terça-feira, 30 de agosto de 2016

Resenha de Filme - De Longe Te Observo

De Longe Te Observo. Um Casal Autodestrutivo.
E uma co-produção Venezuela-México chegou às nossas telonas. “De Longe te Observo”, uma película dirigida por Lorenzo Vigas, que recebeu o Leão de Ouro em Veneza, dentre outros prêmios, conta uma história muito inusitada e surpreendente. Temos aqui um estranho casal que tem uma relação um tanto quanto autodestrutiva. Um completa o outro, mas um também aniquila o outro.
Como isso acontece? Vamos começar do início. Veremos aqui a história de Armando (interpretado por Alfredo Castro), um homem de meia idade que tem uma pequena firma que fabrica próteses dentárias (ou seja, dentaduras). Sua vida monótona é quebrada por sua prática de caçar rapazinhos na rua, geralmente de um estrato social muito baixo e levá-los para seu apartamento, onde eles tiram a roupa enquanto que Armando se masturba. Mas um dia Armando convidou Elder (interpretado por Luis Silva), um rapaz muito violento e barra pesada, que o agride fortemente e rouba seu dinheiro. Só que Armando não se faz de rogado e continua atrás do garoto que, pouco a pouco, vai aceitando a presença do senhor em sua vida. Terá início então um relacionamento que passará por lances explosivos, sendo altamente volátil e arriscado para ambos.
É um filme altamente inquietante. E não por causa do relacionamento homossexual, mas sim em virtude de toda uma violência envolvida e inversão de valores. Se no início Armando parece ser uma vítima vulnerável nas mãos de Elder e de suas próprias preferências sexuais, correndo atrás do garoto violento apesar de todos os riscos, com o desenrolar da relação entre os dois é Elder que será uma vítima manipulada por Armando. O rapaz deixa a sua postura violenta de lado e seu relacionamento com Armando vai afastá-lo da mãe e dos amigos, restando apenas o amparo de Armando. Elder também irá aflorar todo o seu homossexualismo e vai querer uma aproximação mais afetiva com Armando que a princípio o rechaça, pois ele queria usar os menininhos mais como objeto de prazer do que com o intuito de um relacionamento mais profundo. Mas terá uma situação que tornará Elder uma vítima definitiva de Armando e que terá como motivação principal o pai do cinquentão. Paremos aqui com os “spoilers”.
Ao analisarmos o aspecto doentio do relacionamento do filme, percebemos como em alguns casos o ser humano pode ser tão destrutivo para com outro. Você tenta cativar uma fera humana, literalmente se machuca, mas ainda continua a persegui-la, mesmo sabendo dos riscos. E quando você a domina, chega a sua vez de fazer as covardias, como se a vingança fosse um prato servido frio.

Dessa forma, “De Longe te Observo” é uma película que nos agride e nos inquieta, menos em virtude do preconceito adormecido em nós contra o homossexualismo, e sim  mais em virtude da violência e agressividade implícita dentro da condição humana, o que é infinitamente mais destrutivo. Um filme para refletir. Um filme para agredir. E não deixe de ver o trailer depois das fotos.

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Cartaz do Filme

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Armando e Elder. Relação Explosiva

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Um rapaz muito violento

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Pouco a pouco, o senhor de meia idade conquista o rapaz

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Incertezas quanto a um relacionamento mais profundo

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O diretor Lorenzo Vigas e os atores Alfred Castro e Luis Silva em Veneza.



Resenha de Filme - Amor e Amizade

Amor e Amizade. Desafiando As Convenções De Uma Sociedade Tradicional.
Uma interessante película de época passou em nossos cinemas. “Amor e Amizade” é baseada no romance de Jane Austen, “Lady Susan” e conta uma história que pode ser considerada um desafio aos costumes aristocráticos da sociedade de Antigo Regime, desafio esse materializado na personagem protagonista, Lady Susan.
 A história se passa na década de 1790, onde a Lady Susan em questão (interpretada por Kate Beckinsale) era uma nobre viúva que, arrasada economicamente, vivia de favor de casa em casa com sua filha Frederica (interpretada por Morfydd Clark). Para conseguir os seus objetivos e ambições, Lady Susan faz um perigoso jogo de intriga e sedução com as famílias nobres com que se depara pela frente, esquecendo qualquer convenção de cunho moral. A diversão do filme é justamente ver quais são os passos e jogadas de Lady Susan na busca por seus objetivos.
Se num primeiro momento, a Lady Susan em questão parece ser uma figura totalmente traiçoeira e amoral, num segundo momento, e fazendo uma análise mais fria da coisa, percebemos como Lady Susan faz um jogo com as convenções sociais do Antigo Regime para sobreviver. Como ela era uma viúva da nobreza arrasada economicamente, ela usava o único recurso que tinha – seu nome e condição social, lembrando que numa sociedade de Antigo Regime a condição social nem sempre era associada à riqueza tal como a entendemos hoje, ou seja, de posse de uma grande quantidade do vil metal – para manipular os outros membros da nobreza à sua volta e poder tirar vantagem disso. E essas manipulações iam desde induzir seus alvos amorosos ao adultério como provocar intrigas familiares que atingiriam em cheio desafetos ou que provocassem o casamento de sua filha ou dela própria, mais para dar-lhes conforto financeiro. Ao manipular e brincar com membros da nobreza ao seu bel-prazer, Lady Susan usa de forma maquiavélica as tradições do Antigo Regime para seu benefício pessoal, provocando meio que uma subversão do sistema em escala microcósmica. Visto por esse ângulo, a película torna-se bem mais interessante e vemos com mais simpatia uma personagem que, a princípio poderia ser vista por uma mentalidade machista como altamente torpe e demoníaca. Ou seja, para sobreviver numa sociedade que era um verdadeiro covil de feras, a nossa Lady Susan precisa ser ainda mais inteligente e incisiva em seus atos.
Kate Beckinsale esteve muito bem como Lady Susan. Seu cinismo e uma certa empáfia não nos deixava indiferentes à personagem. Outra atriz que merece destaque foi Chloë Sevigny, que interpretou a amiga americana de Lady Susan, Alicia Johnson. Se essa  película “do mundo” (é uma co-produção Irlanda, Reino Unido, Estados Unidos, Holanda e França) não apresentou um elenco muito conhecido do público brasileiro, pelo menos teve a boa e muito rápida presença de Stephen Fry, interpretando Mr. Johnson, o marido de Alicia Johnson. O filme ainda teve a virtude de fazer um excelente figurino de época, o que deu um charme todo especial. Charme esse incrementado pela lindíssima trilha sonora, com composições clássicas e eruditas de Vivaldi, Purcell, Mozart, Handel, etc.

Assim, se “Amor e Amizade” não é um filme altamente empolgante e que necessita de muita atenção do espectador aos complexos diálogos que revelam todas as intrigas de Lady Susan, é, por outro lado, um filme cuja personagem protagonista engendra toda uma visão até revolucionária se percebemos que ela usa os meandros de um sistema aristocrático preconceituoso e excludente para proveito próprio. E o filme ainda tem a vantagem de não ter um final que se aproximaria do mais convencional. Mas chega de “spoilers”. Vá ao cinema, pois vale a pena. E não deixe de ver o trailer acima.

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Cartaz do Filme

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Lady Susan, desafiando as convenções sociais da nobreza

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Arrumando um marido para a filha

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Provocando intrigas nas famílias...

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Tudo parece muito bem, não é?

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Tramoias com a amiga americana

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Super presença de Stephen Fry...



terça-feira, 23 de agosto de 2016

Resenha de Filme - Perfeita é a Mãe

Perfeita É A Mãe. Mamães Engraçadinhas.
Uma comediazinha meio xarope em nossas telonas. “Perfeita é a Mãe” (“Bad Moms”) é um daqueles filmes que não acrescenta nada a sua vida e é um entretenimento puro, com o único objetivo de fazer rir. E podemos dizer que a película não conseguiu esse objetivo, sendo apenas razoavelmente engraçadinha.
Vemos aqui a história de Amy (interpretada por Mila Kunis), uma mãe de família que tem muitas tarefas para cumprir e que não tem seu valor reconhecido pelo marido, filhos e patrão. Apesar de sempre atender a todos e não deixar faltar nada, todos a criticam. Até que um dia ela simplesmente perde a paciência e resolve deixar tudo de lado, sendo acompanhada por uma mãe displicente e muito tarada, Carla (interpretada por Kathryn Hahn) e uma mãe que é um verdadeiro cordeirinho para o marido e os filhos, Kiki (interpretada por Kristen Bell). O comportamento singular desse divertido trio vai deixar a presidente da associação das mães da escola, Gwendolyn (interpretada por Cristina Applegate), muito incomodada e ela vai fazer de tudo para prejudicar Amy e sua filha, que quer ser a titular do time de futebol da escola. Para acabar com as maldades de Gwendolyn, Amy vai se candidatar à presidência da associação de mães.
Esse fio narrativo é apenas o pretexto para vermos as mamães em noitadas, bebedeiras, namoricos, idas ao cinema, esporros nos maridos opressores, ou seja, tudo aquilo que as “belas, recatadas e do lar” (já ouvi isso antes) não podiam fazer, sendo esses atos uma manifestação de liberdade das matronas. Talvez a personagem mais engraçada seja Carla, que, por todas as suas taras, encabeçava todas as piadas de apelo sexual, o que pode muito agredir a cultura puritana e anglo-saxã estadunidense, mas que aqui não passa de piadas de salão ou as antigas “Anedotas do Pasquim”. Sei lá, fica uma baita impressão de que, quando presenciamos essas piadas no filme, revemos aquelas antigas pornochanchadas brasileiras da década de 70. Ou seja, tal tipo de humor mais chulo e escrachado não é uma novidade para a nossa cultura e nem nos choca muito. A personagem Kiki, com uma tremenda cara de café-com-leite e muita lerdeza também despertou alguns risinhos. Mas foi muito pouco para um filme que pretende ser comédia. Pelo menos, ficou uma mensagem: a de que é impossível ser uma mãe totalmente perfeita e que todo mundo erra, como já é dito há muito tempo naquele samba ancestral. E o lance mais interessante ficou nas cenas pós-créditos: as mães das atrizes principais da película foram entrevistadas nas presenças das filhas, o que foi realmente o momento mais doce de todo o filme que, se não foi lá essas coisas, pelo menos nos brindou com essa gostosa sequência final.

Assim, “Perfeita é a Mãe” não é um super filme, sendo algo mais destinado ao entretenimento, mas com uma cara de comédia engraçadinha e só. O que salva a película é justamente a sequência pós-créditos, ou seja, do filme em si não se salva muita coisa. E não deixe de ver o trailer após as fotos.

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Cartaz do Filme

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Amy faz tudo para todo mundo

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Carla é taradona...

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Kiki é lerdinha...

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Juntas, as três vão tocar o terror...

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Organizando muitas bebedeiras...

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Idas ao cinema...

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E namoricos...

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Mas Gwendolyn não vai deixar nossas mães maluquinhas em paz...






segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Resenha de Filme - A Viagem de Meu Pai.

A Viagem De Meu Pai. Uma Angustiante Comédia.
Um filme francês muito inquietante estreou por aqui. “A Viagem de Meu Pai” (“Floride”), dirigido por Philippe Le Guay (o mesmo de “As Mulheres do Sexto Andar”) é classificado como comédia e drama. Mas, cá para nós, na minha modesta opinião, de comédia esse filme não tem nada, embora a plateia tenha dado boas gargalhadas. Por isso que eu o classifiquei como comédia angustiante. Agora, por que não achei essa comédia uma comédia? Porque ela brinca com um tema que é altamente perturbador para todos nós, já que podemos estar vulneráveis a ele no futuro: o mal de Alzheimer.
Vemos aqui a história de Claude Lherminier (interpretado admiravelmente por Jean Rochefort), um industrial que foi compulsoriamente aposentado pelo Alzheimer, vivendo retirado em sua casa no campo. Por causa de sua doença, a filha Carole (interpretada pela loura e esguia Sandrine Kiberlain) precisa contratar cuidadoras para ficar com o pai, que se mostra de difícil comportamento. Claude tem fixação por uma filha que mora na Flórida, mas que já morreu num acidente de carro há nove anos. Carole teme que o conhecimento da morte da filha abale demais Claude. E assim, na base de uma paciência extrema, que nem sempre pode ser mantida, Carole vai tratando de seu pai como pode, já que ela não quer levá-lo a viver num asilo. Dá para imaginar como essa situação vai render muitos problemas e confusões.
Dizer que a película não é engraçada é ser injusto. Jean Rochefort teve uma atuação soberba exibindo de forma nua e crua todas as violentas oscilações que um paciente dessa terrível doença tem, sendo numa hora extremamente afetuoso, noutra hora muito agressivo e em outros momentos muito inconveniente. As piadas de forte apelo sexual eram as mais engraçadas, pois o velhinho tinha uma fixação pelo sexo oposto, o que era incômodo sério, principalmente para suas cuidadoras, que tinham uma alta rotatividade. Mas essa graça foi muito pouco para contrabalançar todo o mal que essa doença provoca não somente para o paciente, mas também para todos os que estão à sua volta. E ela é cruel o suficiente para alternar momentos de sanidade e insanidade no indivíduo. Realmente, confesso que não vejo como feliz a tentativa de se fazer graça com esse tipo de situação. Entretanto, é apenas uma opinião.
E para aumentar ainda mais a angústia da coisa, lançou-se mão na película de um recurso que achei genial. Se num momento inicial, a gente via o paciente de um ponto de vista mais externo a ele, ou seja, do ponto de vista dos personagens que o cercavam, e tínhamos consciência de situações que Claude não conseguia perceber, a parte final da película foi montada de acordo com as visões de mundo de Claude, ou seja, nós éramos, juntamente com o personagem protagonista, informados pela filha sobre o que tinha acontecido em algum trecho da história que não fora exibido para nós, dando-nos a experiência de compartilhar com Claude as sensações que essa doença nos provoca. Foi um lance muito bom que aumentou a angústia e afastou ainda mais a sensação de que esse filme de comédia não tem quase nada.

Assim, “A Viagem de Meu Paí” não deixa de ser um importante filme, pois ele propõe uma reflexão sobre um tema muito sério – o mal de Alzheimer – mas o vejo muito mais como um drama do que como uma comédia. O filme vale realmente pela atuação de Rochefort e pela dolorosa experiência sensorial que ele nos impõe na sua segunda parte. Vale a pena dar uma conferida, embora você saia com sua alma doída da sala. E não deixe de ver o trailer após as fotos.  

Cartaz do Filme

Claude, uma vítima indefesa de uma terrível doença

Carole tenta cuidar de Claude da melhor forma possível

Várias anotações para não se esquecer.

Ele se ocupa consertando abajures. 

Cuidadoras. Alta rotatividade

O diretor Philippe Le Guay e Jean Rochefort



domingo, 21 de agosto de 2016

Resenha de Filme - 82 Minutos.

82 Minutos. Radiografando Uma Escola De Samba.
Um interessante documentário brasileiro está em nossas telonas. “82 Minutos”, dirigido pelo lendário Nelson Hoineff (que recentemente fez o bom documentário “Cauby, Começaria Tudo Outra Vez”) fala do cotidiano do Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela na preparação do desfile de 2015. O filme procura passar por todos os setores da escola (bateria, passistas, confecção dos carros alegóricos e fantasias, etc.) e etapas da preparação do Carnaval (escolha de samba-enredo, ensaio de mestre-sala e porta-bandeira, ensaios de rua de alas, ensaios técnicos, etc.). A escola só terá 82 minutos para apresentar um trabalho minucioso feito ao longo de um ano inteiro. E por que tal trabalho é tão minucioso? Porque existem vários critérios extremamente complexos no julgamento dos quesitos. Assim, tudo deve ser perfeito e nada pode dar errado na hora do desfile, ou o todo o trabalho de um ano irá por água abaixo.
Extremamente cruel, não? Mas isso é real e num país onde a falta de autoestima generalizada de todo um povo nos coloca no eterno complexo de vira-latas, essa ilha de dedicação extrema acaba sendo um fio de esperança de como nossa sociedade pode sair dessa inércia que a falta de amor próprio nos insere e de como podemos nos melhorar como povo e país se nós direcionarmos toda essa dedicação também para outros setores.
Fazendo um pequeno parêntesis que, indiretamente tem a ver com o documentário aqui analisado, estava pensando com meus botões no que tem acontecido na Olimpíada, principalmente lá no caso do salto com vara, onde aquele atleta francês foi sumariamente vaiado e isso o deixou muito abalado, já que nas competições de salto com vara lá no exterior, a torcida estimula o atleta com palmas na hora do salto, independente dele ser um adversário ou não. Ficou a impressão de que a torcida brasileira era extremamente hostil, mal educada, etc. Mas nós temos aqui um paralelo com o caso da torcida estrangeira na prova de salto com vara. Quem já assistiu um desfile de escolas de samba na Marquês de Sapucaí sabe do que eu estou falando. Todos nós sabemos que aquele desfile é um trabalho com muito afinco de um ano inteiro de uma comunidade e que a escola tem que passar toda por aquele maldito portãozinho antes do tempo esgotar para não perder pontos. Para quem está na arquibancada, um dos lances mais emocionantes é ver se toda a escola passará pelo portãozinho no prazo estipulado. E, nesse momento, a gente torce para todas as escolas obterem êxito, não importa se elas sejam adversárias da sua escola ou não, sendo esse mais outro bom elemento de nossa sociedade e cultura que o mundo do samba nos desperta: a solidariedade, indo um pouco na contramão dessa ideia geral (e, infelizmente, também existente) de que a sociedade brasileira é muito violenta e autoritária.
Mas, voltemos ao filme. Hoineff fez um estilo de documentário onde a câmara é apenas um espectador e registra todo o processo de produção do desfile, sem interagir com a comunidade. Se por um lado essa forma de documentário ajuda a captar mais informações de todo o processo, por outro, essa forma passiva de registro nos impede de entender aquela realidade de forma mais aprofundada. Eu digo isso, pois vimos no filme personagens interessantíssimos que poderiam render excelentes entrevistas. O mestre de bateria, a mestre das passistas, o presidente da escola, o mestre-sala e a porta-bandeira... mas aí seria um documentário mais sobre a escola de samba e sua comunidade em si do que um documentário sobre o preparativo do desfile. De qualquer forma, ficou aquele gostinho de querer saber um pouco mais da vida daquelas pessoas. Quem são? Como vivem fora do mundo do samba? Por que o samba é tão importante na vida delas? O que é um sentimento de identidade com sua escola e sua comunidade? Seria muito legal se fosse dada voz ao povo. Mas nada disso diminui a grandeza do documentário, pois todo o processo foi exibido de forma nua e crua, em seus entendimentos e desentendimentos, em seu sentido de perfeição e críticas às indisciplinas ou falta de dedicação. E era encantador ver toda uma comunidade envolvida num trabalho tão complexo ou árduo. Tais coisas nos dão um pouco mais de esperança de como o povo de nosso país pode ajudar a melhorar nossa nação. É só canalizar essa energia para outros aspectos da vida.

Dessa forma, “82 Minutos” é um filme altamente recomendável que, se peca por não analisar mais profundamente uma gama de interessantes personagens que uma escola de samba pode nos trazer, por outro quis mostrar de forma nua e crua, sem qualquer exercício de leitura ou opinião, todo o processo de preparação de um desfile de escola de samba. Vale a pena curtir tal experiência. E não deixe de ver o trailer após as fotos.

Cartaz do Filme

Um líder...

Uma porta-bandeira

Uma mestre de passistas...

Um mestre de bateria...

Uma escola de samba...

O diretor Nelson Hoineff

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Resenha de Filme - Ben Hur

Ben-Hur. Mais Uma Versão.
Mais uma nova versão de Ben-Hur na área. E falar de mais uma versão desse filme é algo importante para quem gosta de cinema, já que a versão do Ben-Hur de 1959 (a do Charlton Heston) manteve o recorde de 11 Oscars por muito tempo, até que “Titanic” conseguiu apenas igualar a marca. Houve ainda versões de Ben-Hur em 1925, com o ator Ramon Novarro e em 1907, uma versão curta de 15 minutos com o ator Herman Rottger. Dessa forma, todo novo Ben-Hur que sai é fatalmente comparado com a melhor versão de todas, a de 1959, e que dificilmente será superada. Fazer então um novo Ben-Hur acaba sendo um baita desafio. E, para sermos um pouco justos, não devemos fazer essa comparação e pensarmos apenas nos méritos dessa versão de 2016.
E quais seriam esses méritos? Em primeiro lugar, Morgan Freeman, o único medalhão do elenco muito jovem. Seu papel de Ilderim, que ganhava uma graninha com a corrida de Bigas, e ajuda nosso protagonista a dar sua volta por cima, dispensa apresentações. Foi somente uma pena que ele tenha aparecido tão pouco. Em segundo lugar, esse é mais um filme americano que conta com a presença do ator brasileiro Rodrigo Santoro. Novamente, ele não faz um papel principal de protagonista. Mas agora ele faz um coadjuvante de peso: simplesmente Jesus Cristo, o que foi muito legal, já que seu biótipo moreno se adequa mais à realidade étnica local do Oriente Médio do que a visão helenizada de Jesus Cristo no cristianismo, lourinha e de olhos azuis. Apesar de aparecer ainda menos do que Morgan Freeman no filme, não é todo dia que se consegue um papel dessa magnitude. Tanto que ele é o terceiro nome do elenco, atrás apenas de Jack Huston (o Ben-Hur) e Toby Kebell (o Messala). Mais um ponto para a carreira internacional de Santoro que, aos pouquinhos, vai ganhando seu espaço lá fora.
E o elenco principal? Huston fez um bom Ben-Hur, apesar da cara bonitinha e de seu ódio não convencer muito. Seu arrependimento aos pés da cruz de Cristo foi o momento mais convincente de sua atuação. Kebell, por sua vez, teve uma atuação melhor, já que fazer o vilão da história é sempre um grande presente, na minha modesta opinião, pois  os vilões sempre são mais interessantes que os mocinhos. Foi muito legal ver como o Messala dessa versão tinha uma postura bem mais reticente e dividida entre o passado de um órfão romano adotado pela casa de Hur e o implacável militar romano de alta patente que ele acabou se tornando. Só isso já torna o personagem mais interessante que o protagonista. Ben-Hur tinha uma visão muito mais plana das coisas, aceitando o poder romano e negociando com os invasores de suas terras para manter a “Pax Romana”, ou seja, os romanos te deixam em paz se você se torna um capacho destes. E isso aconteceu muito naquela época. O caso de Ben-Hur não foi fictício ou isolado. E é muito curioso ver como tal história (o fato de governantes locais negociarem suas autoridades com os exércitos romanos) aparece na Bíblia de forma altamente crítica, pois Ben-Hur não queria saber de confusão com os romanos e, assim, ele deixava seu povo ser feito de gato e sapato pelos invasores. Hur, inclusive, tinha ao início uma visão crítica dos zelotes, esses sim os que lutavam efetivamente contra a dominação romana. E, cá para nós, ele só se revolta por causa de uma vingança pessoal. Mas como toda história bíblica deve ter um desfecho que ensine algo para o fiel fortificar sua fé (realmente há toda uma pedagogia nessas histórias voltada para essa direção), Ben-Hur consegue a redenção aos pés de Cristo Crucificado, abandonando o ódio e abraçando o perdão, fazendo as pazes com Messala (aí gente, essa conversa tem “spoilers” mesmo, mas eles já têm cerca de dois mil anos).
Mais outros dois elementos cinematográficos dignos de destaque. Houve todo um cuidado com o figurino, o que é muito importante para filmes de época. As roupas dos romanos estavam muito boas, assim como os figurinos da mãe e irmã de Ben-Hur e de sua namorada Esther, charmosíssimas, por sinal. Já o CGI foi interessante, sobretudo nas batalhas em alto mar e na grande vedete da película bíblica, que é a esperadíssima corrida de bigas. Não deixa de ser legal ver um “remake” com essa nova tecnologia que acabou não ficando artificial, muito pelo contrário.

Dessa forma, esse novo “Ben-Hur” vale uma conferida dos fãs de cinema, que não devem ir com o nariz torcido previamente, achando que vão ver algo pior do que a versão de 1959. Se você está com essa comparação em mente, então é melhor nem sair de casa. O que vale aqui é constatar as virtudes cinematográficas dessa nova versão, não comparando com o que já foi feito e consagrado.  Não deixe de dar uma chegadinha ao cinema para prestigiar essa nova versão. E não deixe de ver o trailer após as fotos.

Cartaz do Filme.

Ben-Hur. Um príncipe vítima da opressão romana

Messala, que se descambou para as forças romanas do mal! Note o excelente figurino...

Jesus Santoro!!!

Hur vai encontrar em Ilderim um apoio para a sua vingança (parece o avô do Bob Marley).

O ódio de Ben-Hur será redimido...

... ao pé da Cruz de Cristo. Lição bíblica típica...

A famosa sequência da corrida de bigas. Hur e seus cavalos branquinhos, branquinhos, saídos de uma propaganda de sabão em pó...

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Resenha de Filme - Rebecca, A Mulher Inesquecível

Rebecca, A Mulher Inesquecível. Uma Obra-Prima de Hitchcock.
O Cine Odeon nos brindou com um clássico do cinema em sua suntuosa sala. Foi exibido “Rebecca, A Mulher Inesquecível”, dirigido por ninguém mais, ninguém menos que Alfred Hitchcock e que conta com “apenas” estrelas atemporais da sétima arte do naipe de um Lawrence Olivier, Joan Fontaine e Judith Anderson. Um deleite para os olhos de qualquer cinéfilo ver na telona essa obra-prima vencedora de dois Oscars (melhor filme e fotografia).
Essa película, realizada em 1940, nos conta a história de uma bela moça (interpretada por Fontaine) que era acompanhante de uma “respeitável” senhora (interpretada por Florence Bates). Pois bem, as duas estão em Monte Carlo e, num passeio próximo a um penhasco, a mocinha encontra Maxim de Winter (interpretado por Olivier), que iria cometer suicídio, atirando-se ao mar lá embaixo. Foi o suficiente para que os dois se apaixonassem de forma arrebatadora e saíssem de Monte Carlo já casados. Mas Maxim tem um passado nebuloso. De família muitíssimo rica, ele mora com seus criados numa gigantesca mansão chamada Manderley. Maxim é viúvo, pois sua esposa, a inesquecível Rebecca, morreu afogada de forma trágica, e o pobre viúvo ainda não sabe lidar com isso, tendo um temperamento muito difícil. Todas essas situações vão dificultar a vida de nossa protagonista, que agora se chamará Senhora de Winter. Por ter uma origem humilde, ela tem dificuldades para se adaptar a todos os procedimentos e normas de etiqueta de Manderley, sendo vista com muito ódio pela assustadora senhora Danvers, a governanta da mansão (interpretada magistralmente por Judith Anderson). A senhora Danvers tinha verdadeira adoração por Rebecca e vê a nova senhora de Winter como uma criatura insignificante que quer tomar o lugar da antiga patroa. Por causa da influência da senhora Danvers, a presença de Rebecca ainda é muito forte na mansão, o que atormenta e muito a nova senhora de Winters. O passado de Maxim com Rebecca é envolto em mistério e, paulatinamente, a nova senhora de Winters vai descobrindo o que aconteceu, o que vai criar uma baita duma trama sensacional para a história, regada a muito suspense como só o mestre Hitchcock consegue fazer.
O filme é muito bom em todos os sentidos. Um baita roteiro, como já deu para perceber pela descrição acima (na verdade, ele é muito melhor, mas um spoiler de 76 anos de idade não me deixa dizer), atores simplesmente sensacionais e uma grande direção. Hitchcock conseguiu criar um ambiente um tanto quanto expressionista, principalmente nas tomadas de Manderley. A mansão aparecia, na maioria das vezes, no escuro, tomada por uma névoa enigmática. Esse expressionismo também era bem presente na narrativa, principalmente quando Maxim era enfocado. Esse personagem tinha um comportamento contraditório, ora sendo amável, ora sendo explosivo, o que podemos dizer que, em até certo ponto, havia um quê levemente paroxista no personagem. O mistério envolto em Rebecca também ajudava a película a ficar mais pesada. Quanto à interpretação dos atores, é uma enorme sacanagem Judith Anderson não ter ganhado o prêmio de atriz coadjuvante no Oscar daquele ano; confesso que fiquei curioso até de saber quem ganhou. A mulher simplesmente arrasou nesse filme. A sequência em que ela tenta induzir a nova senhora de Winters ao suicídio é simplesmente magistral!!! Fontaine consegue fazer a mocinha indefesa prestes a ser engolida pelo “sistema” de Manderley. Olivier dispensa comentários. O cara conseguia ser odioso, digno de pena, engraçado, afetuoso, tudo no momento certo. É um prazer ver tamanha atuação para um personagem tão complexo como Maxim. Outra coisa que muito chama a atenção é a fotografia, muito nítida (não é à toa que ela ganhou o Oscar), dando todo o valor que o bom e verdadeiro preto e branco merece. A gente consegue sentir muito isso principalmente nos closes dos atores. Esses closes auxiliam muito na estética do filme, que sofre, aos nossos olhos anacrônicos de hoje, alguns arranhões em virtude do recurso do “back projection”, que levava a situações incômodas, como o fato de as pessoas dentro de um automóvel conversível não estarem com seus cabelos esvoaçantes ou a agressiva iluminação de estúdio sobreposta a uma situação de ar livre. Mas essas eram limitações técnicas da época e devemos entender isso.

Assim, se você não teve a oportunidade de assistir “Rebecca” na tela grande, não deixe de dar uma chegada ao Odeon. E, se você não conseguir ver o filme no cinema, pode assisti-lo aqui no Yoshiwara´s World na íntegra e legendado em português, logo após as fotos. Não deixe de ver!!!\

Cartaz do Filme

Uma mocinha humilde que entrará num turbilhão...

Maxim e Senhora de Winters. Muitos percalços para esse casal atingir a felicidade

Manderley!!!!


Vejam como a iluminação realça o claro/escuro. Herança expressionista...

Outro belo exemplo de como a iluminação é trabalhada no filme...

No quarto de Rebecca, intacto

A odiosa Senhora Danvers. Um show de interpretação de Judith Anderson

Senhora Danvers  induzindo a Senhora de Winters ao suicídio. Sequência magistral!!!