domingo, 9 de fevereiro de 2014

Resenha de Filme - O Homem do Rio.

O Homem do Rio. Colcha de Retalhos da Nouvelle Vague.
O filme “O Homem do Rio”, de 1964, é uma grande preciosidade. Concebido durante o período da Nouvelle Vague francesa que, dentro de nossa visão estereotipada, trata-se de um movimento de filmes intelectualizados, “O Homem do Rio” não tem nada disso. Ele parece ser uma grande brincadeira e uma espécie de “colcha de retalhos”, já que ele faz alusões e paródias a vários gêneros e filmes muito conhecidos, numa explosão de intertextualidade.
Vemos aqui a história de um roubo de três ídolos de pedra de uma suposta civilização pré-colombiana. Uma some de um museu de Paris, outra está enterrada na antiga casa de Agnès Villermosa (interpretada por Françoise Dorléac, que é nada mais, nada menos irmã de Catherine Deneuve) que fica no Rio de Janeiro (a casa é o Parque Lage no filme), e a terceira está em Brasília, na casa do milionário Mário de Castro (interpretado pelo italiano radicado no Brasil Adolfo Celi). Essas três estátuas precisam juntas ser levadas a uma gruta no interior da Amazônia, pois elas dão a informação para se descobrir um grande tesouro. Para impedir que as estátuas sejam roubadas, Agnès contará com a ajuda de seu namorado, o militar e porra louca Adrien (interpretado por ninguém menos que Jean Paul Belmondo!), que está de licença por uma semana. A partir daí, temos um grande filme de aventura, que se passa em Paris, Rio de Janeiro, Brasília e no interior da floresta amazônica. Temos muitas situações absurdas e engraçadas, como a insistência de Adrien em perseguir carros a pé (e alcançá-los!), trepar em altos de prédios e construções (tal como Harold Lloyd no cinema mudo), ver Belmondo voando de cabeça para baixo pendurado no avião (tal como Chaplin em “O Grande Ditador”) e mais muitas outras situações. Assim, podemos dizer, nos poucos exemplos que vimos acima, o que já citamos: o filme é uma espécie de colcha de retalhos formada por vários gêneros e homenagens a filmes diferentes. Há algo de Hitchcock, de James Bond, até de Tin Tin na história, tudo colocado de uma forma bem divertida.
Outro elemento interessantíssimo do filme é o seu valor como documento histórico, pois ele foi rodado em 1963 e finalizado em 1964. Assim, podemos ver uma Paris com menos carros, o Rio de Janeiro da década de 1960, com o cais da Praça XV em escombros, pela demolição do mercado municipal para a construção da perimetral (e hoje é a perimetral que é destruída), o estado de abandono do Mirante Dona Marta, sem qualquer arborização, as ainda baixas construções de Ipanema, a Avenida Atlântica em mão dupla, etc. Tudo isso com a visão estereotipada de que o Brasil só tem samba, mulher bonita, favela, malandragem, etc. Mas também é interessante notar como o filme mostra um Brasil moderno, passando por uma Brasília ainda em obras, e estamos falando de 1963, três anos depois da inauguração da cidade (a catedral ainda estava em construção em 1963!). Vendo esse exemplo, podemos entender porque nossos aeroportos só ficarão prontos depois da Copa e das Olimpíadas (se ficarem!). O filme é especialmente engraçado para nós, brasileiros, pois vemos Brasília a apenas cinquenta quilômetros de distância na Rio-Petrópolis, ou então a mansão do milionário Castro ser o MAM, no Rio de Janeiro, com vista para a Esplanada dos Ministérios em Brasília. Mas o cinema não se preocupa com essas incongruências que tornam o filme ainda mais engraçado para nós.

Dessa forma, “O Homem do Rio” é uma preciosidade, pois é uma grande comédia de aventura e de grande sucesso de bilheteria na época, forjado no interior da Nouvelle Vague. E também um grande documento histórico de como era o Brasil na década de 1960, onde vemos rupturas (cidades menores e em construção em contraste com as cidades grandes e prontas de hoje) e permanências (pobreza e miséria, principalmente na região amazônica, que parece não ter mudado quase nada). 

Cartaz do Filme.


Um vivaz Belmondo no Mirante Dona Marta.


 Belmondo e Dorléac na Floresta Amazônica (ou será o Parque Lage???)


Beijo Apaixonado numa Ipanema pouco urbanizada.


Belmondo em ação nas ruas de Paris.

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