Tarcísio Meira, à beira de uma Baía de Guanabara poluída, grita desesperadamente sobre a nossa condição nacional de “cloaca do Universo” e de “estruturas destruídas” de forma altamente repetitiva.

Desse jeito, “A Idade da Terra” é mais um filme de Glauber Rocha que não nos deixa indiferentes. O que parece uma película totalmente tresloucada mostra em seu íntimo um embate entre o nacional e o estrangeiro, além de um mapeamento sobre os elementos culturais de nosso país. Mas a trama não faz isso apenas inspirada numa cartilha marxista, como ocorre em muitos filmes de Glauber, já que a aplicação prática do socialismo é questionada em algumas falas e o não alinhamento dos generais mais sanguinários da ditadura militar brasileira aos Estados Unidos é citado. Numa época de altas polarizações políticas entre esquerda e direita, relativizar tais discussões parece uma atitude de grande coragem, digna do vulcão que foi Glauber Rocha.

 
Cartaz do Filme


Maurício do Valle e Antônio Pitanga: "habitués" de Glauber


Tarcísio Meira. Paroxismos


Experimentalismos exóticos


Jece Valadão. Herói tupiniquim


Norma Bengell. Uma Vênus Tupiniquim


Um pôr do sol em tempo real


Porra louca genial...

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