terça-feira, 25 de agosto de 2015

Resenha de Filme - Numa Escola de Havana

Numa Escola de Havana. Como Lá, Como Aqui?
Mais uma interessante produção cubana chega à nossas telas. “Numa Escola de Havana” é mais um filme que questiona o regime cubano, usando agora como pano de fundo o ambiente escolar. Ou seja, mais um filme que aborda o “sacerdócio” do ofício de professor, para alguns, ou apenas uma profissão que deve ser vista como tal para outros. Ainda assim, é uma interessante radiografia da sociedade cubana de hoje, mesmo que haja uma constelação de licenças poéticas, como sempre ocorre no cinema.
Vemos aqui a história da professora Carmela (interpretada por Alina Rodriguez), uma veterana em sua profissão, muito respeitada por todos, sendo que, inclusive, ela ajudou na formação de alguns de seus colegas de profissão mais jovens. Ela tem um neto doente e vai visitá-lo no hospital, que fica num bairro distante de sua casa e da escola onde ela trabalha. De volta para sua casa depois da visita, ela é acometida de um enfarte e é substituída por uma professora mais nova, para desespero do jovem aluno Chala (interpretado por Armando Valdes Freire), um menino problema típico e que somente respeita Carmela. Com a velha professora fora de combate, o menino se envolve em sérios problemas de disciplina e vai para uma escola que é uma espécie de pequeno reformatório para alunos delinquentes. Quando Carmela volta à ativa, ela não se conforma com a situação de Chala e o retira do tal reformatório, trazendo-o de volta para a antiga escola e tomando conta do menino. Obviamente, as instâncias educacionais superiores não vão se conformar com essa atitude independente de Carmela, mas há todo o problema dela ser uma excelente profissional com muitos anos de carreira e puxar seu tapete não será uma coisa fácil.
É um filme comovente sobre a professora militante e seu aluno “caso perdido” que ela vai recuperar com afetuosidade e amor, mas algo completamente inverossímil para o mundo real. Quem é profissional da área sabe que é uma tremenda furada querer fazer o papel de pai e mãe de aluno. Misturar emocional com profissional numa carreira como a de professor pode (e muito provavelmente será) fatal para o docente. Carmela é o exemplo do que não se pode fazer numa profissão como essa, apesar de todo o romantismo da coisa, que o cinema, graças aos céus, ainda nos permite tal devaneio.
Mas a película não é apenas uma licença poética sobre o ofício de professor. A situação de rebeldia de Chala também é analisada e ela é bem concordante com o que vemos na vida real. Boa parte da indisciplina dos alunos vem de uma desestruturação familiar latente, que era justamente o caso de nosso aluno protagonista, que tinha uma mãe prostituta e drogada, onde o filho mais sustentava a progenitora do que o contrário. O menino, inclusive tinha um ofício que desperta mais uma reflexão. Ele cuidava de cachorros para rinhas. E uma menina pela qual ele estava apaixonado não queria nada com ele justamente por seu ofício, o que faz Chala repensar novas formas de se ganhar dinheiro. À propósito, a menininha por quem Chala estava apaixonado, Yeni (interpretada por Amaly Junco), é outra personagem curiosa, já que ela não podia ter uma matrícula regularizada, pois seu pai era de outra região de Cuba e, pelas regras, ele vivia “ilegalmente” na região de Havana. Chala tinha outro amiguinho cujo pai estava na cadeia por ser opositor do regime. Esses elementos, mais alguns outros que eu não direi aqui (chega de “spoilers”!) nos mostram as críticas que os cineastas cubanos parecem que agora podem fazer ao regime, como já tínhamos visto no filme “Retorno à Ítaca”, recentemente resenhado aqui.

Dessa forma, “Numa Escola de Havana” é mais um filme que nos dá a oportunidade de ter uma ideia do que ocorre na Cuba contemporânea e que tem mais liberdade de criticar os procedimentos do governo para com a sociedade. Um filme comovente, mas reflexivo.

Cartaz do filme

Chala e a mãe. Menino problema

Carmela e o "sacerdócio"...

Autoridades não aceitam o comportamento de Carmela

Chala cria pombos e cachorros para sobreviver...


Um comentário:

  1. Não se trata de um filme que se propõe a questionar o regime cubano. Muito simplista a definição introdutória, para não dizer outras coisas. O filme traduz a relação de ensino e aprendizagem para a vida. Questão preponderante e universal. Não considero inverossímil ou "uma furada" ou simplesmente poética a relação da Professora com o mundo de seus alunos (que é também o seu mundo). Assertiva dessa natureza transparece visão medíocre da ação educadora. Tal abordagem do filme poderia ser replicada em qualquer lugar do mundo. Algo um pouco mais profundo e distante, talvez inalcançável à compreensão do nobre resenhista.

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