terça-feira, 31 de março de 2015

Resenha de Filme - Em um Pátio em Paris.

Em Um Pátio Em Paris. Comédia Dramática Doce, Mas Pesada.
Catherine Deneuve está de volta nessa produção francesa de 2014, “Em um Pátio em Paris”. Pode-se dizer que temos aqui uma fusão de gêneros. O filme começa com um tom de comédia, mas desde o início há indicadores de que teremos mais a frente um drama daqueles bem pesados. Apesar de contar com a presença da grande estrela francesa puxando a fila dos créditos, a história mesmo roda em torno do personagem Antoine (interpretado por Gustave Kervern), um músico depressivo que é viciado em cocaína. Ao abandonar um show do qual fazia parte (e, consequentemente, abandonar a própria carreira), Antoine se vê desempregado e buscando desesperadamente um emprego numa agência. Lá, recebeu a alternativa de trabalhar como zelador num condomínio, onde conhece o casal Serge (interpretado por Féodor Atkine) e Mathilde (interpretada por Deneuve). Ele é acolhido pelo casal e começa a trabalhar no prédio. Antoine vai conhecer os tipos mais diferentes, indo desde o vizinho chato que quer colocar ordem no prédio, passando pelo ex-jogador vendedor de bicicletas de segunda mão e tão viciado em pó como ele, e chegando até a um segurança sem teto, fanático por uma seita religiosa e que tem um cão de guarda. Antoine, já com problemas psicológicos demais, precisará lidar com toda essa gama de pessoas. Mas o relacionamento mais profundo será com Mathilde, uma dona de casa que busca ocupar seu tempo participando de associações que ajudam as pessoas. Mathilde até irá fazer leituras diárias de jornais para um morador cego do condomínio. Mas o que realmente atormenta a senhora é uma rachadura que está dentro de seu apartamento e que lhe dá a impressão de aumentar gradativamente. Mesmo depois de um especialista lhe garantir que não há perigo, ela leva o assunto à frente, para o desespero de seu marido. Mathilde, então, irá procurar a ajuda de Antoine para denunciar para a vizinhança do bairro o suposto problema.
O filme tem lances bem engraçados e dá para rir bastante na exibição da película. Mas os sinais de drama são evidentes, seja na vida desnorteada de Antoine, seja na vida vazia e levemente insana de Mathilde. Esses dois personagens vão se unir para enfrentar as suas adversidades. Entretanto, elas se tornam cada vez maiores e a superação delas será paulatinamente mais difícil. Assim, vemos uma história onde os personagens são muito fragilizados e a trama passa a ficar bem pesada com o tempo, deixando de ser uma comédia divertida. O mais curioso é que essa passagem de um gênero para outro não se faz de forma abrupta, e sim de forma bem gradativa, onde, em certo momento, comédia e drama se imbricam e interagem entre si, sinal de que temos um bom roteiro. Os lances engraçados estão lá, mas sabemos que os problemas e tragédias pessoais também estão lá.

Dessa forma, se você quer ver uma boa história muito bem escrita e ainda mais curtindo essa grande atriz francesa que é Catherine Deneuve (só o seu nome nos créditos já é motivo suficiente de ir ao cinema), “Em um Pátio em Paris” é um prato cheio. Um filme altamente recomendável.

Cartaz francês do filme


Antoine e Mathilde. Apoio mútuo para vencer a depressão


Uma senhora cheia de manias...


Um ex-músico recomeçando como zelador


Uma entrevista tensa e engraçada...


Forma inusitada de lavar o pátio


segunda-feira, 30 de março de 2015

Resenha de filme - O Sal da Terra.

O Sal Da Terra. Uma Obra-Prima.
E chegou às nossas telonas o tão esperado documentário sobre Sebastião Salgado, “O Sal da Terra”. Dirigido pelo grande diretor alemão Wim Wenders e com co-direção de Juliano Ribeiro Salgado (filho de Sebastião Salgado), esse documentário foi indicado ao Oscar de melhor documentário este ano e isso foi motivo suficiente para que a sua estreia por aqui fosse muito esperada. E a espera valeu a pena, pois o documentário em nada decepciona. Muito pelo contrário.
A película começa com um lindo preto e branco que se misturava com as fotos de Salgado de Serra Pelada. As imagens das fotos em fusão com o rosto do fotógrafo dando o seu depoimento das imagens que tomou vão indicar a tônica do filme, onde o fotógrafo falará de seus trabalhos. Vemos, também, um relato do próprio Wenders que fala de seu primeiro contato com uma foto tomada por Salgado de uma refugiada, que provocou comoção imediata no cineasta alemão e despertou a curiosidade em conhecê-lo.
O documentário vai descortinar a vida de Salgado, um economista que desistiu de uma carreira promissora para se lançar na incerta carreira de fotógrafo, primeiro de fotógrafo de esportes para, mais tarde, fotografar questões sociais. Os anos de exílio na França durante a ditadura militar, e o apoio incondicional da esposa a seus trabalhos, a começar por uma viagem pela América Latina, são ressaltados. Especialmente tocantes são seus trabalhos no Nordeste, onde ele retratava crianças mortas em caixões, e, principalmente, nas inúmeras guerras que ele presenciou na África, onde toda uma tragédia formada por genocídios e fome foi retratada de forma nua, crua e extremamente chocante. Tais trabalhos chegaram a provocar em nosso fotógrafo mais famoso uma descrença generalizada pela raça humana e até mudaram o objeto principal de seus trabalhos. Salgado passou a enfocar mais a natureza, fazendo trabalhos desde o arquipélago dos Galápagos para “ver o que Darwin viu” até o norte da Sibéria, onde fotografou morsas numa praia, não sem levar um susto de um urso polar antes.
A vida aventureira de Salgado, homem muito viajado que viu as mais diversas e inusitadas situações, é de tirar o fôlego. Mas, o mais curioso é que Salgado consegue se recriar até nos limites de sua própria casa, onde mostra com orgulho (e belíssimas imagens para variar) um projeto de reflorestamento da fazenda de sua família. Um legado que será deixado para as próximas gerações além de suas excepcionais fotos, onde o preto e branco e seu contraste bem nítido tornam a estética ainda mais bela, seja nas patas de uma iguana dos Galápagos, seja no corpo esquálido e inerte de um refugiado, onde toda a dor e desespero se manifestam.

Ao fim desse belo filme, temos a noção de que ele é tão essencial como os próprios ensaios fotográficos de Salgado, um homem que realmente soube aproveitar a vida e que deixou um grande legado para as gerações vindouras. Um legado de exaltação à beleza da natureza, mas que também denuncia toda a agressividade e violência humanas. Um documentário que foi aplaudido pelos espectadores da sala ao seu final e que é extremamente essencial.

 
Cartaz do filme


O trio que fez a diferença


Salgado, incansável com sua câmara


Com a esposa



Mostrando suas fotos a Wenders.


Fotografando a tribo Zoe na Amazônia


Poços de petróleo em chamas no Kwait em 1991.


A tragédia dos refugiados


Um brasileiro do qual nos devemos orgulhar....

domingo, 29 de março de 2015

Resenha de Filme - O Duplo

O Duplo. Dois Em Um.
Uma obra de Dostoievsky adaptada para as telonas. “O Duplo” conta a história de um funcionário de uma repartição pública altamente burocratizada e com um quê de organização secreta. O funcionário em questão se chama Simon (interpretado por Jesse Eisenberg). Ele é considerado um fracasso total, sendo tratado com desdém, desprezo e ignorância por todos: seus colegas de trabalho, seu chefe, a menininha por qual se apaixonou, até a sua mãe. E, para piorar, ele não toma uma atitude sequer para mudar isso. O mais intrigante é que Simon é um bom funcionário, cumprindo seus horários e obrigações, mas ninguém reconhece isso, pois ele assume uma posição altamente periférica com relação a tudo, passando despercebido por todos. Até que um dia chega um funcionário que tem uma postura completamente oposta à dele: é comunicativo, brincalhão, vaselina, enfim, muito popular com todos. Seu nome é James e sua aparência é idêntica a de Simon. Somente nosso protagonista percebe isso, ao passo que as outras pessoas não veem a semelhança, pois Simon é tão apagado que elas mal percebem sua cara. Isso irá provocar um desespero no homem tímido, que se aproxima de James para tentar aprender mais técnicas de persuasão e de como se soltar perante às pessoas. Só que o tiro sai pela culatra, pois James é um tremendo garganta e não faz nada no trabalho, se apropriando das tarefas feitas por Simon. Caberá ao nosso protagonista deter James para ele não perder o seu emprego ou, pior, não perder sua própria existência. Mas todas as investidas contra James misteriosamente recaem sobre ele também, mostrando que a ligação entre os dois é mais profunda do que parece.
Lembra quando todos nós, antigamente, tínhamos os chamados “Rádio-Gravadores”, onde podíamos escutar a rádio FM de nossa preferência e também nossas fitas cassete, se elas não estivessem mofadas ou agarrassem no cabeçote? E, ainda, lembra quando esse aparelhinho passou a ser chamado “Dois em Um”? Pois é. Essa, talvez, seja a melhor síntese de “O Duplo”. Não havia Simon e James separados. Eles eram apenas dois aspectos de uma mesma pessoa. Simon era resignado, nulo, obediente, tímido, porém dedicado e profissional. James era extrovertido, magnético, muito garganta, mas não queria nada com o trabalho. Duas facetas de um homem só, mas dominadas pela faceta de Simon. James, preso lá em seu interior, buscava aflorar, ele era a reação àquele estado letárgico de Simon que, obviamente, lutou para manter o seu controle. Simon tinha medo de James porque Simon tinha medo da mudança. Não havia uma harmonia entre os dois. O lado da timidez e do medo reprimia o lado da audácia. E esse ser humano passou a viver uma guerra interior consigo mesmo, quando todos nós sabemos que temos esses dois lados. O ideal é haver um equilíbrio e tanto “Simon” quanto “James” serem igualmente importantes. Mas não era o que acontecia no filme. Simon queria acabar com James e, com isso, sua vida implodia, afetando inclusive aqueles que estavam à sua volta, como a mocinha por quem Simon se apaixonara, Hannah (interpretada por Mia Wasikowska). As investidas de Simon contra James refletiam no próprio Simon. Um caso para psicanálise. Já imaginou você lutar contra você mesmo dentro de você? Complicado, hein?

“O Duplo” não é um filme que empolgue muito, mas, por sua natureza intrigante, merece uma visitinha sua. Só não brigue com o seu outro eu se ele não concordar com a sua opinião a respeito do filme...

Cartaz do filme


Simon, Insegurança sobre si mesmo afeta relacionamento com Hannah


James aparece para atormentar Simon ainda mais...


Apesar de suas limitações, Simon luta por seu amor


Voyeurismo também faz parte do filme..



sábado, 28 de março de 2015

Resenha de Filme - O Duelo

O Duelo. Um Garganta Bem Amado.
Uma deliciosa co-produção brasileira e portuguesa de 2012, somente presente agora em nossas telas. O filme “O Duelo” já tem a virtude inicial de ser inspirado numa história de Jorge Amado. E, para coroar o filme, temos as excelentes presenças de Claudia Raia, Patricia Pillar, todas sempre lindas e elegantes, nosso memorável José Wilker e, para a cereja do bolo, o “popstar” português Joaquim de Almeida, ator de primeiríssima categoria. O filme começa com a chegada do comandante português Vasco Moscoso de Aragão (interpretado por Almeida) a pequena cidade litorânea chamada Peri-Peri. Lá, o comandante chama a atenção da população local, com quem estabelece laços de amizade e começa a contar mirabolantes histórias, prendendo a atenção de todos. A personalidade magnética do comandante logo cativa a cidade e ele passa a ser o principal assunto de lá. Mas um morador, Chico Pacheco (interpretado por Wilker) chega à cidadezinha depois de uma temporada fora. Pacheco era o homem mais admirado da cidade até a chegada do comandante e, obviamente, não gostará da popularidade do novo forasteiro. Pacheco então começa a por em dúvida a veracidade das histórias do comandante, chegando a fazer uma investigação da vida dele e expô-la para todos. Alguns acreditarão na versão de Pacheco, outros não. E aí o filme se desenrola em várias situações, onde a vida do comandante é descortinada e a força das circunstâncias leva a história a lances completamente inesperados.
Seja o comandante um garganta de marca maior ou não, ele nunca perde a pose. Ele até chega a passar uns maus bocados durante o filme, mas não perde de jeito nenhum a simpatia e é um personagem altamente cativante. Tudo isso porque temos um virtuose do porte de Joaquim de Almeida para o papel. Só isso já faz a gente ir ao cinema. É o tipo do ator que nos faz deslocarmos de nossas casas para podermos apreciar seu talento nas grandes telas. E foi muito instigante podermos testemunhar Almeida contracenando com José Wilker, cujo personagem Pacheco sempre desafiava o comandante a provar que ele já havia entrado num navio. Ou vermos Almeida contracenando com atrizes do porte e da beleza de uma Claudia Raia ou Patrícia Pillar. A coisa ficou tomada por todo um clima de alta elegância, onde os efeitos especiais em fundo azul, apesar de artificiais, davam um tom de beleza, algumas vezes a la Titanic, já que, dentre as muitas histórias do comandante, até desvios de icebergs eram mencionados.
Se nosso Vasco Moscoso Aragão era comandante ou um grande mentiroso? Isso fica para o filme. Nada de spoiler aqui. O que vale mesmo é a simpatia do personagem, para quem torcemos, independente de seu caráter.

Portanto, se você quer ver uma história bem escrita (não é todo dia que vemos um texto de Jorge Amado no cinema), com a presença de bons atores e boas interpretações, vale a pena dar uma conferida nesse filme simpático que já deveria ter estreado no cinema há mais tempo. É lamentável que uma película brasileira de 2012 só tenha espaço em nossas telonas agora.


Cartaz do filme


Wilker e Almeida juntos!!!!


A chegada do comandante


Um povo impressionado com as histórias do forasteiro


Mas Pacheco quer desvendar quem foi esse comandante...


Claudia Raia, em papéis camaleônicos


Marcio Garcia também atua no filme


Nas filmagens...



sexta-feira, 27 de março de 2015

Resenha de Filme - Insurgente

Insurgente. A Continuação De Uma Guerra Anunciada.
E chegamos à continuação da série “Divergente”. O filme “Insurgente” mostrará a guerra entre a facção erudita, que havia tomado o poder da facção dos abnegados e um grupo de revoltosos que inclui divergentes e os sem facção. Só para lembrarmos, no futuro a humanidade havia sido dividida em cinco facções, cada uma com sua função específica: os eruditos, os abnegados, os amigos, os sinceros e os audazes. O poder estava nas mãos dos abnegados, altruístas por excelência, preocupados em ajudar as pessoas, servindo-as como funcionários públicos. Desde já fica claro que os abnegados são a alegoria do regime democrático. Os eruditos são homens de ciência, preocupados em desenvolver as tecnologias. Os sinceros defendem a verdade e as leis. Os amigos defendem a fraternidade entre as pessoas e os audazes são os corajosos que exercem a função de polícia. Os eruditos tomaram o poder dos abnegados usando os audazes que foram sugestionados por substâncias químicas introjetadas neles pelos eruditos a tomar o poder com violência. Os divergentes são uma pedra no caminho da líder dos eruditos, Jeanine (interpretada por Kate Winslet), pois possuem vontade própria e não podem ser dominados. Nossa protagonista é Tris (interpretada por Shailene Woodley), que é 100% divergente. Há uma caixa deixada pelos antepassados humanos que criaram essas cinco facções, cujo conteúdo explicaria qual seria o melhor rumo que a humanidade deveria tomar. Os antepassados cercaram as cinco facções com um muro intransponível por 200 anos. A caixa tinha cinco lados, com cada lado tendo a marca de uma facção e ela só seria aberta se um divergente conseguisse passar por simulações de computador que espelhavam situações de todas as cinco facções. Na busca pela mensagem da caixa, Jeanine, com seu sonho de um futuro melhor, caçava divergentes para passar pelas simulações que levavam muitos deles à morte. Somente Tris, uma divergente 100%, sobreviveria às cinco simulações. Assim, os eruditos reprimiam com violência a aliança insurgente criada entre os divergentes e os sem-facção e, ao mesmo tempo, buscavam o divergente ideal para fazer as simulações e descobrir o segredo contido na caixa. E a aliança insurgente buscava arregimentar as facções para o seu lado.
Ufa, pode parecer algo enrolado, mas isso é o menos importante, já que esses filmes inspirados em best-sellers adolescentes estão mais preocupados com cenas de ação, tiroteios, pancadarias e efeitos especiais. Esse segundo filme pareceu menos empolgante que o primeiro, onde víamos toda a cosmogonia da coisa, a construção da trama. Nessa sequência, vemos mais as cenas de luta e de ação. De qualquer forma, ainda é inquietante ver os eruditos, os detentores do grande conhecimento científico, como os vilões da história, nos remetendo a uma herança positivista. O elenco também ficou mais restrito às carinhas novas. Ashley Judd, a mãe de Tris, teve apenas uma pequena participação. Kate Winslet estava magnífica mais uma vez, interpretando uma boa vilã. Naomi Watts fez a líder dos sem-facção, sendo também a mãe da paixão de Tris, Quatro (interpretado por Theo James). Ansel Elgort faz o irmão de Tris, Caleb, um erudito que passou para o lado de Jeanine (seria culpa das estrelas?). Coube à Shailene Woodley tomar as rédeas da trama, mas ela ainda está em início de carreira sendo, na minha opinião, um fardo muito grande em carregar todo esse filme nas costas. Creio que um ator medalhão mais velho entre os insurgentes ajudaria um pouco mais a história. Octavia Spencer trabalhou como líder dos abnegados, mas muito pouco.
A trama da série “Divergente” não é algo original, pois a história bebe em várias fontes. A primeira delas é a noção de estado autoritário que reprime totalmente a individualidade das pessoas, sendo o estado nazista talvez um dos melhores exemplos. A divisão da sociedade em facções com funções estritamente definidas remete a esse estado autoritário, presente de certa forma, desde “A República”, de Platão, passando pelas sociedades de Antigo Regime, indo até as ditaduras com culto à personalidade do século XX. A repulsa à vontade individual fica clara no discurso de Jeanine, que a culpa pela provocação da guerra. Assim, a sociedade de facções é uma “nova sociedade” platônica, onde cada indivíduo cumpre sua função. O discurso de um Estado autoritário que deve reprimir a ambição e vontade humanas também é visto no “Leviatã”, de Thomas Hobbes, um dos teóricos do absolutismo. Quanto às facções propriamente ditas, já mencionamos que os abnegados são a alegoria da democracia. Quanto aos audazes, fica bem clara a sua posição militarista, altamente sedutora (Tris admirava os audazes desde pequena!), como eram as sociedades fascistas que atraíam a população com seu discurso ultranacionalista e vigoroso no que se tange ao uso de força bruta para resolver situações de crise. Os eruditos, por sua vez, têm também um quê autoritário que remete a uma ideologia positivista, que prega a ideia de que os mais capacitados intelectualmente devem assumir os governos, evitando que pessoas ignorantes do povo assumam altos cargos. Como a democracia possibilita que qualquer pessoa possa subir ao poder, os positivistas têm uma pecha altamente antidemocrática.

Apesar de ser menos interessante que “Divergente”, “Insurgente” prende a atenção e é um entretenimento razoável, dando um gancho para a continuação. Mas parece que a história meio que esgotou o fôlego. Nesse quesito, o “meio-irmão” de “Divergente”, “Jogos Vorazes”, tem mais força, pois já vai para o quarto filme e tem uma trama mais vibrante. Realmente o fim de cada filme nos deixa com vontade de ver o próximo. Mas vamos esperar a sequência da série “Divergente” para podermos avaliar melhor. Por ora, deem uma conferida em “Insurgente” para não perderem o fio da meada...

Cartaz do filme


Tris, uma divergente 100%. Essa não concorda com ninguém!!!


Quatro, achacado por um audaz, é o braço direito de Tris e algo mais...


Jeanine não medirá esforços em sua busca por um "mundo melhor".


Tris e as simulações.


Caleb, do lado de Jeanine. Culpa das estrelas???




terça-feira, 24 de março de 2015

Resenha de Filme - 118 Dias

118 Dias. Pintando Um Cárcere Com As Cores Da Liberdade.
Mais um excelente filme nas telonas. E, mais uma vez, baseado numa história real. “118 Dias” tem o grande mérito de enfocar o processo eleitoral no... Irã. Um jornalista nascido no Irã, mas radicado no Canadá, Maziar Bahari (interpretado pelo sempre ótimo Gael Garcia Bernal), da “Newsweek”, foi enviado para Teerã com o objetivo de cobrir a eleição para presidente em 2009, onde o candidato de oposição tinha chances reais de vitória. Mas a situação venceu o pleito. Enfurecida, a população começou uma série de manifestações de rua reprimidas violentamente pelas forças de segurança, onde pessoas foram mortas a tiros. Nosso Maziar filmou tudo. Mas o regime opressor do Irã tem câmaras instaladas pelas ruas e flagrou Maziar filmando. Isso foi o pretexto para levar o jornalista para a prisão, que não entendia o motivo do encarceramento. Os policiais da prisão o haviam acusado de espionagem, pois ele havia gravado uma participação num programa humorístico americano onde é entrevistado por um suposto espião da CIA. Assim, os policiais o obrigaram a gravar uma confissão se declarando espião e estando arrependido de todos os seus “erros”. Boa parte do filme se passa dentro da prisão no período de 118 dias de encarceramento de Maziar, com os interrogatórios e torturas praticados pelo policial Javadi (numa ótima interpretação de Kim Bodnia). Uma guerra de nervos para ninguém botar defeito.
A película é muito boa por vários motivos. Os diálogos entre o policial que interroga e tortura e o preso que é interrogado e torturado são primorosos. O chefe de Javadi já havia o alertado para o caso de que o jornalista não deveria ser tratado com excessiva violência, pois ele é uma pessoa inteligente e a técnica de persuasão deve ser feita na argumentação e pressão psicológica. Maziar já tinha perdido o pai e sua irmã, comunistas de carteirinha, com a última sendo uma espécie de mentora intelectual do jornalista, que havia lhe apresentado muitos filmes de arte e músicas em sua infância. Durante a reclusão, vemos diálogos muito interessantes entre Maziar e seu pai, assim como sua irmã, onde as lembranças e os modos de ser dos entes queridos o ajudaram a enfrentar todas aquelas arbitrariedades. O filme também mostra como Maziar conseguiu transformar o tormento da prisão numa chance de liberdade, sobretudo quando ele sabe que há uma pressão da comunidade internacional para libertá-lo, algo que aconteceu posteriormente. O mais lamentável é que seus amigos próximos e que estavam engajados na campanha do candidato de oposição continuam presos e hoje Maziar busca formas de libertar essas pessoas sem voz na mídia.

Assim, “118 Dias” é mais uma história baseada em fatos reais que se encaixa no cinema de reflexão e de denúncia. As imagens da tela ficam mais legitimadas com fotos reais dos pais e irmã de Maziar. Mais um filme fundamental, que mostra como a luta pela democracia ainda é algo que deve ser visto com muita atenção, ainda mais num país do porte do Irã, que depois da radicalização promovida pela Revolução Islâmica (talvez não sem motivos para isso, mas ainda sim uma radicalização), viveu períodos de abertura moderada, mas que novamente se fechou em virtude da estrutura do Estado Teocrático. O processo eleitoral turbulento é a prova de que o país ainda precisa amadurecer, absorvendo a democracia, mas não se esquecendo de suas tradições. Apesar de um autoritarismo, demonizar a Revolução Islâmica parece uma explicação simples demais para tão complexo contexto. Reflexões à parte, “118 Dias” é um filme em que a presença dos cinéfilos e dos amantes de bons filmes é obrigatória.

 
Cartaz do filme


Maziar. Reencontrando-se com a mãe antes de começar seu trabalho em Teerã.

Maziar. Locomovendo-se de forma precária para fazer seu trabalho.


Maziar. Mostrando a verdade da violência policial no Irã.


Já na prisão, sendo constantemente vendado e interrogado por Javadi.


Muita pressão psicológica...


... e, às vezes, a coisa ficava meio violenta...


A irmã de Maziar foi interpretada pela estonteante Golsditeh Farahani.




segunda-feira, 23 de março de 2015

Resenha de Filme - Golpe Duplo

Golpe Duplo. Punguistas, Mutretas e Rodrigo Santoro.
Uma pequena curiosidade nas telas. O filme “Golpe Duplo” nos dá a oportunidade de presenciarmos Will Smith e Rodrigo Santoro contracenando juntos. O filme não é lá essas coisas, mas agora podemos ver o ator brasileiro fazendo o grande vilão do filme. Vocês irão logo me alertar do Xerxes, de “300”, mas, convenhamos, esse filme não conta, pois tivemos um Santoro todo tratado digitalmente. Aqui em “Golpe Duplo”, o que vale é o seu talento. Mas nosso ator apareceu pouco e teve uma atuação que oscilava entre o contido e explosões emocionais. Talvez tenha sido dado um papel muito estereotipado a ele, ou seja, um vilão latino mal e temido toda a vida. Uma pena, pois a carreira de Santoro no exterior já mostrou resultados bem melhores. Obstáculos que um ator brasileiro tem que passar para fazer seu nome em Hollywood.
Mas, e o filme em si? Vemos aqui a história de Nicky (interpretado por Smith), um vigarista de marca maior que faz parte de uma extensa equipe de punguistas, daqueles que praticam pequenos roubos batendo carteiras ou tirando anéis e relógios de suas vítimas. Tudo feito de uma forma muito coordenada que beira o artístico. Nicky irá  conhecer outra vigarista, Jess (interpretada pela bela loura Margot Robbie), que tenta em vão aplicar um golpe no experiente vigarista. Ao descobrir todos os talentos de Nicky, Jess implora para entrar no grupo, sendo acolhida por Nicky. Após uma série de mutretas em New Orleans, Nicky dá o bilhete azul para Jess e a despacha para o aeroporto. Três anos passam e agora estamos em Buenos Aires, onde um chefe de equipe de automobilismo, Garriga (interpretado por Santoro), contrata Nicky para simular uma venda de um plano secreto de combustível para as equipes rivais. Mas Jess aparecerá como amante de Garriga, o que vai colocar a cabeça de Nicky num baita curto-circuito.
A grande atração da película é toda uma série de tramoias que os punguistas aplicam para tirar vantagem dos outros. As cenas de pequenos roubos são bem coreografadas. Will Smith é sempre uma boa presença. Mas a trama realmente não decola. O affair entre Nicky e Jess torna a coisa até um tanto enjoativa. Uma ceninha de amasso entre os dois aqui e ali, Nicky atrás de Jess em Buenos Aires o tempo todo. E a coisa se repetia, repetia. Pelo trailer parece que será um filme com um pouco mais de ação. Na primeira metade da película, a coisa estava até interessante. Mas a parte de Buenos Aires ficou muito enfadonha. Um estereótipo desgraçado com imagens da capital argentina com fundo musical de salsa, algo imperdoável para o mundo globalizado de hoje. Entretanto, e para quem gosta, as cenas de diálogos entre Garriga e Nicky num suposto autódromo de Buenos Aires, tendo carros reais de Fórmula Indy passando ao fundo, ficaram muito legais. Mas o filme realmente não tem grandes atrativos.

Assim, a única curiosidade de “Golpe Duplo” fica em mais um degrau escalado por Santoro em sua carreira internacional no cinema, embora nosso ator já tenha interpretado papéis melhores. Um bom programa apenas para fãs incondicionais de Smith e Santoro.

Cartaz do Filme


Nicky e Jess. Misturando amor e negócios.


Garriga. Vilão estereotipado.


Mutretas e apostas arriscadas...


Jess e Garriga juntos deixam Nicky louco


Nas coletivas de imprensa da vida


Smith, todo "carinhoso" com Santoro...



domingo, 22 de março de 2015

Resenha de Filme - Mapas Para As Estrelas

Mapas Para As Estrelas. O Lado Trágico Do “Star System”.
Uma excelente película dirigida por David Cronenberg. “Mapas Para as Estrelas” é um filme que faz um bom exercício de reflexão sobre as mazelas do “star system” americano. É um filme para quem tem estômago forte, pois ele é de uma crueza terrível. Uma história em que todos são vítimas e culpados. Uma história em que todos surtam. Não, mais do que isso. Todos enlouquecem mesmo.
A trama inicia com a jovem Agatha (interpretada por Mia Wasikowska), uma moça repleta de marcas de queimadura pelo corpo, chegando a Hollywood e sendo recebida por um motorista de uma empresa que aluga limusines, Jerome (interpretado pelo “vampiro” Robert Pattinson). Os dois estabelecem uma amizade e a moça conta que conhece a atriz Carrie Fisher (nossa amada princesa Leia, que faz uma ponta) pelo twitter e que a indicou para trabalhar como assistente de uma atriz decadente, Havana Segrand (interpretada por Julianne Moore), que lutava arduamente para ter o papel principal no “remake” de um filme estrelado por sua mãe na década de 1960. Por outro lado, havia o ator adolescente Benji Weiss (interpretado por Evan Bird), um mala sem alça extremamente arrogante e mimado pelos pais, que são um apresentador de programas de auto-ajuda, Dr. Stafford Weiss (interpretado pelo sempre ótimo John Cusack) e Christina Weiss (interpretada por Olivia Williams). O menino estava sob os olhos da produtora em virtude de seu vício por remédios. Aliás, ser viciado em remédios parecia ser uma espécie de lugar comum para todos. Não houvesse quem não tomasse suas pílulas. Em alguns casos, como os de Havana e Benji, eles tinham alucinações. Havana via a sua mãe, desvalorizando-a e lembrando dos abusos sexuais que ela sofreu na infância feitos pelo namorado da mãe. E Benji via uma menina morta que ele visitou no hospital e era fã dele, para quem falou uma série de mentiras.
Essa breve sinopse, que não será estendida aqui por conta dos “spoilers”, já nos dá uma noção de como o filme é muito barra pesada. Mas o que foi dito aqui é apenas a ponta do “iceberg”. Temas muito mais pesados aparecem, onde a desgraça alheia pode ser a sua felicidade, o incesto é recorrente e práticas piromaníacas não são uma exceção. É uma película extremamente agressiva, onde parece que a grande maioria dos personagens perde o controle totalmente. A busca pela fama e riqueza provocam extremo sofrimento, desagregação familiar, fortes vícios, alucinações e comportamentos para lá de violentos. Não há qualquer alegria, somente um estado letárgico alternado por momentos de extrema agonia. Tudo isso faz com que o filme seja muito bom, já que ele tem a coragem de denunciar algo espinhoso que sabemos que existe no showbiz, mas não é muito contado por aí (a menos que renda vendas para revistas de fofoca, que só se interessam pelo escândalo de forma superficial). As pressões que a fama impõe, onde fica bem claro que o glamour é algo totalmente efêmero e há uma luta atroz para se manter no topo, a ponto de um adolescente tentar estrangular uma criança por causa disso, aparecem de jeito altamente contundente. Todos estão submetidos a um “star system” que estraçalha corações e mentes. E a gente se pergunta: até que ponto valem a pena a fama e a riqueza se sua vida está destruída? Mansões cobertas com luxos de todo tipo servindo a almas dilaceradas...

Assim, “Mapas Para as Estrelas” é uma película que merece ser vista e que realmente denuncia situações extremas na indústria de entretenimento dos Estados Unidos. Um filme interpretado por bons atores que fala das mazelas que alguns atores despreparados para a pressão podem passar. Um filme essencial...

Cartaz do Filme.


 
Agatha. Luvas que escondem marcas de queimaduras...


Jerome. Aspirante a ator e roteirista, além de motorista de limusines


Havana. Atriz decadente e atormentada...


Benji, um pirralho insuportável



Stafford. Programas de auto-ajuda...


Insanidade à flor da pele.


O excelente diretor David Cronenberg