quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Resenha de Filme - O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro

O Dragão Da Maldade Contra O Santo Guerreiro. Antônio Das Mortes Se Redime.
O personagem mais curioso e inquietante dos filmes de Glauber Rocha está de volta. Antônio das Mortes reaparece em “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”. Vimos esta estranha figura em “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e sua característica mais marcante era a sua crise existencial ao cometer crimes. Matador de aluguel, Antônio das Mortes, o matador de cangaceiros sempre trabalhava para os poderosos, não deixando de cumprir com suas obrigações. Se tem que matar, que se mate, se é o que tem que se fazer, que se faça, dizia o matador. Mas sempre com uma ponta de remorso e incerteza.
E não será diferente nesse filme. Antônio das Mortes irá ao povoado de Jardim das Piranhas para verificar se ainda existem cangaceiros. Ele, que havia liquidado Corisco, falava em tom nostálgico com os moradores da cidade sobre Lampião e Corisco. Glauber, inclusive, quer mostrar que houve uma passagem do tempo, se referindo aos tempos de Getúlio Vargas como uma época antiga. Uma alusão a épocas mais recentes aparecem nas tomadas onde Antônio das Mortes anda em estradas entre caminhões. O novo e o antigo coexistem, pois há no vilarejo a figura do empresário que quer trazer a industrialização a Jardim das Piranhas (interpretado por Hugo Carvana) e a do coronel cego, que se recusa a ver os novos tempos de mudanças e ainda teima em manter o seu poder ancestral, coronel esse magnificamente interpretado por Jofre Soares. Tanto para o empresário quanto para o coronel, os últimos remanescentes do cangaço são prejudiciais, pois juntamente com a santa, a líder religiosa popular, aglutinam o povo e as suas tradições folclóricas num núcleo fora do alcance da influência dos poderosos. Assim, Antônio das Mortes entrará em ação mais uma vez, ferindo mortalmente o cangaceiro numa luta que assume todo um ritual folclórico, com direito a desafios em versos entre o assassino e o cangaceiro. Antônio das Mortes vai ferir o cangaceiro mortalmente, que agonizará por um longo tempo. Antônio chegará a pedir perdão para a santa, mas essa deixa claro que ele mesmo é que terá que encarar suas culpas e arrependimentos.
Os conflitos não se dão somente nas camadas baixas da sociedade. Vemos, também, litígios nas elites, onde o coronel é traído por sua esposa (interpretada por uma bela Odete Lara) com o empresário da cidade. Após ver o coronel (e o seu marido) ridicularizado por todos os seus jagunços, a esposa fere mortalmente o empresário. A grande redenção de Antônio das Mortes virá quando o coronel decide massacrar todo o povo servidor da santa e do cangaceiro. O matador simplesmente se virará contra os jagunços, liquidando a todos, inclusive ao coronel e a sua esposa. O filme termina com Antônio das Mortes divagando sem rumo entre os caminhões da estrada.
Mais um filme de pedagogia marxista exibindo elementos de uma cultura popular brasileira. O povo retratado como um amálgama folclórico que seguia a santa e o cangaceiro, montados em rituais e tradições populares que manifestavam continuamente. O cangaceiro e o povo violados pelas elites de ontem (o coronel) e de hoje (o empresário capitalista). Um coronel cego que se recusa a aceitar os novos tempos. Um empresário que se borra de medo do coronel. Traições, adultérios e muito derramamento de sangue. Um matador de aluguel em crise que se redime executando friamente o coronel e seus jagunços. Um anti-herói que abraça as causas do povo após aceitar sua admiração pelo cangaço e sua visão social.

Dizer que existe um elo entre “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro” não é nenhum exagero. E esse elo é justamente Antônio das Mortes, que transita do Mal dos poderosos para o Bem dos oprimidos. Assim, Antônio das Mortes é um duplo antagônico: ele tem os seus dias de dragão e os seus dias de Santo Guerreiro. Ele é o mais barroco, mais romântico, mais expressionista dos personagens de Glauber. Homem de sentimentos díspares e fala mansa, sendo mais um dos paradoxos do grande cineasta brasileiro.


Cartaz do filme


Antônio das Mortes está de volta!!!


Nostalgia com os grandes líderes cangaceiros.


 
O cangaceiro e a santa; Expressão do poder popular.


Coronel e esposa. Poder ancestral.

Luta contra o cangaceiro. Tradições folclóricas.


Um empresário assassinado.


Antônio das Mortes se volta contra os poderosos!!!!


O criador e a criatura. Quem é quem???

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