sábado, 4 de julho de 2015

Resenha de Filme - Muitos Homens Num Só

Muitos Homens Num Só. Uma Bela Trama Policial Inspirada Na Obra De João Do Rio.
Mais um bom filme brasileiro em nossas telas. E o melhor, uma película de época. Produzido em 2013, “Muitos Homens Num Só” é um filme cheio de virtudes. E qual é a melhor delas? O roteiro é inspirado numa história real contada por ninguém menos que João do Rio, pseudônimo de Paulo Barreto, um dos grandes escritores brasileiros do início do século passado. Para quem não conhece, eu recomendo que procure nas livrarias o ótimo “A Alma Encantadora das Ruas”, onde ele faz uma excelente radiografia da cidade do Rio de Janeiro nas primeiras décadas do século 20. Sua escrita sobre a cidade é minuciosa e deliciosa. Infelizmente, ele não se tornou imortal da Academia Brasileira de Letras como tanto queria, pois ele tinha “defeitos” considerados muito graves para a época: João do Rio era mulato, homossexual e muito gordo (ele morreu de ataque cardíaco dentro de um táxi em 1920, com apenas quarenta anos). Mas seus textos ficaram e são muito recomendáveis para os amantes do Rio de Janeiro, sua história e, principalmente, para os amantes da literatura e daqueles que gostam de um texto bem escrito.
Mas voltemos ao filme. Ele conta a história de Arthur (interpretado por Vladmir Brichta), um ladrão de hotéis, que tinha a especialidade de entrar nos quartos dos hóspedes e furtar objetos de valor. Ele usava uma identidade secreta, a de Dr. Antônio, e era famoso na época, sendo destaque nas primeiras páginas dos jornais, enlouquecendo a polícia, especialmente um tal de Félix Pacheco (interpretado por Caio Blat), que era um estudioso da identificação humana, primeiro tentando a antropometria, uma ciência conhecida por medir as dimensões do corpo humano, principalmente as do crânio e maxilar, que davam informações sobre a propensão que o indivíduo teria para o crime, dependendo do tamanho do crânio e do maxilar. Obviamente, os mais “propensos” ao crime eram os negros e mestiços.
Voltemos ao “Dr. Antônio”. Ele vai ter que roubar as ações de um “distinto” barão (interpretado por Miele) para ajudar Vellez (interpretado por Cesar Troncoso), um amigo seu que foi uma espécie de mentor para a sua vida de crimes, e que está com sua vida ameaçada por dívidas de jogo. Ao mesmo tempo, nosso falso médico se envolve com Eva (interpretada por Alice Braga), a mulher de um rico empresário que não liga muito para ela. E, nesse meio tempo, temos um texto e uma trama envolventes, que somente aqueles que já leram alguma coisa de João do Rio podem identificar.
As locações do filme se passam principalmente no centro do Rio, mas também em outros belos locais como a Praia Vermelha. Foi legal ver a estação do Pão de Açúcar e os bondinhos, assim como os prédios da Urca apagados no photoshop. No mais, boas intepretações de Vladimir Brichta e de Alice Braga, belíssima por sinal, com as roupas e penteados de época.
As homenagens a João do Rio estavam por toda a parte. Quando o “Dr. Antônio” (ou Dr, Guedes, realmente são muitos homens num só!) visita, junto com ela, o Real Gabinete Português de Leitura, podemos vislumbrar uma enorme placa homenageando Paulo Barreto. Há, também, um amigo de Félix Pacheco, um jornalista negro e levemente efeminado de nome Barreto (interpretado por Silvio Guindane), que muito simpatiza com a figura do ladrão, já que o jornalista o acha “muito inteligente”.

Como foi dito acima, essa história foi real e João do Rio escreveu sobre a vida desse ladrão num jornal da época em vários capítulos diários. Fazer um filme sobre essa história e sobre esses textos de João do Rio foi uma escolha extremamente feliz, pois quem leu esse autor sabe que seus textos são extremamente cinematográficos, já que seu detalhismo nos ajuda na nossa construção e visualização mental daquilo que lemos. Esse grande escritor já merecia ter sido resgatado e homenageado faz tempo. E esse filme finalmente faz isso, e da forma mais singela e digna possível, que é se prendendo ao texto de Paulo Barreto, o João do Rio, uma grande joia esquecida de nossa literatura, e que deve sempre ser celebrada. Méritos para a diretora Mini Kerti. Não deixem de prestigiar “Muitos Homens Num Só”.

Cartaz do filme

Dr. Antônio, o ladrão...

Vellez, um amigo...

Conhecendo um casal

Ela gosta de desenhar...

Especulando sobre a vida dos transeuntes. João do Rio puro...

Logo se tornam amigos...

Belas cenas na praia...

Félix Pacheco e a antropometria...

Cadê o bondinho???

João do Rio homenageado...




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