quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Resenha de Filme - Contos de Nova York

Contos De Nova York. Exercício De Gênios.
Ah, como é bom você ver o “Corujão” de vez em quando! É um dos poucos lugares da TV aberta onde ainda se podem ver bons filmes. Por que será que fazem isso, quero dizer, passam os filmes bons só de madrugada? É para o povão não ter acesso? Eu tive esses dias, a oportunidade de rever no “Corujão” uma joia cinematográfica. Imagine você ter, em apenas um filme, todo o talento de mestres como Martin Scorsese, Francis Ford Coppola e Woody Allen. Esse filme existe, meu caro leitor, e é “Contos de Nova York”, produzido em 1989. São três pequenas histórias que se passam na grande cidade americana. Na primeira história, “Lições de Vida”, dirigida por Scorsese, vemos a vida de um artista plástico, Lionel Dobie (interpretado por Nick Nolte). O homem é um gênio, mas passa por uma crise criativa. Ele precisa entregar um trabalho em três semanas, mas não consegue terminá-lo. O homem de meia idade vai buscar no aeroporto sua assistente (e amante) Paulette (interpretada por Rosanna Arquette), contra a vontade dela, pois o relacionamento do casal já está numa crise profunda. O artista tenta de todas as formas manter a moça perto dele, de forma obsessiva, o que enlouquece Paulette. Mesmo assim, ela não abandona o artista, pois quer saber qual é a opinião dele sobre os quadros que ela pinta. Obviamente, Lionel não lhe dá uma resposta definitiva para manter a moça por perto. É um relacionamento totalmente doentio. Lionel se comporta de forma simultaneamente sufocante e depreciativa, oprimindo a menina e se humilhando perante ela ao mesmo tempo. O mais curioso é que, enquanto o artista vivencia essa crise com Paulette, ele consegue levar a pintura adiante, como se seu processo criativo dependesse daquela crise emocional toda. O desfecho para essa história é inevitável: Paulette abandona Lionel depois de colocá-lo numa situação humilhante na rua perante dois policiais e ainda provocá-lo seminua em casa. O filme termina com Lionel no evento onde sua obra é exposta, quando uma nova mocinha, aspirante a artista e admiradora, começa uma conversa com ele. Novo relacionamento doentio à vista...
A segunda história, “Vida sem Zoe”, de Coppola, fala de uma menininha rica, Zoe (interpretada por Heather McComb), que vive sozinha num quarto de hotel cinco estrelas. Seus pais são muito ocupados e raramente estão em casa (o pai é Claudio, interpretado pelo ótimo Giancarlo Gianini e a mãe é Charlotte, interpretada pela também excelente Talia Shire a mulher do Rocky, do Stallone, lembram?). A garota é tratada como uma princesinha pelos funcionários do hotel, sendo totalmente paparicada. Ela vai para uma escola de mauricinhos e patricinhas (no ônibus escolar, é bom frisar, embora ela pegue um táxi quando perde o ônibus) e lá conhece todo o tipo de filhinhos de gente muito, muito rica, inclusive membros de famílias reais árabes.  Num assalto sofrido no hotel, o assaltante arrombou a caixa de dinheiro do pai de Zoe, mas deixou cair um brinco que pertencia a uma princesa árabe, parente de um de seus colegas. O brinco estava lá, pois a princesa teria tirado ele e colocado sob a guarda do pai de Zoe enquanto conversavam. Para evitar um escândalo, Zoe promove uma festa para devolver o brinco à princesa. A menina espertinha ainda conseguirá reconciliar o pai e a mãe, salvando totalmente o dia. Esse conto de fadas moderno, com uma pré-adolescente riquinha e perua, foi a história mais lúdica, embora a menina fosse muito metida a besta e mimada. Cabe o consolo aqui de que ela era muito esperta e não era malcriada, fazendo coisas louváveis como resgatar o relacionamento dos pais. Apesar de tudo, Coppola lembra o abismo social quando um mendigo morando numa caixa de papelão pega Zoe no meio da rua, pedindo alguma coisa para comer, no que ela dá alguns chocolates para ele. O mendigo fala para a menina passar no dia seguinte com mais chocolates, num tom ameaçador, e a menina diz que voltará. No dia seguinte, Zoe, num misto de medo e com o sentimento de que deve cumprir sua palavra, retorna ao mendigo e dá bastante chocolate a ele, enfatizando que cumprira o prometido. O mendigo, incrédulo, falou somente “é por isso que eu adoro esta cidade”, enfatizando o espírito solidário do nova iorquino. Essa foi a melhor sacada desse média-metragem. A história de Zoe e suas peripécias soa como uma ópera do absurdo, sendo um tanto divertida justamente por causa disso.
A terceira história, “Édipo Arrasado”, tem toda a genialidade de Woody Allen. Ela fala de um advogado bem sucedido, Sheldon (interpretado por Allen), cuja mãe judia (interpretada por Mae Questel), é altamente opressora e, ao mesmo tempo, revela todos os segredos de infância do advogado, levando Sheldon à loucura. Ele leva sua namorada, Lisa (interpretada por Mia Farrow, isso mesmo, podemos ver os dois juntos ainda, antes de toda a confusão que veio depois que Allen juntou os trapinhos com a enteada) e a mãe passa a saber que a moça tem três filhos, ficando contra o casamento dos dois. Um dia, num show de mágica, a matrona é convidada pelo mágico a participar do truque do desaparecimento na caixa. E não é que a velha some de vez? Sheldon, num primeiro momento, vai ficar desesperado, mas depois se conforma com a situação e a sua vida, que era um tormento em todos os sentidos provocado pela mãe, se torna um mar de rosas. Tudo corria muito bem até que, um dia (e de forma extremamente surreal!), a mãe de Sheldon aparece nos céus de Nova York, onde ela conta a TODA a cidade detalhes íntimos da vida do filho. Sheldon passa a ser ridicularizado por todos, como o “filhinho da mamãe”, parando até nos noticiários de TV. Isso obviamente implode seu relacionamento com Lisa. Falando com seu analista, ele recebe a sugestão de obter a ajuda de uma paranormal. Mesmo achando a ideia ridícula, pois não acredita nessas coisas, Sheldon procura a ajuda de Treva (interpretada por Julie Kavner), uma médium de araque de origem judia, que não vai conseguir ajudar o advogado e vai se debulhar em lágrimas por tê-lo decepcionado. Isso vai amolecer o coração de Sheldon e os dois irão começar um relacionamento. Ao ver que o filho tem uma nova namorada, a mãe “desce” do céu e volta à vida normal, se entendendo muito bem com a futura nora, que pensa de forma muito parecida com ela. Sheldon agora terá a presença de DUAS protetoras. Esse foi o melhor filme dos três, na minha modesta opinião. O mais ousado, pelo surrealismo da coisa, e muito engraçado também. Há uma parte em que a matrona no céu mostra as fotos de Sheldon criança para toda a cidade. E uma multidão de pais e mães faz o mesmo com as fotos de seus filhos. Muito hilário!

Dessa forma, se você ainda não viu “Contos de Nova York”, tente achar por aí, seja em lojas de DVDs especializadas, seja na internet. É um filme que vale muito a pena ser visto, pois você pode presenciar a experiência de ver três gênios em ação (Scorsese, Coppola e Allen), sem falar que há, também, a presença de um bom elenco. Só é pena que passe tão tarde no “Corujão”.


Cartaz do filme. 


Lionel. Um artista plástico atormentado.


Amor doentio entre Lionel e Paulette.


Humilhantes súplicas....


Perigosos jogos de sedução!!!


Abandonado e sozinho...


Recomeço com nova ninfetinha...


Zoé, de chapéu xadrez, entrevistando um coleguinha de escola da realeza árabe.


Zoé e seu paizão.


Zoé e funcionário do hotel, um de seus "babás" postiços.


Bom rever Woody Allen e Mia Farrow juntos. 

Mãe opressora e surreal!!!

Deprimido com a mãe...


Timaço!!!!




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