quarta-feira, 25 de junho de 2014

Resenha de Filme - O Congresso Futurista

O Congresso Futurista. Será Que Vai Acontecer Mesmo?
No Brasil, parece que existe uma máxima em termos de exibição cinematográfica. Quanto mais o filme desperta inquietações e reflexões, em menos salas ele é exibido. Não é à toa que esse aqui é exibido em apenas três salas. “O Congresso Futurista” é um filme que nos deixa muito perplexos (e até aterrorizados) quanto às perspectivas de dias futuros. E o sinal de alerta de que determinadas coisas não tão agradáveis já acontecem. Esse filme é baseado no livro de Stanislaw Lem, autor de ficção científica, filósofo e ensaísta, o mesmo autor do consagrado “Solaris”, que também foi adaptado para o cinema por Andrei Tarkovsky e ganhou o prêmio do júri em Cannes em 1972.
Mas por que “O Congresso Futurista” é tão inquietante? O filme conta a história de uma atriz, Robin Wright (interpretando ela própria), que já passou por seus dias de glória (chegou a fazer até um papel em “Forrest Gump”, é verdade!), mas chegou à meia idade, onde algumas escolhas erradas praticamente puseram fim à sua carreira. Seu agente, Al (interpretado pelo eficiente Harvey Keitel) a leva para o estúdio Miramount (uma espécie de híbrido entre Miramax e Paramount!) e lá recebe uma proposta inusitada do chefão Jeff (interpretado por Danny Huston): seu corpo será escaneado em todos os seus detalhes, emoções, gostos, etc. e tudo isso será de propriedade da Miramount, tornado a atriz Robin Wright virtual e eternamente jovem, sendo que a verdadeira Robin Wright não deverá mais fazer qualquer papel em qualquer lugar, apenas desfrutando sua vida. Esse contrato será de vinte anos. Como Robin estava em má situação financeira e seu filho Aaron (interpretado por Kodi Smit McPhee) sofria de uma doença grave, ela aceitou ser escaneada. O momento em que acontece isso é um dos mais lindos do filme, pois um antigo cameraman é agora o responsável por fazer o escaneamento. Mas Robin não se sente à vontade para mostrar felicidade, tristeza, perplexidade dentro do scanner. Aí entra Al, que conta detalhes íntimos de sua vida e tudo o que ele sente por Robin, conseguindo as emoções necessárias, onde tanto Al e Robin chegam às lágrimas.
O filme avança vinte anos no tempo, quando expira o contrato de Robin, e ela precisa ir ao Congresso Futurista, onde tudo existe no campo da animação. O filme torna-se, então, um grande e psicodélico desenho animado, onde Robin encontra um mundo idílico, onde todos podem ser o que sonharem, consumindo uma substância química. A própria Robin fará um novo contrato onde sua imagem será vendida como uma essa substância. Mas algumas pessoas não aceitam isso e lutam para acabar com esse falso mundo.
O que podemos falar dessa história? Em primeiro lugar, a transformação que a tecnologia impõe a algumas formas de arte, como a cinematográfica, onde os efeitos especiais são mais importantes que a interpretação dos atores, a ponto de estes últimos serem virtualizados e não mais necessários em carne e osso. Robin questiona isso, dizendo que ela não terá mais liberdade de escolha para interpretar um personagem e nem de colocar seu talento da forma como quer na hora de atuar. Argumentos que Al, seu agente, retruca dizendo que nem no mundo real ela tem essas liberdades de escolha que ela pensa ter, pois ela acaba sendo obrigada a aceitar papéis impostos pelos estúdios e a acatar as determinações dos diretores.
Entretanto, a coisa não fica somente na transformação que a tecnologia impõe às manifestações artísticas. O próprio mundo das pessoas é alterado com a tecnologia, onde visões idílicas falsas são criadas, com as pessoas consumindo substâncias químicas que as tornam o personagem que quiserem ser, perdendo sua própria individualidade (não é à toa que Robin não encontra mais seus filhos). Tal ideia é muito parecida com a de quem consome drogas para ficar doidão e esquecer das agruras da vida. O problema é que no filme, o “traficante” seria uma grande corporação, a Miramount, que não mais faz filmes, mas dopa as pessoas para que elas mesmas se transformem em filmes de seus próprios sonhos. E, enquanto isso, o mundo verdadeiro é cada vez mais decadente e degradado. Essa ideia de mundo futuro assusta muito, pois fica parecendo que é uma possibilidade bem viável que cheguemos a isso, ainda mais porque parece que já presenciamos algumas situações dessas em estado embrionário, como o excesso de efeitos de computação gráfica nos filmes, em detrimento do talento dos atores, e o uso de substâncias alucinógenas, ainda não usadas em escala industrial e legal.
Mas o filme também tem o mérito de mostrar uma animação muito bem feita, onde pelo menos as vozes dos protagonistas dão vida e personalidade aos personagens. Assim, o sumiço dos personagens de carne e osso não é de todo.

Realmente é uma pena que esse filme passe em tão poucos cinemas. Ele nos mostra uma direção que nosso mundo pode tomar, altamente idílica, mas altamente irreal, onde será melhor esperar a morte alucinado do que enfrentar as carências que a vida nos impõe. Mas será que não seria melhor buscar melhorar e desenvolver o próprio mundo real?

 Cartaz do filme


Robin Wright. Atriz decadente que será escaneada.


Sendo escaneada


Em forma de animação, num mundo idílico


Mundo real. Decadência


Harvey Keitel, como Al


Depois de escaneada, a imagem de Robin torna-se qualquer personagem


Aaron, o filho doente, que faz Robin retornar ao mundo real


O bom ator, Paul Giamatti (que interpretará Rhino em “Homem Aranha”), faz o médico de Aaron. 

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