sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Resenha de Filme - Ela

Ela: Sexo e Relacionamento Virtuais Levados Às Últimas Consequências.
O filme “Ela” é altamente inquietante. É uma ficção científica que pode estar indicando um caminho que o futuro tomará. E, se esse caminho for tomado, poderemos ter altos estragos na psique humana. A História (isso mesmo, com H maiúsculo) é muito instigante e inquietante. Não é à toa que esse filme concorre a cinco Oscars. Mas, mais importante que isso, ele é um convite à reflexão no futuro (e no presente) das relações humanas. E abre o espaço para um debate altamente pertinente.
O filme conta a História, num futuro não muito distante, de Theodore (interpretado por um magnífico Joaquin Phoenix), que tem uma profissão muito peculiar: ele escreve cartas altamente pessoais para clientes que não conseguem expressar espontaneamente suas emoções para seus entes queridos. Ele é um profissional muito talentoso nesse ramo, escrevendo lindas cartas. Mas sua vida pessoal vai de mal a pior. Ele vive separado de sua esposa há um ano e protela indefinidamente a assinatura dos papéis do divórcio. Todas as tentativas para obter um relacionamento na internet são em vão. Até que ele compra um sistema operacional que tem uma característica muito peculiar: ele tem consciência e aprende com a própria experiência. E é assim que ele conhece Samantha (interpretada por Scarlett Johansson, ou melhor, só a sua voz). O relacionamento entre os dois vai ficando cada vez mais estreito e profundo, até que eles iniciam um relacionamento virtual, com direito a sexo e tudo! E tudo se torna um mar de flores para Theodore e Samantha. Mas, mesmo nessa relação aparentemente perfeita surgem problemas. Samantha não aguenta a ausência de um corpo físico e simula um ato sexual entre Theodore e uma mulher que ela conheceu na internet e que ficou tocada por esse curioso romance. Nem precisa dizer que a experiência foi um desastre, pois Samantha “usava” o corpo da mulher como se fosse o dela, mas o distanciamento de Theodore em virtude da situação muito peculiar acabou magoando a todos. Outro elemento complicador foi no dia em que os papéis do divórcio foram finalmente assinados por Theodore na presença da esposa. Ela ficou revoltadíssima com a atitude de Theodore de se relacionar com um sistema operacional e não com uma mulher de verdade. E isso a fez lembrar das dificuldades de relacionamento com Theodore, que assumia uma postura escapista nos relacionamentos, provocando muita mágoa.

Outros lances dolorosos num relacionamento aparecerão na vida de Theodore e Samantha. Mas o que mais chama a atenção no filme é a exibição de um problema altamente contemporâneo e que pode assumir projeções assustadoras para o futuro. A questão posta é: qual é (e qual será) a natureza das relações humanas? O filme toca numa ferida profunda: a de como nós ficamos frágeis quando vamos nos relacionar com outras pessoas. Theodore é o exemplo clássico disso. Ironicamente, ele é altamente competente para escrever cartas afetuosas e pessoais para outras pessoas, escolhendo as palavras exatas. Mas, na hora de utilizá-las numa situação real para construir um relacionamento para ele mesmo, falha fragorosamente, por ser dotado de uma insegurança profunda. Foi assim quando ele foi a um encontro que ele marcou na internet, sendo inclusive rotulado de repulsivo, foi assim nas crises com Samantha. Sua insegurança ficou muito marcada ao, depois de mais um fracasso no campo pessoal, ele ficar sentado na frente de um enorme telão onde aparecia uma enorme coruja indo em sua direção, abrindo suas garras em direção a seus ombros. Mas a insegurança e fragilidade humanas não recaem apenas sobre Theodore. Sua amiga Amy (interpretada por Amy Adams) também termina seu casamento e inicia um relacionamento amigável com um sistema operacional. E Theodore fica sabendo por intermédio de Amy que várias pessoas estão usando sistemas operacionais para se relacionarem, havendo inclusive casos de traição. Assim, a insegurança humana perante o relacionamento com o outro é um tema recorrente no filme. Mas a coisa não para por aí. Outra questão que surge na trama: como a tecnologia afeta essa insegurança e interfere na natureza dos relacionamentos humanos? O filme faz uma clara alusão a uma situação para lá de contemporânea: um monte de pessoas, na rua, o tempo todo, com a cara metida em smartphones e redes sociais, sem olhar para quem está ao seu lado. Vemos o tempo todo no filme, as pessoas conversando com seus sistemas operacionais, ignorando completamente os outros transeuntes. Isso já faz parte de nossa realidade. Mas o filme vai além. E se os sistemas operacionais desenvolverem consciência? Como eles afetarão ainda mais a sensibilidade e fragilidade humanas? O fato de uma máquina atingir tal estágio de consciência ainda é uma ficção muito impossível, mas que o uso dessas tecnologias já altera nosso comportamento e pode afetar nossa psique de uma forma mais profunda, isso sim já pode ser considerado algo bem próximo de nós. Ou então essa tecnologia crie suportes para potencializar problemas e fraquezas emocionais já existentes há milênios. De qualquer forma, o filme é pertinente justamente por discutir como o homem será afetado por uma tecnologia que ele mesmo cria. Aliás, para quem tem blog ou site por aí, só uma pergunta: você ficará deprimido se sua postagem tiver poucas visualizações????


Cartaz do Filme


Um melancólico Theodore


Feliz com Samantha no bolso de seu casaco


Scarlett Johansson só nos brinda com sua voz.

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