Santa.
O Primeiro Filme Falado Do México.
O filme mexicano
“Santa”, realizado em 1931, foi o primeiro filme falado desse país. Tive a
oportunidade de conferir essa pequena preciosidade no Festival Recine, o
Festival Internacional de Cinema de Arquivo deste ano que, diga-se de passagem,
é realizado todo ano no Arquivo Nacional, sempre com entrada franca. Numa
sessão em que eu era o único espectador da sala, num miniauditório improvisado,
pude me deleitar com a beleza da estonteante Lupita Tovar, uma atriz mexicana
de prestígio da época e viva até hoje (está com 104 anos!!!!).
Vemos aqui a história
de uma moça do interior de nome Santa (Tovar), que se apaixona por um militar
de nome Marcelino (interpretado por Donald Reed). Após semanas de namoro, Santa
é execrada de sua casa por sua família, principalmente pelos seus dois irmãos.
Para piorar a situação, Marcelino vai embora e deixa a menina desamparada, que
será obrigada a se prostituir. No prostíbulo onde vive, conhece o toureiro
Jarameño (interpretado por Juan José Martinez Casado), que se apaixona
loucamente por ela, e o pianista cego Hipólito (interpretado por Carlos
Orellana), igualmente apaixonado. Santa irá se casar com Jarameño por simples
conveniência, para se livrar daquela vida, e confidencia tudo isso para o doce
Hipólito, partindo-lhe o coração. Mas Marcelino retornará e tentará
reconquistar a moça, que cede aos encantos do ex-militar (foi expulso do
exército por covardia). Jarameño flagrará Santa e Marcelino juntos e expulsará
a moça de sua casa. De volta ao prostíbulo, adoece e é expulsa pela cafetona.
Sem rumo, doente e decadente, encontrará abrigo na casa de Hipólito, que tomará
conta dela e descobrirá, depois de uma consulta médica, que seu amor está com
câncer e terá que fazer uma operação cara e de alto risco. E Santa não
resistirá, falecendo na mesa de cirurgia. O filme termina com Hipólito fazendo
uma oração junto ao túmulo de Santa, acariciando seu nome na lápide. Fim
(graças a Deus!).
Ufa! Uma história muito
triste para o primeiro filme mexicano falado! Como é um filme bem antigo (tem
oitenta e três anos), há elementos muito datados. Em primeiro lugar, um
preconceito latente contra a mulher que busca a felicidade no amor, quando se
exige um comportamento muito mais recatado. Esse preconceito que faz a menina
ser expulsa de casa só a joga de vez na prostituição, onde o preconceito se
alimenta ainda mais. A menina doce e ingênua se torna dura e com um certo grau
de perversidade por força das circunstâncias. Mas o filme também mostra que as
escolhas de Santa são erradas ao aceitar um casamento com Jarameño por
conveniência e ceder às tentações de Marcelino. O câncer que se abate sobre a
moça parece até um castigo divino que a pune por suas escolhas erradas. De se
lamentar mesmo é todo o sofrimento de Hipólito, um pianista cego que ama a
menina incondicionalmente, nem quando a doença faz com que ela não seja mais “a
mulher mais bonita de todo o México”. Falando em beleza, vemos aqui toda uma
estética do star system do cinema
mudo, como a famosa proporção dois para um entre os olhos e a boca, além de
lábios em formato de coração. O penteado de Santa também é digno de nota. Na
vida prosaica do campo e de sua pequena cidade, ela tem duas longas tranças. Na
vida urbana do prostíbulo, o penteado curto típico dos anos 1920 lhe dá um tom
mais “vamp”.
Apesar dos preconceitos
latentes da época, para o cinéfilo sempre é um grande prazer ver uma joia desse
quilate. Algo somente disponível em festivais como esse, que merecem mais
divulgação e público. Fiquem sempre de olho no mês de novembro no Arquivo
Nacional...
Cartaz do filme
Marcelino, o militar, seduz a jovem Santa.
O lindo affair não terminará bem...
e Santa se tornará uma prostituta dura e levemente perversa.
Decadente, Santa tem o apoio do pianista cego Hipólito
Seu final será trágico (os pecadores não tinham perdão naquela época)
Lupita Tovar, belíssima...
E numa foto mais recente...