Numa
Escola de Havana. Como Lá, Como Aqui?
Mais uma interessante
produção cubana chega à nossas telas. “Numa Escola de Havana” é mais um filme
que questiona o regime cubano, usando agora como pano de fundo o ambiente
escolar. Ou seja, mais um filme que aborda o “sacerdócio” do ofício de
professor, para alguns, ou apenas uma profissão que deve ser vista como tal
para outros. Ainda assim, é uma interessante radiografia da sociedade cubana de
hoje, mesmo que haja uma constelação de licenças poéticas, como sempre ocorre
no cinema.
Vemos aqui a história
da professora Carmela (interpretada por Alina Rodriguez), uma veterana em sua
profissão, muito respeitada por todos, sendo que, inclusive, ela ajudou na
formação de alguns de seus colegas de profissão mais jovens. Ela tem um neto
doente e vai visitá-lo no hospital, que fica num bairro distante de sua casa e
da escola onde ela trabalha. De volta para sua casa depois da visita, ela é
acometida de um enfarte e é substituída por uma professora mais nova, para
desespero do jovem aluno Chala (interpretado por Armando Valdes Freire), um
menino problema típico e que somente respeita Carmela. Com a velha professora
fora de combate, o menino se envolve em sérios problemas de disciplina e vai
para uma escola que é uma espécie de pequeno reformatório para alunos
delinquentes. Quando Carmela volta à ativa, ela não se conforma com a situação
de Chala e o retira do tal reformatório, trazendo-o de volta para a antiga
escola e tomando conta do menino. Obviamente, as instâncias educacionais
superiores não vão se conformar com essa atitude independente de Carmela, mas
há todo o problema dela ser uma excelente profissional com muitos anos de
carreira e puxar seu tapete não será uma coisa fácil.
É um filme comovente
sobre a professora militante e seu aluno “caso perdido” que ela vai recuperar
com afetuosidade e amor, mas algo completamente inverossímil para o mundo real.
Quem é profissional da área sabe que é uma tremenda furada querer fazer o papel
de pai e mãe de aluno. Misturar emocional com profissional numa carreira como a
de professor pode (e muito provavelmente será) fatal para o docente. Carmela é
o exemplo do que não se pode fazer numa profissão como essa, apesar de todo o
romantismo da coisa, que o cinema, graças aos céus, ainda nos permite tal
devaneio.
Mas a película não é
apenas uma licença poética sobre o ofício de professor. A situação de rebeldia
de Chala também é analisada e ela é bem concordante com o que vemos na vida
real. Boa parte da indisciplina dos alunos vem de uma desestruturação familiar
latente, que era justamente o caso de nosso aluno protagonista, que tinha uma
mãe prostituta e drogada, onde o filho mais sustentava a progenitora do que o
contrário. O menino, inclusive tinha um ofício que desperta mais uma reflexão.
Ele cuidava de cachorros para rinhas. E uma menina pela qual ele estava
apaixonado não queria nada com ele justamente por seu ofício, o que faz Chala
repensar novas formas de se ganhar dinheiro. À propósito, a menininha por quem
Chala estava apaixonado, Yeni (interpretada por Amaly Junco), é outra
personagem curiosa, já que ela não podia ter uma matrícula regularizada, pois
seu pai era de outra região de Cuba e, pelas regras, ele vivia “ilegalmente” na
região de Havana. Chala tinha outro amiguinho cujo pai estava na cadeia por ser
opositor do regime. Esses elementos, mais alguns outros que eu não direi aqui
(chega de “spoilers”!) nos mostram as críticas que os cineastas cubanos parecem
que agora podem fazer ao regime, como já tínhamos visto no filme “Retorno à
Ítaca”, recentemente resenhado aqui.
Dessa forma, “Numa
Escola de Havana” é mais um filme que nos dá a oportunidade de ter uma ideia do
que ocorre na Cuba contemporânea e que tem mais liberdade de criticar os
procedimentos do governo para com a sociedade. Um filme comovente, mas
reflexivo.
Cartaz do filme
Chala e a mãe. Menino problema
Carmela e o "sacerdócio"...
Autoridades não aceitam o comportamento de Carmela
Chala cria pombos e cachorros para sobreviver...
Não se trata de um filme que se propõe a questionar o regime cubano. Muito simplista a definição introdutória, para não dizer outras coisas. O filme traduz a relação de ensino e aprendizagem para a vida. Questão preponderante e universal. Não considero inverossímil ou "uma furada" ou simplesmente poética a relação da Professora com o mundo de seus alunos (que é também o seu mundo). Assertiva dessa natureza transparece visão medíocre da ação educadora. Tal abordagem do filme poderia ser replicada em qualquer lugar do mundo. Algo um pouco mais profundo e distante, talvez inalcançável à compreensão do nobre resenhista.
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