segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Resenha de Filme - MIchael Kohlhaas

Michael Kohlhaas. No Interior Da Cultura De Antigo Regime.
Um excelente filme histórico chega às telas. “Michael Kohlhaas” tem a Europa do século 16 como pano de fundo e conta com a presença do muito competente ator dinamarquês Mads Mikkelsen (“007, Cassino Royale”, “A Caça”, “O Amante da Rainha”) no papel principal. A produção do diretor Arnaud des Pallières tem a grande virtude de nos mostrar alguns aspectos da cultura do chamado “Antigo Regime”, onde o poder da nobreza feudal já havia criado os chamados governos absolutistas, com reis que tinham uma quantidade de poder absurda, sendo legitimada por Deus, segundo as religiões cristãs vigentes naquela época. Grandes fazendeiros chamados senhores feudais ou nobres eram engalanados com títulos de nobreza como barões e duques, mantendo a sociedade muito desigual e extremamente autoritária. Nosso protagonista, Michael Kohlhaas, é um pequeno proprietário numa parte da Europa supostamente de maioria protestante e fragmentada politicamente, onde cada senhor feudal é um príncipe de uma extensão menor de terra se comparada a Estados Nacionais mais consolidados na época como Portugal e Espanha. Ele cria cavalos e vende os animais. Mas, ao ter de passar pelas terras de um barão, ele precisou pagar um pedágio considerado ilegal e teve que deixar dois de seus cavalos como garantia, que foram usados em trabalho muito pesado, ficando muito sujos e machucados. Michael entrou na justiça, mas o barão mexeu os pauzinhos e tornou sua ação judicial improcedente. A mulher de Michael, Judith (interpretada por Delphine Chuillot) procurou interceder em favor do marido junto à princesa local, mas foi assassinada ao tentar chegar perto da jovem monarca. Tal atitude despertou a ira de Michael, que arregimentou um exército de camponeses e saiu fazendo justiça com as próprias mãos na região.
Como já foi dito aqui, vários aspectos da sociedade de Antigo Regime aparecem aqui neste filme. Em primeiro lugar, a injustiça da sociedade feudal, onde senhores poderosos com títulos de nobreza tratam os menos favorecidos de forma acachapante e usam a sua influência para se beneficiar em situações desfavoráveis, baseando-se numa prática clientelista muito corriqueira naquela época. O barão que prejudicou Michael usou claramente dessa prática clientelista (de troca de favores) para se defender da ação na justiça de nosso protagonista contra ele. Em segundo lugar, a questão da revolta camponesa. Embora muitos servos nos feudos não tomassem qualquer atitude contra a exploração dos senhores feudais, outros servos realmente se revoltaram, mesmo sob as advertências da Igreja de que tais levantes levariam suas almas ao inferno. A revolta de Michael é um espelho de revoltas que ocorreram no passado, mostrando que, apesar do grande poder dos senhores, havia sim um questionamento contra a autoridade deles, mostrando que a sociedade de Antigo Regime nem sempre era tão “cordial” assim. Em terceiro lugar, a excessiva religiosidade da época, que está representada no personagem de Michael, pois ele titubeia em atacar uma cidade quando um teólogo (interpretado por Denis Lavant) começa uma argumentação com nosso protagonista dos rumos da revolta e dos motivos dela. Esse teólogo irá justamente exigir que o revoltoso deponha as armas para ter a sua alma salva, um argumento muito usado contra quem pensava em se levantar contra a ordem vigente. A personagem da princesa (interpretada por Roxane Duran) é outro elemento muito interessante e curioso. Esteticamente falando, sua bela face nos lembra as pinturas de retratos de membros das dinastias europeias existentes no Museu do Prado em Madri. A princesa, ao se encontrar com Michael, também vai lembrá-lo que um líder deve não ser apenas temido, mas também deve ser amado pelo seu povo, tal como foi escrito por Maquiavel em seu livro “O Príncipe”, no capítulo 13.

Não é todo dia que o cinema produz um filme que aborde com maestria questões históricas. Mesmo que o final tenha sido inverossímil para a realidade da época, “Michael Kohlhaas” ainda é uma boa vitrine para exemplificar em algum nível como era a sociedade de Antigo Regime. É um filme contido, mas de emoções fortes. Uma película que deve ser examinada com atenção pelo espectador, sendo uma forma de entretenimento altamente inteligente.


 
Cartaz do filme


Um mercador em busca por justiça


Com a esposa Judith


Ele negocia cavalos.


Ele terá a sua esposa assassinada injustamente


E irá liderar uma revolta camponesa.


Uma princesa saída dos quadros do Museu do Prado.


A filha Lisbeth passará por uma série de provações com o pai.


Silhueta melancólica...

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