segunda-feira, 12 de maio de 2014

Resenha de Filme - Pelo Malo

Pelo Malo. O Cabelo É Que É Ruim?
Um filme venezuelano bom, mas com uma dose inquietante de crueldade. Essa é a impressão de “Pelo Malo”, de Mariana Rondón, um filme que tem como pano de fundo a Venezuela pobre e miserável de Hugo Chavez à época de seu tratamento contra o câncer que acabou vitimando o líder latino. Mas essa não é a característica mais marcante do filme.
Vemos aqui a história de Júnior (interpretado por Samuel Zambrano) que vive num conjunto habitacional paupérrimo com a mãe, Marta (interpretada por Samantha Castillo) e seu irmão caçula, ainda bebê. Junto com uma amiguinha, Júnior passa os últimos dias de férias e tem a preocupação de fazer uma foto 3X4 para a escola. Sua rechonchuda colega também quer fazer uma foto de corpo inteiro vestida de Miss Venezuela, enquanto que Júnior quer tirar uma foto como um astro da música, mas com seus cabelos totalmente alisados. O problema é que Júnior tem os cabelos altamente crespos e ele fará de tudo para alisá-los, o que desperta a revolta da mãe, que começa a pôr em dúvida a heterossexualidade do garoto, que não teve uma figura paterna em sua vida. Trabalhando numa firma de segurança, a bela Marta é uma pessoa muito dura, consequência de ter sido muito maltratada pela vida, o que provoca muito sofrimento em Júnior. Para piorar a situação, seu temperamento forte quase a faz perder o emprego e Marta é obrigada a se entregar para o patrão em troca da suspensão da demissão. Ela também tem relacionamentos sexuais com outros homens do imenso conjunto habitacional. A repressão da mãe de Júnior pode ser vista como uma alegoria da ditadura de Chavez, pois se o garoto quer alisar os cabelos, as imagens que apareciam da Venezuela nos programas de televisão eram de justamente as pessoas raspando os cabelos, para ficarem fisicamente semelhantes ao comandante, que passava pela quimio e radioterapia. Crimes bárbaros feitos supostamente para o governante também eram relatados, tais como o caso do marido que esquartejou a mulher para Chavez. Como Marta não tinha com quem deixar os filhos, ela acabou deixando-os com a avó, que viajou na ideia de Júnior, alisando seu cabelo e preparando uma roupa de roqueiro para ele. Mas a homofobia de Marta também já estava introjetada em Júnior, que achou que a avó queria lhe colocar um vestido e acaba se afastando dela. Ao fim das contas, Júnior não consegue fazer sua foto, vê a sua coleguinha fazendo a foto de miss e, para não ser expulso de casa pela mãe e viver com a sua avô, é obrigado a raspar a cabeça. O filme termina com o menino cantando o hino da Venezuela no primeiro dia de aula, com a cabeça raspada. Emblemático. O menino sucumbe à ditadura materna, assim como o povo da Venezuela sucumbe à ditadura do governo. Alegorias da repressão.

Assim, “Pelo Malo” nos mostra a cartilha de como se destruir um sonho infantil com a intolerância adulta. Nos mostra como um drama pessoal é um reflexo de uma situação de dimensões sociais.

Cartaz do Filme

 Marta, mãe opressora.


Com a avó, que embarca no sonho do neto.



Alisando as madeixas.


Com a coleguinha, brincando de ver as vidas alheias nas incontáveis janelas da miséria.

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